Após sucessivas negativas do governo federal em assinar um compromisso de diminuir a emissão de gás metano (CH4) na atmosfera, um anúncio do Ministério das Relações Exteriores de que o Brasil aderiu ao acordo pegou de surpresa o mundo e até integrantes do próprio Poder Executivo. O entendimento foi costurado na COP26, conferência climática que ocorre em Glasgow, na Escócia.
“No âmbito das negociações da #COP26, o Brasil co-patrocinará o Compromisso Global sobre Metano. O Brasil é parte da solução para os desafios da mudança do clima. #BrasilNaCOP26”, publicou o Itamaraty em sua conta no Twitter.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, entre outros órgãos do governo, era contrário ao acordo, porque a maior parte das emissões brasileiras de metano advém da pecuária. Para reduzi-las, seria necessário diminuir o rebanho ou investir pesadamente no melhoramento tecnológico da atividade. O governo, entretanto, cedeu à pressão dos Estados Unidos, principal patrocinador do acordo, que prevê a redução das emissões em 30% até 2030. Até ontem, mais de cem países haviam aderido à proposta.
Segundo o economista William Baghdassarian, professor do Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais (Ibmec), o governo cedeu às pressões não por ter se sensibilizado com o problema, mas sim para não se colocar em uma situação de pária ambiental. “Quando você reúne os maiores líderes internacionais assinando esse acordo de clima, o Brasil se torna pária se não assinar”, disse.
Segundo o especialista, a redução de metano pode ser uma oportunidade para o Brasil passar a emitir os chamados “títulos verdes”, o que poderia compensar uma eventual perda em exportações de carne bovina. “Países comprometidos com essa pauta lá fora têm colocado incentivos para que as empresas emitam títulos e bônus, cujos recursos são destinados à causa ambiental, social e de governança. Como o Brasil tem um bioma muito forte e muito grande, poderia emitir muitos títulos de proteção”, explicou.
O metano é um gás proveniente de diversas fontes, sendo que as principais são: erupções vulcânicas, decomposição de matéria orgânica e digestão de alguns animais herbívoros, como o boi. Ele faz parte dos gases que causam o efeito estufa na atmosfera e é 28 vezes mais poluente que o gás carbônico (CO2), segundo cientistas. O Brasil produz 418 milhões de toneladas de metano por ano — sendo 73% oriundo do arroto de bois e manejo de esterco dos animais.
Rebanho
A redução das emissões do gás pode atingir a pecuária, que é um setor importante da economia brasileira. O país tem o maior rebanho bovino do mundo e as exportações de carne constituem importante fonte de receita (veja no quadro). Apesar das evidências científicas, representantes do setor agropecuário do Congresso Nacional sustentam que o setor é sustentável.
O deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS) disse que a maior parte da emissão de metano no Brasil vem dos centros urbanos e definiu como “folclórica” a informação de que o arroto dos bois gera gás suficiente para causar danos à atmosfera. “Não há dado científico que estabeleça a teoria”, afirmou. O deputado Neri Geller (PP-MT) vai na mesma linha, ressaltando que o acordo é positivo para o Brasil. “A produção agropecuária no Brasil é altamente sustentável”, garantiu. “Nós precisamos do mercado internacional, a nossa imagem tem que mudar e precisamos de diálogo para sinalizar isso”, acrescentou.
Segundo o ambientalista Nelson Rodrigues, do projeto Guardiões do Meio Ambiente, do Distrito Federal, por mais que grandes fazendeiros consigam avançar tecnologicamente e manter uma produção mais sustentável, os pequenos acabam gerando problemas ao meio ambiente. “Os pequenos fornecedores não tem estrutura e muitos não conseguem impedir as emissões”, explicou.