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Banco Central eleva taxa Selic; entenda consequências para inflação e seu bolso

Analistas atribuem a elevação a uma crescente inflação e à percepção de descontrole sobre os gastos do governo federal, principalmente em um período pré-eleições de 2022


A taxa de juros básica da economia brasileira, a Selic, foi elevada pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (o Copom) pela quinta vez consecutiva nesta quarta-feira (27/10).

Essa taxa, que serve de referência para outras taxas na economia brasileira, passou de 6,25% para 7,75% um aumento de 1,5 ponto percentual, e analistas atribuem a elevação a uma crescente inflação e à percepção de descontrole sobre os gastos do governo federal, principalmente em um período pré-eleições de 2022.

Com a alta de preços da energia elétrica e dos combustíveis, a inflação alcançou, em setembro, 1,16%, o maior patamar para aquele mês desde 1994, aponta o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). No acumulado de 12 meses, o índice já está em 10,25%.

Diante da incerteza fiscal e da expectativa de que a inflação fique acima da meta pelo segundo ano consecutivo, com impacto direto no orçamento das famílias, a expectativa de economistas é de que a taxa Selic continue subindo.

O economista Silvio Campos Neto, da consultoria Tendências, estima que ela chegue a 10% no início do ano que vem. "As taxas de juros conseguem conter um pouco essa piora (do cenário inflacionário) ao segurar a atividade econômica e os preços", explica.

Isso porque, ao elevar os custos do crédito, elas fazem as empresas e consumidores gastarem menos e os estimula a poupar mais - uma vez que o dinheiro poupado é remunerado a uma taxa de juros maior.

"A taxa de juros é a ferramenta mais rápida e simples (diante de um cenário inflacionário)", aponta o economista Reginaldo Nogueira, diretor-geral do Ibmec São Paulo e Brasília.

Um efeito colateral disso, porém, é dificultar a retomada dos investimentos produtivos, em um momento em que o Brasil ainda tenta retomar os patamares de antes da pandemia e da crise econômica.

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Expectativa de que furo do teto de gastos piorou as perspectivas econômicas

Por isso, aumentos na taxa de juros costumam enfrentar muitas críticas das associações industriais do país, que reclamam que a medida deixa o crédito mais caro para consumidores e empresas e prejudica sua produtividade.

Para Silvio Campos Neto, porém, mesmo antes do novo aumento da Selic o mercado e as instituições privadas já vinham aumentando seus juros, antecipando a decisão do BC.

Outro efeito preocupante da alta da Selic é o de tornar mais cara a dívida pública do Brasil, em dólares - um problema que deve voltar com mais força ao debate nacional em 2023, no pós-eleições, junto a discussões sobre reformas econômicas e aumento de tributos, prevê Reginaldo Nogueira.

O imbróglio fiscal do governo

Mas, junto à inflação, outro fator crucial apontado para a alta acelerada dos juros é a preocupação com os gastos do governo. Essa preocupação foi reforçada na semana passada, quando o presidente Jair Bolsonaro pretendia anunciar o programa substituto do Bolsa Família - o chamado Auxílio Brasil, com benefício no valor de R$ 400.

No entanto, ante a perspectiva de que parte desse benefício venha de recursos de fora do teto de gastos - ou seja, além do total que o governo federal pode gastar sem desrespeitar a lei -, os agentes do mercado financeiro reagiram com uma alta no dólar (que superou a cotação de R$ 5,60) e uma queda na bolsa de valores.

O dólar mais alto, por sua vez, pressiona ainda mais a inflação, uma vez que muitos dos bens adquiridos por indústrias e consumidores são importados.

O resultado dessa reação negativa é que a cerimônia de lançamento do programa Auxílio Brasil foi cancelada na terça passada (19/10), sem previsão de nova data, deixando beneficiários do Bolsa Família no escuro a respeito do valor que receberão no futuro e economistas tentando entender qual será a origem dos recursos.

