A semana que começa deverá ser marcada por mais volatilidade no mercado financeiro, obrigando os parte dos investidores a operarem com bastante cautela. O Índice Bovespa (IBovespa), principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), acumulou queda de 2,26% na semana passada, em meio ao clima de incertezas no mercado financeiro que foi agravado com as manifestações do feriado de 7 de Setembro. No mês, o recuo foi maior, de 3,78%. Especialistas apontam que a instabilidade das bolsas dos Estados Unidos, a alta no dólar e a escalada da inflação no país devem colaborar para manter o sobe e desce do mercado doméstico de ações e deixar os operadores com alerta redobrado.
Responsável pela mesa de ações e derivativos do BTG Pactual Digital, Jerson Zanlorenzi explica que, antes dos ruídos políticos recentes que deixaram investidores em pânico na última quarta-feira (8), o mercado já vinha demonstrando preocupação, principalmente, sobre as incertezas políticas, que estão afetando diretamente a economia. “As reformas tributária e administrativa, a questão do teto de gastos, a ampliação do Bolsa Família e a dúvida sobre se o governo respeitará ou não os precatórios são tópicos que têm deixado os investidores bastante receosos e cautelosos. As manifestações de 7 de Setembro intensificaram essa preocupação, trazendo sentimento de pânico, pois os investidores estão mais desconfiados quanto aos encaminhamentos das pautas econômicas”, diz o especialista.
O último feriado, citado por Zanlorenzi, foi marcado por discursos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) com ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF). O mercado financeiro reagiu com queda de 3,78% no Ibovespa no dia seguinte. Bolsonaro se reuniu com o ex-presidente Michel Temer (MDB) e redigiu uma carta em tom pacificador, que trouxe um otimismo temporário para os investidores e fez a Bolsa subir 2% na quinta-feira, mostrando recuperação parcial do tombo do dia anterior. Contudo, na sexta-feira, a B3 voltou fechar em queda de quase 0,93%.
Dúvidas
“A carta trouxe um pouco de probabilidade de avanço das agendas em Brasília, cruciais para a tomada de risco aqui no Brasil”, pontua o analista do BTG. Para ele, o otimismo durou pouco, após Bolsonaro afirmar que não estava “recuando” das suas afirmações nas manifestações. “No resumo da ópera, o mercado entende que decisões complexas precisam de alinhamento entre os Poderes. E a percepção foi de que esse alinhamento ficou mais difícil, colocando muita dúvida entre os investidores. O pânico criado na quarta-feira se dissipou, mas, logicamente, as dificuldades de avanço das agendas continuam”, afirma Zanlorenzi.
Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, afirma que é natural que o restabelecimento da confiança no cenário de investimentos seja mais vagaroso do que a sua destruição. “O mercado reagiu muito mal e demorou um pouco para anular os efeitos que foram causados”, destaca. Na avaliação de Sanchez, não houve pânico no mercado, apenas uma reprecificação das possibilidades. “A principal preocupação é que essa rusga entre judiciário e executivo impacte o legislativo. O Brasil precisa aprovar reformas, como as de privatizações, para que possa ter melhor capacidade fiscal. Mas a possibilidade hoje é mínima de a gente ter um avanço robusto quanto a isso”, diz.
Para Caique Coutinho, especialista em renda fixa da Veedha Investimentos, um dos principais problemas que assolam o mercado financeiro, hoje, além dos ruídos políticos, é a persistência da inflação. Divulgado na última quinta-feira (9) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de agosto registrou aumento de 0,87% em comparação com julho — dado acima das projeções dos investidores — e acendeu mais um alerta no mercado. Com o novo resultado, a inflação oficial acumula alta de 9,68% em 12 meses, aumentando a pressão sobre o Banco Central para elevar a taxa básica de juros (Selic), atualmente em 5,25%, a fim de conter essa alta dos preços que está persistente e bastante disseminada.
Ainda na quinta-feira, os juros negociados nos Depósitos Interfinanceiros (DI) saltaram quase meio ponto percentual, fechando as taxas em 7,4% ao ano nos contratos com vencimento em janeiro de 2022. Nos contratos para 2023 e 2025, o ajuste foi ainda maior, para 9,375% e 10,45%, respectivamente. O reajuste é equivalente às projeções de 10% até 2024 que os agentes de mercado esperam para a Selic.
O aumento dos juros, segundo Coutinho, tem tornado o mercado de renda fixa mais atrativo para parte dos investidores. “A alta inflação e a necessidade de elevar os juros para conter o aumento dos preços tornam os investidores avessos ao risco e eles migram para a renda fixa, que está favorável, com as taxas sendo indexadas para cima, assim como a inflação”, avalia.
Paciência
Se, para alguns investidores da Bolsa, a crise é motivo de insegurança, para quem tem sangue frio e paciência, o mercado de ações pode ser uma oportunidade, segundo Zanlorenzi. “Nesses momentos de grandes estresses, investidores acabam tomando decisões emocionais e não racionais, e aqueles que têm mais sangue frio conseguem aproveitar melhor as oportunidades”, diz o especialista da BTG Pactual Digital. Ele explica que a oportunidade surge no momento em que aqueles investidores que entram no “modo pânico” passam a vender os ativos a qualquer preço. “Quem olha com olhar mais matemático acaba tendo um bom resultado. Eu sempre falo que, no momento de pânico, a melhor decisão é não fazer nada. Nessa situação, não fazer nada é fazer muita coisa”, reforça.
Olhar matemático e paciência é o que não falta para o servidor aposentado Altair Gonçalves, 59 anos. Ele investe na Bolsa desde 2007 e busca não se apavorar com o sobe e desce ao sabor das notícias, mas ressalta que, em momentos barulhentos, como o atual, "a Bolsa é algo para investir aquilo que sobra um pouco. Não é para investir o leite das crianças, o dinheiro que você precisa, pois é de risco”, alerta.
Altair conta que, após o aumento recente das incertezas políticas e fiscais, realizou algumas movimentações na Bolsa, mas, em nenhum momento, pensou em retirar o dinheiro de lá para aplicar em outro tipo de mercado, como o de renda fixa. “Eu segurei algumas ações que já estavam em queda e, na quarta-feira, como o tombo foi quatro vezes maior do que se eu tivesse vendido no início, ao observar a tendência, vendi mesmo assumindo o prejuízo para aplicar em outras empresas que acredito serem mais vantajosas”, explica o morador de Vicente Pires, no Distrito Federal.
O investidor da bolsa, que já teve uma experiência frustrante por não ter sido mais paciente, diz que não comete esse erro novamente. “Eu comprei ações de uma companhia a R$ 70 com a intenção de vender quando chegasse a R$ 90. Mas, quando o papel ficou perto do valor que eu queria, começou a cair e foi até a R$ 32, devido a boatos envolvendo donos da empresa. Não vendi, pois estava focado nos R$ 90. Quando chegou ao valor que eu queria, depois de dois anos, tive um lucro de R$ 20 mil. Esse foi meu erro. Mais dois anos se passaram, e a mesma ação passou a valer R$ 4 mil. Eu teria lucrado mais de R$ 4 milhões”, relembra.