A inflação disparou em setembro e registrou alta de 1,14%, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), divulgado ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi a maior taxa para o mês nos últimos 27 anos, ou seja, desde o início do Plano Real, em 1994. Com esse resultado, o indicador, que é considerado uma prévia da inflação oficial (o IPCA), mostra elevação de 7,02% no ano e acumulou alta de 10,05% nos últimos 12 meses.
De acordo com o IBGE, oito dos nove grupos de produtos e serviços registraram alta em setembro. O setor de habitação, que vinha liderando a pressão inflacionária em agosto devido à energia elétrica, neste mês teve impacto de 0,25%, ficando atrás do grupo de alimentação e bebidas (com impacto de 0,27% no índice) e do grupo de transportes, que foi o que mais puxou a alta em setembro, correspondendo a 0,46% do total de 1,14% registrado.
A alta em transportes, segundo o Instituto, foi de 2,22%, influenciada pelo reajuste de preços dos combustíveis, que acelerou o ritmo de 2,02% para 3% no período observado. Com alta de 2,85% ante agosto, a gasolina foi a nova vilã da inflação, tomando o posto antes ocupado pela energia elétrica. “Foi o subitem que exerceu o maior impacto individual do mês no IPCA-15”, informou nota do IBGE. Nos últimos 12 meses, a gasolina subiu 39,05%.
Paulo Tavares, presidente do Sindicombustíveis-DF, explica que os reajustes feitos pela Petrobras (nas refinarias) na gasolina tipo A, que compõe 73% da gasolina comum vendida nos postos, já alcança 47% em 2021. O etanol anidro, que compõe os outros 27% do combustível, subiu 64%.
Segundo Tavares, com os reajustes, também aumentou o recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), arrecadado pelos estados, proporcionalmente, em cima do preço da bomba de combustível. No Distrito Federal, por exemplo, o aumento da receita foi de 41,5%, afirmou o presidente do Sindicato.
“Estes são os três principais fatores que influenciaram o alto custo dos combustíveis, não só em Brasília, mas em todo o território nacional. O GDF aumentou sua arrecadação em mais de 40% este ano, por causa da elevação dos preços na refinaria, e só vai baixar 3% na alíquota, no ano que vem, e dividido em 1% a cada ano”, explicou Tavares.
A secretária executiva Mariana Fontele, 42 anos, tem sentido no bolso o aumento da gasolina. “Tem um grande impacto, já que utilizamos o carro para diversos deslocamentos diariamente. A despesa está pesando no orçamento doméstico”, disse a moradora do Gama. Mariana conta que também tem sentido o peso da inflação na hora de ir ao supermercado. “A alta no preço dos alimentos é visível”, afirmou.
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Privações
O consultor de vendas Lucas Moreira, 23 anos, morador de Valparaíso de Goiás, também aponta que o alto preço do combustível tem dificultado a locomoção no dia a dia. “Tenho que me privar de alguns eventos, ou até mesmo de oportunidade de emprego, por causa do aumento do combustível”, desabafou. A carestia, segundo ele, é geral. “No fim do mês, tenho que economizar em algumas coisas para poder colocar o combustível e ainda fazer compras para casa, além de pagar a conta de luz, que também sofreu reajuste abusivo”, pontuou.
Apesar do impacto da gasolina ter sido maior, os demais combustíveis também apresentaram altas: etanol (4,55%), gás veicular (2,04%) e óleo diesel (1,63%). No grupo transportes, destacou-se ainda o salto nos preços das passagens aéreas, que subiram 28,76% em setembro, sendo o terceiro item de maior impacto (0,11%) no IPCA-15 do mês.
O economista Fábio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio (CNC), explicou que, embora a alta nos preços de combustíveis, alimentos e energia elétrica sejam os mais impactantes, é possível observar a “contaminação” dos demais itens de bens e consumo. “Outros preços livres começam a ser contaminados. O índice de difusão — a quantidade de itens com alta — foi expressivo: 68,9% apresentaram variação positiva em setembro. É a maior difusão desde janeiro deste ano, e é um fator preocupante”, alertou Bentes.
