A Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) insistiu em fazer ontem a 17ª rodada de licitações para exploração de petróleo e gás, em regiões que foram alvo de crítica de ambientalistas. Com isso, o resultado foi o desinteresse dos investidores. Apenas 5 dos 92 blocos ofertados foram arrematados. E os lotes próximos ao Arquipélago de Fernando de Noronha, cuja exploração, na análise de especialistas, oferece riscos à fauna marinha, não receberam nenhuma proposta. O leilão arrecadou apenas R$ 37 milhões em bônus de assinatura, com investimentos previstos de R$ 136 milhões. Foram os piores resultados da história dos leilões da ANP.
“Um fracasso”, resumiu Claudio Frischtak, sócio-consultor da Consultoria Internacional de Negócios. Segundo ele, vários fatores contribuíram para o desinteresse dos investidores. “Em primeiro lugar, as empresas estão com cronograma de investimentos pesados. Vivemos um momento de transição energética e, principalmente, houve um erro de cálculo da ANP e total falta de sensibilidade na inserção no leilão de blocos em áreas ambientalmente sensíveis. As empresas não quiseram correr o risco de terem os investimentos barrados no futuro. Enfim, o resultado foi uma lição que a ANP e o governo tomaram”, analisou Frischtak.
O leilão foi marcado, desde o início, por polêmicas. O governo de Pernambuco, em cuja jurisdição está Fernando de Noronha, chegou a pedir ao Supremo Tribunal Federal a suspensão das ofertas. E ambientalistas organizaram manifestações de protesto em frente ao hotel, na Zona Sul do Rio de Janeiro, onde a licitação ocorreu.
De acordo com Frischtak, não se pode esquecer do risco econômico global e dos riscos domésticos, inclusive o político, que prejudicaram o leilão. “Para investir aqui, as empresas do setor certamente escolheriam ativos muito atraentes. Esse mercado já não funciona como há 15 ou 20 anos. O momento agora é de cautela”, destacou. Por todas essas questões, ele entende, ainda, que um dos maiores erros foi o “timing” (momento errado). Daqui para frente, afirmou, é difícil dizer o que pode acontecer no leilão de dezembro. “Mas a tendência é de que seja um pouco mais bem-sucedido”, disse.
Para Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), o resultado da 17ª rodada já era esperado, porque as empresas concorrentes apresentaram dados muito ruins em seus balanço, em 2020, em função da pandemia. “O preço médio do barril em 2020 ficou em torno dos US$ 40, houve retomada dos preços este ano, além de um cenário insistente de grandes incertezas e ainda a demonização dos combustíveis fósseis”, apontou. Ele disse também que não foi surpresa a ausência da Petrobras.
“Está se guardando (a Petrobras) para o leilão da cessão onerosa em dezembro, no qual ela já declarou que vai exercer a preferência. A surpresa foi o apetite da Shell, que adquiriu 5 dos 92 Campos que foram oferecidos. Mesmo nesse cenário de ESG (do inglês Environmental, Social and Governance, ou Ambiental, Social e Governança), a Shell continua apostando na exploração de petróleo no Brasil. Boa noticia”, afirmou Pires. A companhia anglo-holandesa arrematou, sozinha, quatro dos cinco blocos e formou consórcio com a Ecopetrol para arrematar o quinto.
Esse foi o pior leilão desde 1999, com o menor número de empresas participantes, lembrou Henrique Jager, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep). “Os investidores deram um recado ao Brasil e ao governo de que, às vésperas da 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-26), nenhuma companhia quer associar seu nome a um desastre ambiental”, afirmou.