Técnicos do governo confirmam estudos para prorrogar o pagamento do auxílio emergencial, com última parcela prevista para outubro, até dezembro (em valores entre R$ 150 e R$ 375). Oficialmente, o Ministério da Cidadania não confirma, mas fontes do próprio órgão garantem que a estratégia está na ponta da agulha para ser apresentada e é uma tentativa de socorrer cerca de 25 milhões de famílias que ficarão desassitidas quando o auxílio terminar. Elas ficarão no limbo, dizem, porque não se enquadram no atual Bolsa Família. Para especialistas, para fechar as contas, a saída é mesmo a prorrogação.
O principal obstáculo para o lançamento do Auxílio Brasil são os R$ 89 bilhões que o governo tem que pagar de precatórios (dívidas judiciais) em 2022. De acordo com André Perfeito, economista-chefe da Necton Investimentos, a solução para o governo sair dessa encruzilhada passa pela PEC dos Precatórios (que ainda depende de conversas entre Tribunal de Contas da União e Supremo Tribunal Federal) e pela aprovação da reforma do Imposto de Renda, em tramitação no Senado.
“As receitas (para o programa social) vão vir da segunda (reforma do IR) e o espaço fiscal da primeira (PEC dos Precatórios). Como a reforma do IR deve demorar, se criou esse impasse. A possibilidade de se prorrogar o auxílio emergencial seria uma estratégia intermediária”, analisa Perfeito. Diante das incertezas, “não vai ser surpresa se o governo prorrogar o auxílio emergencial, mesmo sem ter a fonte de financiamento de recursos nos próximos dois meses, ou seja, entrando em 2022”, reitera Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust.
Ele destaca que o deficit primário do governo não é tão alto, nem para este ano e nem para o ano que vem. “O grande problema de ter mais gasto é a questão de descumprir a regra do teto. Para não descumprir, acho que o governo vai se esforçar para tirar essa despesa do teto dos gastos. A princípio, eu vejo o governo com uma política fiscal mais expansionista, mais populista, ou seja, o presidente Bolsonaro realmente vai tentar utilizar o superavit fiscal visando aí as eleições de 2022”, reforça Eduardo Velho.
Na análise do economista Cesar Bergo, sócio-investidor da Corretora OpenInvest, a equipe econômica havia apostado suas fichas que iria conseguir respaldo para o não pagamento dos precatórios. “Para ganhar tempo e arrecadar recursos suficientes para aguardar a decisão do Congresso, os técnicos governistas criaram a MP do IOF. No entanto, o Congresso está refém de fortes pressões (lobbies) contrárias à postergação no pagamento dos precatórios, inclusive oriundas do judiciário (STF e Superior Tribunal de Justiça)”.
“Assim, o caminho a ser trilhado pelo governo é estender o pagamento do auxílio emergencial, sob o argumento de que se trata de recursos que não devem impactar o teto de gastos. O Congresso deve topar esta estratégia. Enquanto isso, a equipe de governo abriu sua caixa de ferramentas. Mas só vingou o aumento de impostos até agora. A corda sempre arrebenta do lado mais fraco”, ironiza Cesar Bergo.
Cálculos
O especialista em políticas públicas Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, lembra que estudos da Instituição Fiscal Independente (IFI) apontam espaço no Orçamento para pagar os precatórios e ampliar, mesmo que mais modestamente, o Bolsa Família em 2022 sem que seja necessário alterar as regras vigentes. Nos cálculos da IFI, o benefício do Bolsa Família subiria dos atuais R$ 189 para cerca de R$ 250, com alta no número de beneficiados de 14,6 milhões para cerca de 16 milhões, por cerca de R$ 14 bilhões a mais.
“Politicamente, contudo, o governo, com a popularidade em queda livre, quer fixar para o Auxílio Brasil um valor médio no mínimo semelhante ao do auxílio emergencial para não reduzir o benefício mensal (que já é considerado baixo) das famílias atualmente contempladas. Mas ainda há muito o que discutir, porque o novo Auxílio Brasil, a partir de novembro, só seria possível com a receita decorrente do aumento do IOF”, reforça Bergo.
A Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia informou que as projeções atualizadas na sua Grade Fiscal de agosto de 2021 indicam uma arrecadação federal bruta total estimada da ordem de R$ 1,809 trilhão, o que resulta em uma diferença de arrecadação, em termos nominais, da ordem de R$ 330 bilhões acima da arrecadação de 2020. (VB)