A Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado Federal, divulgou nesta quarta-feira (15/9), edição extraordinária do Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF). A nova análise de conjuntura aponta que o Produto Interno Bruto (PIB), apesar do recuo de 0,1% na margem, registrou alta de 25,4% no segundo trimestre de 2021, em comparação ao mesmo período do ano passado. O crescimento, no entanto, demonstra mais uma retomada da crise pandêmica do que uma alta nominal. Segundo a IFI, ele foi influenciado pela "reduzida base de comparação, que no segundo trimestre de 2020 representou o auge das restrições durante a pandemia”.
De acordo com o RAF, pela ótica da oferta (ou da produção), o crescimento do PIB em volume no primeiro trimestre deste ano, quando comparado ao mesmo período do ano anterior, foi impulsionado pela retomada da indústria (17,8%), de serviços (10,8%) e na agropecuária (1,3%). Pela ótica da demanda (ou da despesa), o relatório aponta que houve crescimento generalizado entre os setores, com destaque para o consumo das famílias (10,8%), da formação bruta de capital fixo (32,9%) e do consumo do governo (4,2%). “No setor externo, as exportações de bens e serviços cresceram 14,1%, enquanto o crescimento das importações de bens e serviços foi de 20,2%”, diz o documento.
Ainda segundo o RAF, a diferença entre o deflator do PIB (que mede o nível de preços de todos os bens e serviços novos) e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE, chegou a 3,0 pontos percentuais no segundo trimestre de 2021. Na variação do Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), medido pela Fundação Getulio Vargas (FGV), o percentual vai a mais de dois dígitos. “A variação do IGP-DI, mais abrangente que o IPCA e mais sensível ao comportamento da taxa de câmbio e aos preços de commodities, está rodando acima de dois dígitos desde o último trimestre de 2020”, diz a IFI. “O monitoramento dessas diferenças é relevante, pois a trajetória dos indicadores fiscais expressados em relação ao PIB é afetada pela dinâmica do deflator implícito”, explica a nota técnica.
Segundo a IFI, a revisão dos cenários macrofiscais é realizada em maio e novembro, mas as incertezas associadas à pandemia de coronavírus “requereram diversas revisões extraordinárias desde março de 2020”. A instituição atribui a necessidade do documento em maior periodicidade também a recente divulgação do PIB do segundo trimestre de 2021, com recuo de -0,1% em relação ao primeiro trimestre, e ao “conjunto de riscos que combinaram-se para adicionar incerteza ao quadro econômico prospectivo”.
“Apesar do forte crescimento interanual, o PIB (em volume) apresentou queda de 0,1, mantendo-se no patamar anterior ao surgimento do novo coronavírus, no quarto trimestre de 2019. Mesmo com o avanço na campanha de vacinação, o resultado do segundo trimestre representou uma importante desaceleração do ímpeto da atividade, após ter registrado crescimento de 1,2% nos primeiros três meses do ano”, diz a instituição.
Mesmo com a variação do PIB igual a zero nos dois trimestres, o RAF aponta que o efeito estatístico deixado para o segundo semestre de 2021 indica que a economia poderá crescer a 4,9%. “Essa passa a ser a nossa projeção preliminar para o ano, acima dos 4,2% estimados no cenário base da IFI contido no RAF de junho”, diz a nota.
Em agosto, a instituição já alertava para a alta das projeções, o que não deve, segundo a IFI, ser confundido com a dinâmica de deterioração das condições de crescimento econômico indicada no novo relatório. Segundo a análise, existem dois vetores opostos na conjuntura macroeconômica geral. O primeiro é o desempenho positivo do PIB, entre janeiro e junho, que “melhorou a arrecadação tributária e o indicador dívida/PIB”, em razão da alta dos preços das commodities, da desvalorização do real em relação ao dólar e da inflação. Segundo, o quadro de inflação elevada e os riscos que “pioraram as perspectivas do mercado para o desempenho da atividade econômica” no segundo semestre.