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Investimento externo cai 26%
A entrada de investimentos estrangeiros diretos (IDP) no Brasil recuou 26% em agosto. Enquanto em julho o valor desses investimentos foi de US$ 6,1 bilhões, em agosto, eles somaram US$ 4,5 bilhões. O valor ficou abaixo da estimativa do Banco Central para o período, que era de US$ 5,8 bilhões.
Nos 12 meses encerrados em agosto, os investimentos somaram US$ 49,4 bilhões. É um montante superior aos US$ 47,5 bilhões registrados no período de um ano terminado em julho, mas inferior aos US$ 56,8 bilhões registrados no mesmo mês de 2020. De lá para cá, a queda foi de 13%.
Na avaliação de Fernando Rocha, chefe do Departamento de Estatística do BC, a pandemia da covid-19 é o principal fator que tem impactado nas transações e refletido na redução dos investimentos diretos. “Os impactos pelo efeito da pandemia provocaram redução muito superior no saldo das transações correntes e na redução dos fluxos de investimentos direto”, afirmou Rocha, durante apresentação dos dados.
O especialista em investimentos Leonardo Aparecido, da Valor Investimentos, explica que um conjunto de fatores ainda colabora para o recuo dos investimentos diretos no país, além do arrefecimento global em razão da pandemia. “Do ponto de vista interno, a questão dos precatórios e do Auxílio Brasil que não fecham no teto de gastos, acaba sendo prejudicial, porque deixa o mercado instável. As recentes rusgas entre os Poderes também repercutiram mal no mercado”, afirmou o especialista.
Sara Ferreira, especialista em renda variável da Valor, explica que a queda nos investimentos diretos é devido a questões bastante pontuais que não devem refletir em problemas a longo prazo. “No último mês houveram motivos como a variante delta que tem se mostrado resistente à vacina, a crise hídrica intensa como não víamos há muito tempo e a alta inflação que acabam gerando risco para os investidores de fora”, ressalta. Para a especialista, os próximos reajustes do Banco Central na taxa básica de juros deverão ajudar na retomada dos investimentos perdidos. "Devemos nos recuperar nos próximos meses, com a alta na taxa de juros e outras altas previstas, o país acaba oferecendo mais rentabilidade”, afirma.
Carestia deixa BC sob pressão
A prévia da inflação de setembro veio acima da média esperada pelo mercado financeiro, que estimava algo em torno de 1%. Apesar disso, na avaliação de Victor Zucchi Meneghel, especialista da Valor Investimentos, o IPCA-15 não deverá interferir no que já foi sinalizado pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), quanto aos próximos ajustes na taxa básica de juros — a Selic, principal instrumento utilizado pelo BC para conter a inflação.
“Mesmo sendo a maior alta para setembro desde o Plano Real, não vai mudar a opinião do Banco Central sobre o aumento da taxa de juros. Eles já sinalizaram que tem um plano de voo traçado e notícias de alta da inflação não vão impactar na decisão deles, principalmente por acharem que a alta é influenciada por questões mais pontuais como a crise hídrica e preço de commodities”, explicou Meneghel. Ele concorda com o Copom sobre o impacto de curto prazo dos itens que têm feito maior pressão inflacionária.
Fabio Bentes, da Confederação Nacional do Comércio (CNC), discorda. Para ele, a variação do IPCA-15 está longe de ser algo apenas pontual. “A variação da inflação em setembro por si só já é preocupante, e a gente sabe que está longe de ser pontual. A composição da inflação também tem preocupado porque, conforme se esperava, essa inflação foi produzida nos últimos meses por uma concentração”, reforça.
Segundo Meneghel, a previsão é de que o Copom continue com o objetivo de reajustar a Selic em um ponto percentual na próxima reunião, no fim de outubro, o que levaria a taxa para 7,25% ao ano. Na previsão dele, haverá mais uma alta de 1 ponto percentual no fim do ano e, ainda, 0,25 ponto no início do ano que vem, deixando a Selic em 8,50%.
Entretanto, só há como saber isso com mais precisão, após a divulgação da ata da última reunião do Comitê, que será na terça-feira. “Temos que esperar a ata do Copom para ver se realmente eles estão com esse posicionamento mesmo, e se vão seguir nessa linha mais agressiva para controlar a inflação”, diz o especialista em investimentos.