A Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) referente ao mês de junho, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nessa quarta-feira (11/8), surpreendeu negativamente especialistas ligados ao setor, como Fábio Bentes, economista da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Segundo ele, a queda de 1,7% das vendas do comércio registrada no mês de junho faz com que o índice seja o pior para o mês (ante maio), desde 2002.
“A gente teve os meses de abril e maio com variações bastante expressivas, com crescimento nas vendas de 2,5% e 2,7%, respectivamente. A expectativa predominante para junho era uma alta de pelo menos 1%, mas veio a queda”, explica Bentes.
Segundo o IBGE, o setor acumulou em junho 6,7% no ano e 5,9% nos últimos 12 meses. Apesar do recuo no ajuste sazonal, a pesquisa aponta que o comércio varejista aumentou 6,3%, ante junho de 2020. Na comparação por período, é a quarta vez que o setor mantém taxas positivas. Segundo a PMC, quase todos os setores que vinham apresentando crescimento tiveram queda em junho, inclusive o setor de alimentos. No comércio varejista ampliado, que inclui veículos, motos, partes e peças e material de construção, também houve redução de 2,3% no volume de vendas do mês, em relação a maio.
Embora tenha registrado queda na análise mensal, o comércio varejista ampliado, se comparado ao mesmo período de 2020, teve alta de 11,5%. Nos últimos 12 meses, o aumento nas vendas foi de 7,9%, o que mostra recuperação do cenário de crise da pandemia da covid-19.
“Por conta das quedas pronunciadas de março a junho de 2020, o varejo apresentou ganho, sobretudo nas atividades mais afetadas, como de tecidos, vestuário e calçados e outros artigos de uso pessoal e doméstico, que voltaram a registrar taxas de dois dígitos no campo positivo. (Com a queda registrada em junho) O patamar do varejo volta a se distanciar do seu recorde histórico”, diz comunicado do IBGE.
Para Bentes, o que está por trás do cenário inesperado e decepcionante, é a alta inflação, especialmente na tarifa de energia elétrica, combustível e alimentação que reduziu o poder de compra das famílias. “As vendas do comércio cresceram após a segunda onda da pandemia, em abril. Embora a inflação de junho deste ano não tenha sido tão alta, com 0,53%, quando se olha os preços dos produtos comercializados no IPCA, em junho houve uma alta de 1,56%. Com o alto preço em itens básicos, não sobram recursos para gastos com vestuário e artigos pessoais”, exemplifica.
De acordo com o economista, após dois meses com altas expressivas, em abril e maio, a queda de junho e a “contaminação” da inflação no varejo, são um sinal de alerta. “Isso causa preocupação para a segunda metade do ano, pois a inflação é um processo que vai levar meses para ser controlado”, afirma.
Setor automotivo
Os dados do IBGE demonstram a atual crise enfrentada pela indústria automotiva, uma das que mais sentiram o tombo na fase crítica da pandemia. A escassez de peças e componentes para a fabricação de veículos deu uma verdadeira rasteira no setor que ainda tentava se levantar, a queda na indústria, naturalmente, refletiu em baixas vendas de veículos no país.
Segundo a PMC, em abril deste ano o setor havia apresentado crescimento de 20,3% nas vendas, desacelerou para 1,2% em maio e, em junho, apresentou recuo de -0,2%. A tendência deve se manter enquanto a crise de componentes durar. A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) divulgou na última semana dados sobre a produção industrial automotiva referente ao mês de julho, que demonstram queda de -2% na fabricação de automóveis, em comparação com junho.
Segundo o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes, a queda nas vendas ocorre porque muitos consumidores, na falta do veículo desejado novo de fábrica, preferem postergar compra. “Muitos preferem esperar para comprar novo, nem todos optam pelos seminovos”, disse ao apresentar os dados de julho, na semana passada.
Ainda segundo Moraes, a crise tende a permanecer enquanto houver falta de semicondutores e outros componentes nas montadoras. "Estamos sendo muito impactados, devido ao custo de matéria como plástico e aço, que tiveram aumento de até 100%. Temos esse desafio no setor automotivo”, afirmou.
Para se ter uma ideia do tamanho da queda sofrida pelo varejo automotivo no país, em abril do ano passado, quando a indústria ainda não tinha sentido os efeitos da pandemia tão duramente, a variação de vendas de veículos foi de 131,9%. Os números caíram em maio e em junho de 2020 para 72,4% e 33,1%, respectivamente. O setor de vendas de veículos terminou o ano de 2020 com queda de 26,2% comparado ao ano anterior. O baixo volume representou o maior tombo do setor desde 2015, quando, em meio à recessão brasileira, chegou a 26,6%.