A inflação, que não dá trégua e castiga o bolso dos brasileiros, surpreendeu mais uma vez e registrou alta de 0,87% em agosto, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em julho, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) tinha avançado 0,96%, mas apesar da desaceleração, a taxa de agosto ficou acima dos 0,60% a 0,70% esperados pelo mercado financeiro, e foi a maior para o mês desde 2000, devido, principalmente, à forte pressão dos itens energéticos — gasolina, etanol e conta de luz.
Mas o dragão inflacionário é mais cruel com os mais pobres. Enquanto o IPCA subiu 5,67% no ano e 9,68% nos últimos 12 meses, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a inflação das famílias com renda de até cinco salários mínimos, já chegou à casa de dois dígitos, e acumula avanço de 10,43% nos últimos 12 meses, após alta de 0,88% em agosto.
Alimentação e transportes (com o peso dos combustíveis) foram os grupos que mais pesaram no IPCA, que, na variação anual, já está muito acima do teto da meta estabelecida para 2021, de 5,25%. A gasolina e o etanol, por exemplo, já acumularam altas de 40,75% e 31,09%, respectivamente, de janeiro a agosto. Especialistas alertam para o fato de que, em setembro, o IPCA vai acelerar, porque haverá o impacto da nova bandeira tarifária na conta de luz.
“Os alimentos ficaram mais caros devido às geadas. Mas a inflação de serviços também surpreendeu, e tem a ver com a vacinação e o aumento da circulação das pessoas”, destacou Fábio Romão, economista sênior da LCA, que prevê alta de 1% no IPCA de setembro. Segundo ele, a tendência para os próximos meses é de aceleração dos preços em serviços, como alimentação fora do domicílio, o que ajudará a manter a inflação disseminada. Em agosto, o Índice de Difusão do IPCA ficou em 72%, o que é “preocupante”, segundo Romão. “Quando a difusão fica acima de 70%, significa que a carestia continuará persistente”, explicou.
O economista André Braz, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), também avalia que a inflação não deve arrefecer tão cedo. “Os itens energéticos vão continuar pesando em setembro e nos próximos meses. Mas o que está chamando a atenção é a inflação de serviços, que tem preços de transporte por aplicativo a streaming de TV subindo, o que mostra que a inflação está muito espalhada, e, por isso, as previsões para o IPCA não param de aumentar”, destacou.
Selic de até 10%
Na avaliação dos analistas, como a inflação tende a ficar mais alta do que se projetava, tanto neste ano quanto no próximo, o Banco Central será obrigado a acelerar o ritmo de alta da taxa básica de juros (Selic) nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom). As projeções para a Selic no fim deste ano variam entre 8,5% e 10%, porque o BC precisará corrigir, de forma contundente, o erro de avaliação de alguns meses atrás, quando dizia que a inflação era temporária.
Para Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, o BC deverá elevar a Selic em 1,25 ponto percentual na próxima reunião do Copom, nos dias 21 e 22 deste mês, a fim de mostrar que é independente e que vai priorizar o controle da inflação. “O IPCA vai passar de 10% em setembro e isso vai colocar pressão no BC para ser mais agressivo com os juros, porque estamos em um momento de crise acelerada sem uma solução de curto prazo. A Selic vai a, pelo menos, 8,5% em dezembro e o BC tem que sinalizar isso rapidamente”, disse.
“O IPCA deverá encerrar o ano em 9,5% e, no ano que vem, deve ficar entre 4,5% e 4,7%. Vai ser acima da meta, e com PIB fraco, em torno de 1% ou zero. O BC precisará ser responsável. Se subir demais a Selic, não adianta nada”, avaliou o ex-diretor do BC e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens e Serviços (CNC) Carlos Thadeu de Freitas Gomes. Segundo ele, o BC precisará manter os juros reais (descontada a inflação) em 3%, que é o patamar neutro, para não prejudicar muito a atividade e, ao mesmo tempo, controlar a inflação. “E, para ter esse juro real neutro, o BC terá que subir a Selic para 10% ao ano, provavelmente, até dezembro”, avaliou.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.
Brasília é a recordista entre capitais
O aumento do custo de vida pesou mais para os moradores de Brasília do que para os demais brasileiros. Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a capital registrou a maior alta do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) entre as 16 pesquisadas.
A variação da inflação oficial na capital federal foi de 1,40% em agosto na comparação com julho, acima da média nacional, de 0,87%. A alta foi puxada pelos aumentos dos preços da gasolina e do etanol, que também tiveram as maiores altas entre as cidades pesquisadas, de 7,76% e 7,09%, respectivamente. A energia elétrica também ajudou, pois subiu 3,67% no quadradinho.
Diante da alta dos preços sem fim, o corretor de imóveis Júlio Oliveira, 52 anos, tenta equilibrar as finanças como pode. “Tudo está subindo muito e muito rápido. E o nosso salário só encolhe”, lamentou. “Hoje em dia, eu troquei a maioria daquilo que comprava por coisas mais baratas. Até o detergente que uso é de outra marca. E, com a gasolina no preço atual, quase não saio mais de carro, e tenho feito minhas atividades a maioria a pé ou de metrô”, contou.
O servidor público Lucas Carvalho, 44, disse que nunca tinha presenciado um momento de preços tão altos. “Hoje, com R$ 100 vamos ao mercado e saímos com uma sacolinha pequena. Nosso dinheiro não rende quase nada mais”, afirmou ele, que mora em Brasília há 14 anos. Assim como o corretor Júlio Oliveira, o servidor disse que costuma trocar produtos de marcas mais caras pelas mais baratas no supermercado.
No acumulado do ano, o IPCA em Brasília registrou elevação de 5,56%. Em 12 meses até o mês passado, a alta da inflação na capital federal foi de 8,61%, ficando abaixo da média nacional, de 9,68%. Sete cidades já registram IPCA de dois dígitos no acumulado em 12 meses. São elas: Vitória (11,07%), Curitiba (12,08%), Campo Grande (11,26%), São Luís (11,25%), Porto Alegre (10,42%), Rio Branco (11,97%) e Fortaleza (11,20%). A região metropolitana de Belo Horizonte registrou a menor alta do IPCA em agosto, de 0,43%. (RH, com colaboração de Gabriela Bernardes*)