A indústria brasileira perdeu ritmo e não deve se recuperar tão cedo, de acordo com analistas. Dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que o setor encolheu 1,3% em julho, na série com ajuste sazonal. A queda foi a pior para o mês desde 2015 e maior do que a esperada pelo mercado, de 0,8%.
Apesar de acumular alta de 11% no ano, o setor está em patamar 2,1% abaixo do nível pré-pandemia, de fevereiro de 2020. As grandes categorias, de bens duráveis e de semiduráveis e não duráveis, estão, respectivamente, 18,2% e 7,1% distantes dos níveis anteriores à chegada da covid-19 no país. Já o setor de bens de capital está 16,4% acima do patamar pré-crise, após crescer 0,3% em julho, mas desacelerou em relação a junho, quando havia disparado 33,1%.
O resultado pior do que o esperado confirma as estimativas mais pessimistas para o terceiro trimestre — que começa com a indústria sem forças para ajudar o Produto Interno Bruto (PIB) a ter um resultado positivo, após a queda de 0,1% no segundo trimestre na comparação com os três meses anteriores. A indústria, aliás, teve contribuição relevante para esse resultado, pois recuou 0,2%, na mesma base de comparação.
“A indústria, principalmente o segmento de bens duráveis, como automóveis e eletrodomésticos, vai ter dificuldades para se recuperar, porque há muitos gargalos para o setor produtivo, como a falta de peças e componentes, que é um problema no mundo inteiro e só deverá se normalizar em 2022”, destacou a economista Marina Garrido, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Segundo a economista, os dados corroboram as estimativas do Ibre de queda de 0,1% no PIB do terceiro trimestre, o que sinaliza um cenário recessivo em formação. “A tendência é continuarmos revisando para baixo”, disse. Logo após o resultado do PIB de quarta-feira, o Ibre reduziu de 5,2% para 4,9% a estimativa de expansão do PIB neste ano, e de 1,6% para 1,5% a previsão de alta em 2022.
Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, reforça a tendência de um PIB mais baixo neste ano. “A queda na produção industrial de julho dá o tom para um terceiro trimestre fraco, de fato. Neste ano, o crescimento está caminhando para ficar abaixo de 5%”, avaliou. Vale prevê altas de 4,7%, no PIB de 2021, e de 1,4%, no ano que vem, mas afirma que “o viés é de baixa”.
Conforme os dados do IBGE, dos sete meses já decorridos de 2021, cinco foram negativos, e a indústria da transformação acumula dois trimestres no vermelho. Para Marina Garrido, o setor é o que deverá enfrentar mais dificuldades daqui para frente. “Há muitos riscos que devem atrapalhar a indústria além do gargalo dos componentes, como a alta do custo da energia, que encarece custo de produção”, alertou.
“Há, ainda, outros riscos, como as condições financeiras, que estão piorando, e a diminuição da demanda interna devido ao desemprego elevado e ao endividamento das famílias”, complementou.
Problemas
Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos, lembrou que a queda de 2,7% na produção de bens duráveis foi determinante para o resultado do setor em julho. “Isso é, basicamente, consequência do problema na cadeia de suprimentos, como semicondutores. Além disso, o IBGE corrobora com a pesquisa sobre produtividade da CNI (Confederação Nacional da Indústria), que aponta queda de 1,6% no segundo trimestre de 2021 comparativamente ao trimestre anterior”.