Entre os riscos, o RAF aponta a alta dos juros para conter a inflação elevada (9,7%, pelo IPCA, no acumulado em 12 meses até agosto), o risco fiscal crescente, a crise hídrica e energética e o risco político-institucional. “O prêmio pelo risco aumentou, a curva a termo de juros está mais pressionada e, consequentemente, a dívida pública praticamente estacionou, em julho, sugerindo interrupção da tendência de queda nos próximos meses”, destaca.
Estagnação
De acordo com a Instituição Fiscal Independente, a probabilidade de estagnação na segunda metade do ano é alta. A projeção que era mantida em 4,2% para o PIB de 2021, já com viés de alta desde o relatório de agosto, passou a 4,9% no novo documento, “em um contexto de piora evidente do quadro prospectivo”, diz a nota.
“Isto é, a revisão seria maior, não fosse o novo futuro que se desenha. A saber, o PIB de 2022 deverá crescer a apenas 1,7%, conforme revisão preliminar da seção de Contexto Macroeconômico”, informa o relatório. Segundo a IFI, em outubro, será apresentada a revisão completa dos cenários nas três versões — base, otimista e pessimista.
Ainda segundo a instituição, embora o documento divulgado nesta quartara possa soar otimista em uma primeira leitura, ele revela os efeitos do desempenho de meses passados da atividade economica no país e da incorporação de um PIB “estatisticamente mais alto do que a IFI projetava”. “Essa distinção é importante. De um lado, os sinais para o segundo semestre são negativos. De outro, a arrecadação reflete a dinâmica do crescimento do PIB”, pontua.
Dívida pública voltará a crescer
A IFI aponta que a dívida pública bruta, que vinha diminuindo em proporção do PIB desde o início do ano, caiu apenas 0,1 p.p. do PIB entre junho e julho, o que é um “prenúncio de que voltará a crescer em breve”. O relatório também destaca que a Instituição alertou que a ajuda da inflação sobre a dívida/PIB era temporária.
“A resistência da inflação à alta dos juros, explicada por um quadro de riscos crescentes, levará a uma alta mais expressiva da Selic, que poderá chegar a 8% até o fim de 2021”, diz a nota. A última previsão da IFI para a Selic foi de 5,5%, em junho deste ano. Segundo a instituição, a sensibilidade da dinâmica da dívida aos juros é alta, e “o custo médio das novas emissões do Tesouro está aumentando a cada mês, redundando em custo médio total mais elevado”.
“Esse risco fiscal não é abstrato. Deriva de decisões e sinalizações com impacto fiscal potencialmente relevante”, afirma.
Teto de gastos
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 23/21 que altera regras de pagamento dos precatórios e a reforma do Imposto de Renda (PL 2.337/21) também foram objetos de análise da IFI. “A reforma do IR gerará perdas relevantes de arrecadação já em 2022. (...) A respeito dos precatórios, o parcelamento, a retirada dessas despesas do teto ou a fixação de um limite máximo de pagamento são saídas que embutem uma alteração significativa no teto de gastos”, alerta o documento.
Segundo o RAF, o espaço fiscal aberto no teto, em 2022, poderia ficar em R$ 39,2 bilhões. No caso da PEC 23, a lacuna seria de R$ 48,6 bilhões se retirada do teto ou da fixação de limite anual. Qualquer uma das duas opções, aponta a IFI, impactaria negativamente no mercado financeiro.
“Qualquer uma dessas soluções, mesmo incorporada na Constituição, não anularia os efeitos negativos sobre as expectativas dos agentes econômicos e, consequentemente, sobre a taxa de câmbio, a inflação e os juros. Essa apreensão já aparece nos juros precificados, hoje, pelo mercado, para diferentes prazos, afetando a dinâmica da dívida”, reforça.
Nas contas da instituição, seria possível cumprir o teto de gastos no ano que vem, com despesas discricionárias em R$ 104 bilhões e pagamento integral dos precatórios (R$ 89,1 bilhões). E que “sobrariam” R$ 14 bilhões para a expansão do Bolsa Família ou do seu substituto, o Auxílio Brasil, sem paralisar a máquina pública. “O quadro seria de risco moderado de rompimento do teto, na classificação da IFI, mas muito próximo de saltar a elevado, já que o nível mínimo de discricionárias para um shutdown é estimado pela IFI em R$ 103 bilhões”, pontua.
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