Não há consenso ainda sobre a reforma administrativa. Após sete versões contraditórias e seis diferentes substitutivos do relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 32/2020), deputado federal Arthur Maia (DEM-BA), o texto foi aprovado, na última quinta-feira, na comissão especial que tratou do assunto na Câmara, mas o que acontecerá daqui para frente é incerto, segundo analistas. O final de semana será de “guerra fria” entre governistas e oposicionistas. E as mobilizações para convencer os indecisos estão a pleno vapor nos bastidores do Congresso e no país.
O governo é acusado de trocar votos por recursos e cargos, após a inclusão de benesses na PEC 32 para favorecer a bancada da bala (aposentadoria integral para policiais, inclusão de guarda municipal na área de segurança pública, entre outras). “Não será estranho se começarem a ser repentinamente distribuídas emendas parlamentares e cargos federais para correligionários em estados e municípios”, afirmou Vladimir Nepomuceno, consultor e diretor da Insight Assessoria Parlamentar. Um sintoma dessa suposta “cobrança dos favores”, afirmou, é a própria agenda do Plenário da Câmara.
Estranhamente, na próxima semana, não há sequer uma sessão deliberativa (discussão e votação de proposições) no Plenário. “Apenas uma sessão solene na terça, às 15h30. Se o governo tivesse a certeza de ter os 308 votos necessários para aprovar a reforma, a matéria seria pautada nessa semana”, afirmou Nepomuceno. “Se governistas têm estratégias de convencimento, usaremos a mesma força em sentido contrário. Vamos nos unir e mostrar aos cidadãos as consequências da reforma e aos parlamentares que a reeleição está em risco”, disse.
Comentários de bastidores sugerem que o relator, deputado Arthur Maia lavou as mãos, pois tem repetido insistentemente que, na Câmara, “tem dois Arthurs”. Ele fez o seu papel. Agora, cabe ao presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL) pautar a reforma no Plenário. “Depende dele (Lira) e do governo, da base governista”, afirmou Maia.
A disputa por votos agita os bastidores. Deputados que não quiseram se identificar dizem que não vão ter paz nos próximos dias. “Em apenas duas horas, foram 120 mensagens e convites para reuniões e jantares”, disse um da base governista. “Não consegui parar para almoçar. Uma enxurrada de ligações de todos os lados”, disse outro da oposição.
Uma das principais articuladoras da reforma administrativa, quando a proposta ainda estava em elaboração no Executivo, a economista Ana Carla Abrão, da Oliver Wyman do Brasil, mostrou desencanto com o trabalho feito pelo relator.
Pelas redes sociais, Ana Carla desabafou, na quarta-feira: “Sabe a estratégia do bode na sala? Essa é a história da #ReformaAdministrativa: três relatórios inaceitáveis foram apresentados (um deles nem foi protocolado). Aí surge o quarto, sem alguns dos absurdos, mas mantendo vários outros problemas. Isso não transforma a contrarreforma em reforma”, lamentou.
“Gerar caixa não deveria ser a motivação principal da reforma. A motivação principal é de ordem social. Dar um salto de qualidade depende de gerirmos nossos recursos públicos e entregarmos o melhor para a sociedade”, ressaltou a economista.
A batalha entre defensores e críticos da reforma se desenrola também nos estados e municípios. Uma semana após terem sido impedidos pela Polícia Militar de se manifestarem na ponte Hercílio Luz, em Florianópolis (SC), servidores públicos retornaram ao local na quinta-feira e estenderam uma faixa de 40 metros contra a PEC 32/20. A iniciativa foi do Fórum dos Servidores Públicos de Santa Catarina, que reúne mais de 25 sindicatos. “Os sindicatos de trabalhadores de Santa Catarina estão defendendo a tua vida! Não à Reforma Administrativa”, destacou a Fórum.
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