Após um período de alta contínua dos preços, o Índice de Preços de Supermercados (IPS) indicou uma leve desaceleração no valor dos cortes mais populares de carne. Segundo o levantamento feito pela Apas (Associação Paulista de Supermercados) e Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), a cesta do produto apresentou deflação de 0,55%.
Dos 14 cortes acompanhados pela Apas, 10 recuaram em nível de inflação no mês de novembro. Entre os mais populares, o acém apresentou queda de 3,10% em outubro, e a alcatra, de 1,39%. Ainda de acordo com a Apas, a redução dos preços se deu pela maior oferta interna e estabilidade no custo de produção.
O IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) também apontou que o preço do item caiu em outubro. Os dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística afirmam que os preços da proteína bovina tiveram baixa de 0,31%. A última queda havia ocorrido há 16 meses atrás, em maio do ano passado (-1,33%).
Apesar dos recuos, a inflação dos dois cortes ao longo do ano é de 9,32% e 11,00%, respectivamente, ao passo que o total da cesta de carnes acumula alta de 13,05% no ano, segundo o IPS.
Embargos e restrições
O Ministério da Agricultura confirmou na terça-feira (23/11), que a China flexibilizou os embargos em relação à proteína bovina brasileira. A partir de agora, as carnes datadas antes de 4 de setembro, quando foram iniciadas as restrições, serão liberadas nas alfândegas.
“Esse recuo dos preços, ainda que pequeno, passa pelo embargo que a China estabeleceu”, explica o economista-chefe da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre, Oscar André Frank. “Por conta de uma maior disponibilidade de oferta doméstica nós tivemos o impacto que acabou reverberando sobre esses valores”, completa.
Já para o economista especializado em macroeconomia, José Luiz Oreiro, o embargo da China às carnes brasileiras não é o único motivo para a queda no preço dos itens nos supermercados.
De acordo com ele, a baixa também pode ser atribuída a um menor consumo da proteína bovina por parte da própria população. “O próprio aumento dos preços gerais reduziram o poder de compra das pessoas, e o fato é que elas substituíram carne por alternativas mais baratas”, afirma Oreiro.
O assessor técnico de pecuária de corte da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) Rafael Ribeiro de Lima Filho explica que a carne bovina perdeu competitividade por conta do preço alto. "Em 2019, um quilo de carne bovina custava 2,4 quilos de frango. No ano passado essa relação subiu para três, e em 2021 se manteve em parâmetros parecidos”.
Segundo Rafael Ribeiro, o cenário de pouco comércio com um grande comprador da carne brasileira, como a China, criou uma pressão para que frigoríficos e supermercados se adaptassem às demandas do consumidor brasileiro ”Talvez muito dessa pressão pudesse ter sido aliviada se tivesse uma exportação para China mais ativa. Com um maior volume de carne voltado para o mercado interno, é necessário se adaptar às demandas e consumo daqui.”, explicou.
José Luiz Oreiro faz coro: “Com a redução do embargo chinês, você retoma a demanda externa de carne. Então tem que saber exatamente o que está acontecendo com os outros produtores mundiais do produto”.
A carne volta para a mesa?
Atualmente, alguns fatores ainda pressionam o preço das carnes: como a valorização do dólar frente à depreciação do real, que faz com que o produto brasileiro seja mais vantajoso para o comprador estrangeiro e o aumento da demanda internacional diante da reabertura das economias e do avanço da vacinação.
“É importante notar que, se por um lado nós teremos um reforço nos programas de distribuição de renda – como o Auxílio Brasil – , por outro nós temos uma situação bastante complicada em termos de mercado de trabalho”, frisa o economista Oscar André Frank. Embora o setor venha se recuperando, a taxa de desemprego segue significativa.
Outro ponto a se considerar é o fato de que a renda real está comprometida, diz o economista. “Essa alta generalizada dos preços está corroendo o poder de compra dos salários e isso pode continuar a suscitar nos consumidores a procura por outros tipos de mercadorias que ocupem o lugar da carne”.
Luiza Moreira, 75 anos, é aposentada e diz que teve dificuldade de continuar comprando carne bovina após os diversos aumentos no preço “Fui para outras alternativas, tem cachorro-quente com salsicha toda semana lá em casa agora”. Apesar disso, segundo ela, o custo das carnes tem se estabilizado dentro dos supermercados nos últimos meses “Tenho percebido que não tem mais um aumento muito constante dos preços. Alguns cortes mais baratos tem barateado um pouquinho também”. Ainda assim, para Luiza, a queda não foi o bastante. “Como minha renda não aumentou, continua muito caro. Na hora de pagar é complicado”, desabafou.
O respiro, no entanto, pode não durar muito. Para o assessor da CNA Rafael Ribeiro diz que a chegada das festas de final de ano pode elevar o preço da carne novamente. “Com uma maior movimentação agora nas semanas de Natal, o final de mês pode e costuma levar a uma retomada da subida de preços”. Além disso, ele também destaca que o Ano Novo Chinês impulsiona a exportação da carne brasileira, que resulta em aumento no preço do produto no mercado doméstico.
*Estagiários sob supervisão de Pedro Grigori