O endividamento das famílias (relação entre o saldo das dívidas e a renda acumulada em 12 meses pela massa salarial) alcançou 59,9% e bateu recorde em junho, segundo as estatísticas monetárias e de crédito divulgadas pelo Banco Central (BC) ontem. A taxa é a maior registrada desde 2005. Com a exclusão do financiamento imobiliário, que corresponde a grande parte do crédito a pessoas físicas, o indicador chegou a 37,1%.
De acordo com a autarquia, o crédito ampliado para as famílias aumentou 1,8% em agosto, totalizando R$ 2,7 trilhões, o equivalente a 32,7% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 12 meses, a alta foi de 18,2%. Somente no Sistema Financeiro Nacional (SFN), que aumentou 1,5% em agosto e totalizou R$ 4,3 trilhões, o volume de crédito de operações com pessoas físicas correspondeu a R$ 2,5 trilhões.
Fernando Rocha, chefe do Departamento de Estatísticas do BC, afirma que o banco tem observado a questão do endividamento e reforça a importância da educação financeira. “Temos observado para que (a dívida) seja feita com a devida educação financeira, com esclarecimento sobre as condições em que o crédito está sendo tomado, para que se possa ter um planejamento adequado”, diz. "É uma demanda que está sendo satisfeita pelas instituições financeiras e que, do ponto de vista do SFN, tem risco muito baixo”, completa Rocha, sobre o crédito às famílias.
Na avaliação de Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), pessoas têm buscado crédito não só para consumo, mas para fechar o orçamento familiar. O economista afirma que o crescimento de 1,7% em cartão de crédito à vista aponta maior “giro dos negócios” e que a dificuldade das famílias em fechar as contas é motivada pela alta inflação. “O cheque especial cresceu 0,9% no mês. O rotativo cresceu 4,6%. Portanto, embora a gente note uma distinção positiva da vacinação e da volta de atividade econômica, de outro lado, percebemos os efeitos da inflação batendo nos orçamentos das famílias”, pontua.
A última prévia do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) neste mês, apontou nova alta, de 1,14% em setembro, com inflação de 7,02%, no ano, e de 10,05%, acumulada em 12 meses.
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Renda
Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, explica que a alta inflação corrói o poder de compra das famílias, colaborando para o endividamento. “Muitas famílias que têm acesso ao crédito acabam usando esse crédito como medida de sustentação para manter o padrão de consumo de antes”, comenta. Além da inflação, ele aponta a diminuição na renda nos lares brasileiros como outro fator para o endividamento. “Olhando pela renda na pandemia, a gente consegue entender que muitas famílias recorreram a mecanismos de crédito para suportar a crise”, conta.
Renato Magalhães, chefe comercial da B2e Group Concessão de Crédito e Prevenção a Fraudes, reforça que o crédito mais caro e a renda mais baixa são as principais causas para o endividamento. “A renda não está seguindo o mesmo ritmo da inflação. A grande maioria dos brasileiros ganha entre 1 e 2 salários-mínimos e a inflação tem pesado em cima de produtos básicos que têm maior consumo pelas famílias. O orçamento acaba pesando”, afirma.