As medidas anunciadas pelo governo federal nos últimos dias, com forte impacto fiscal, provocam solavancos no mercado financeiro e no câmbio. Nesta quinta-feira (21/10), o dólar fechou em alta, enquanto o Ibovespa seguiu em baixa, após o governo falar em “licença” para furar o teto de gastos a fim de financiar o Auxílio Brasil. Com alta de 1,92%, o dólar encerrou o dia cotado a R$ 5,6651. Já o principal índice da Bolsa de Valores brasileira, o Ibovespa, registrou uma queda -2,75%, atingindo 107.735 pontos
O mercado segue reagindo negativamente às declarações dadas nesta quarta-feira (20) pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. O chefe da equipe econômica falou em usar R$ 30 bilhões fora do teto de gastos para custear o Auxílio Brasil. O governo pretende substituir o Bolsa Família e pagar um benefício de R$ 400 em seu novo programa.
Diante do risco de o governo furar o teto de gastos para financiar o Auxílio Brasil, o spread (diferença entre taxas) dos contratos de 5 anos de Credit Default Swap (CDS) do Brasil, uma medida de risco-país, operou no fim da manhã de hoje em 220 pontos, de acordo com as cotações do IHS Markit. Este é o maior patamar desde 12 de abril, quando o spread chegou a ser negociado em 222 pontos.
Além disso, com a forte oscilação de preços e taxas, as negociações de títulos públicos negociados via Tesouro Direto foram suspensas pela segunda vez nesta quinta-feira, por volta das 14h38. Com isso, os investidores só puderam comprar ou vender papéis do Tesouro Selic.
Reação em cadeia
O economista-chefe da Bluemetrix-Asset, Renan Silva, explica que o mercado financeiro reagiu negativamente às declarações de Guedes, pela importância que o teto de gastos tem para o controle da responsabilidade fiscal. “O teto foi instituído em 2018, justamente para ter um controle fiscal melhor, então é uma marca importante para os agentes do mercado”, observa.
Ele acrescenta que, ao desrespeitar o teto de gastos, o governo abre precedentes para novas despesas que não estão equacionadas no Orçamento. “Na medida que você não respeita o teto de gastos, abre prerrogativa para uma série de coisas, como pressões para outros gastos, vindos de parlamentares para atenderem a interesses eleitorais”, ressalta Renan Silva.
Segundo o economista, o desrespeito ao teto de gastos provoca uma reação em cadeia no mercado financeiro: leva à alta do dólar, à queda da bolsa e ao aumento do risco de se investir no país. “A situação fiscal se agrava e, assim, o país perde credibilidade. Isso reflete no risco Brasil. Os gestores acabam recuando do mercado e gerando esse fluxo: venda de bolsa, o Ibovespa cai, procura pelo dólar aumenta, porque é um porto mais seguro, e a moeda americana valoriza”, descreve.
Como reflexo dessa reação negativa do mercado na economia brasileira, ocorrem, segundo Renan Silva, o aumento da taxa de juros e a piora da inflação. “Na medida que temos um aumento do risco de investir no Brasil, os agentes da economia pedem mais taxa de juros, que já está aumentando em razão da inflação. Então, quando o governo for vender seus títulos, esse agente só volta com maiores garantias ou taxa de juros maior, o que é ruim, porque o financiamento de tudo fica mais caro”, comenta.
Ainda de acordo com o economista, o aumento da taxa de juros também se deve à alta do dólar, que teve o maior patamar de fechamento desde 14 de abril e maior valorização diária da moeda desde 8 de setembro nesta quinta-feira. “O juros tem que aumentar para conter o câmbio, o que afeta a inflação duramente também”, complementa Renan Silva.
Risco Brasil
O Risco Brasil passou, nesta quinta-feira, ao nível mais elevado desde abril. O economista Otto Nogami, professor de economia do Insper, esclarece que o indicador alto significa que os parâmetros macroeconômicos estão desequilibrados, agravados pela fragilidade estrutural que a economia brasileira apresenta. “A falta de uma política econômica clara e racional para os próximos meses aumenta a apreensão sobre o futuro da nossa economia. Em linhas gerais, significa que não é recomendável investir no País, seja no setor produtivo como no setor financeiro”, analisa Nogami.
Segundo o professor de economia, em um ambiente incerto, o mercado começa a exigir juros mais altos para financiar o déficit público. “Ou seja, a volatilidade significativa nos preços e taxas dos papéis do Tesouro, levam à suspensão temporária das negociações, para que os preços e taxas possam se ajustar dentro da normalidade. Ambientes incertos levam à redução do consumo das famílias (que repercute na queda da atividade econômica), postergação dos investimentos produtivos (menos geração de emprego e de renda), realocação da riqueza (grandes poupanças tendem a buscar portos seguros no exterior), comenta.
Conforme Nogami, tudo isso está acontecendo por uma atuação temerária do governo, o que provoca um clima de incerteza. “Podemos dizer que estamos indo ao porão do buraco. Quando há uma volatilidade significativa nos preços e nas taxas dos títulos negociados nesse mercado, a Secretaria do Tesouro Nacional suspende temporariamente as negociações no TD, para que novos preços e taxas de referência possam ser atualizados”, ressalta o economista.
* Estagiário sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza
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