No dia seguinte, o ministro da Cidadania, João Roma, afirmou que o governo trabalha para garantir um reajuste ao benefício a ser concedido pelo Auxílio Brasil, "dentro das regras fiscais", mas isso voltou a ser colocado em xeque pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

"O teto é um símbolo de austeridade, é um símbolo de compromisso com as gerações futuras, mas nós não vamos deixar milhões de pessoas passarem fome para tirar 10 em política fiscal e tirar zero em assistência aos mais frágeis", disse ele na sexta-passada.

O que alguns economistas afirmam, porém, é que a estratégia do governo é falha: na ausência de controle sobre os gastos do governo, a tendência é um aumento da inflação - que corrói o poder de compra justamente dos mais pobres -, e uma pressão para o Banco Central e o mercado financeiro elevarem as taxas de juros, o que, por sua vez, retrai os investimentos.

"Quando se começa a falar em romper o teto de gastos, mesmo que em um patamar não tão elevado, isso passa sinais de que não haverá contenção das pressões de demanda pelo (aumento do) gasto público", explica o economista Reginaldo Nogueira.

"Isso aumenta o risco político e afeta o câmbio, com mais efeito sobre a inflação."

É justamente aí que entra a taxa Selic na história.

"Havia a percepção de que o Banco Central manteria um plano de voo (de aumentos graduais na Selic), mas a piora das expectativas de inflação e na questão fiscal fazem ele acelerar o passo", afirma à reportagem Silvio Campos Neto..

"Existe uma percepção de fragilização das regras fiscais e um temor de que as saídas heterodoxas de furar o teto se tornem o padrão. O Banco Central tem pouco a fazer em relação à fonte do problema, mas tenta remediar os efeitos (...) Mas a causa é a má condução da política fiscal para objetivos políticos."

Campos Neto aponta que é legítima a pressão social por um benefício mais alto em um momento de alta na pobreza e na fome no Brasil, "mas procurou-se (o governo) uma saída fácil, burlando as regras (fiscais), o que pegou muito mal."

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Banco Central voltou a aumentar a taxa de juros em março deste ano, quando Selic baixou ao patamar de 2%

Há economistas que argumentam que seria possível aumentar o benefício ao Auxílio Brasil sem incorrer em furo do teto de gastos, mas isso comprometeria outra despesa crescente do governo federal: a que tem sido feita com as chamadas emendas de relator, que o governo Bolsonaro tem usado para atender a pedidos de gastos de parlamentares do bloco conhecido como Centrão e, assim, mantido seu apoio no Congresso.

"Isso está diretamente associado ao momento que estamos vivendo, de pré-eleições. Ano que vem tem eleições gerais e isso está perpassando todas as decisões", disse à BBC News Brasil, na semana passada, o economista da Instituição Fiscal Independente, Felipe Salto.

Fim do ciclo de juros baixíssimos

A taxa Selic em curva ascendente colocou fim a um ciclo de quase seis anos de juros em patamares bastante baixos para o histórico brasileiro - que chegou a seu ponto mais baixo em março deste ano, quando a Selic era de 2%.

Isso respondia a uma antiga demanda de indústrias e empresas, que queriam juros mais baixos para conseguir crédito mais barato e assim investir mais.

Mas Reginaldo Nogueira avalia que, diante de uma inflação que já dava sinais preocupantes naquela época, junto a outras pressões inflacionárias - como a crise hídrica, a alta dos preços de energia e, agora, o risco fiscal -, "existe um reconhecimento de que o BC demorou a aumentar a taxa de juros. Fica claro que a gente teve juros baixos demais, por tempo demais".

Se for cumprida a expectativa de que, no início do ano que vem, a Selic chegue ao patamar de 10%, o aumento terá sido de mais ou menos oito pontos percentuais desde os 2% de março de 2021.

O aumento não é desprezível, mas "mais do que o número em si o que preocupa é a sinalização" disso a respeito do cenário econômico brasileiro, afirma Silvio Campos Neto. "O pior é que não se criaram, do lado fiscal, condições adequadas."


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