Empresas distantes da digitalização
O presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Igor Calvet, considera que o Brasil ainda precisa percorrer um longo caminho para que suas empresas se tornem competitivas digitalmente. Em entrevista, ontem, ao CB.Poder — parceria entre o Correio Braziliense e a TV Brasília —, ele apontou que é fundamental que os setores da economia alterem a forma como fazem negócio e se relacionam com os clientes e fornecedores por meio do aprofundamento da tecnologia da informação.
De acordo com uma pesquisa que a ABDI realizou em parceria com a Fundação Getulio Vargas (FGV), a transformação digital de micros e pequenos negócios no Brasil está em estágio inicial. Segundo o levantamento, a média de maturidade digital dessas empresas é de 40,77 pontos, em uma escala que varia de zero a 100 pontos, sendo zero nada digital e 100 totalmente digital.
“É uma pesquisa representativa, do ponto de vista estático, e podemos fazer inferências nacionais a partir dela. Fomos de norte a sul do país e aproximadamente sete em cada 10 empresas ainda estão em níveis iniciais. Isso não basta. Ainda temos um longo caminho para nossas empresas se tornarem competitivas”, afirmou Calvet.
Segundo o presidente da ABDI, para a evolução da digitalização empresarial brasileira é necessário investimento em políticas públicas e na educação de micro e pequenos empresários. “A pesquisa traz algo que é fundamental para os grupos empresariais — que precisam entender que isso é necessário para seu processo de competitividade, como no engajamento de clientes — e para o governo, já que parte do processo de digitalização também é dado por uma infraestrutura tecnológica”, salientou.
Calvet aproveita para fazer um alerta: os jovens que estão entrando no mercado de trabalho precisam atentar para as novas demandas das empresas, que cada vez mais exigem habilidades voltadas à tecnologia da informação. Confira a seguir os principais pontos da entrevista.
Por que a digitalização das micros e pequenas empresas é importante para a economia?
Com o avanço da crise sanitária, as pessoas e as empresas começaram a mudar muitos dos seus hábitos. Assim, para as empresas, que são o motor da nossa economia, alterar a forma como se faz negócio e se relaciona com os clientes e fornecedores é fundamental — e isso passa, hoje, pela digitalização. Um dado do Fórum Econômico Mundial mostra que a economia digital vai movimentar algo em torno de US$ 100 trilhões nos próximos 10 anos. O importante desse dado é sermos capazes de preparar nossas empresas para capturar parte desse valor, o que só será possível se estiverem digitalmente preparadas.
Uma pesquisa recente da ABDI, em parceria com a Fundação Getulio Vargas, mostrou que o nosso processo de digitalização ainda está em fase inicial, com 66% das micros e pequenas empresas brasileiras ainda engatinhando nesse processo. Por quê essa demora?
Essa é uma pesquisa que nós realizamos com mais de 2,5 mil empresas no Brasil. É uma sondagem representativa, do ponto de vista estático, e podemos fazer inferências nacionais a partir dela. Fomos de Norte a Sul do país e entramos em contato com empresas da indústria, do comércio e dos serviços — portanto, temos um grande quadro de como estamos digitalmente. Aproximadamente sete em cada 10 empresas no Brasil ainda estão em níveis iniciais: já utilizam alguma ferramenta digital, têm seu próprio site, utilizam internet de banda larga — mas param por aí. Ainda temos um longo caminho para nossas empresas se tornarem competitivas.
Há alguma resistência dos empresários? Falta alguma política pública?
A pesquisa nos mostra que há um conhecimento das necessidades das empresas de se incluir ou evoluir, modernizando-se digitalmente. Há, então, um trabalho não só de sensibilização, que é parte disso, pois ainda temos muitas empresas que não sabem que devem fazer isso, mas também temos um trabalho de fomento de políticas públicas. Acho que essa pesquisa traz algo que é fundamental para os grupos empresariais — que precisam entender que é necessário para seu processo de competitividade, como no engajamento de clientes — e para o governo, já que parte do processo de digitalização também é dado por uma infraestrutura tecnológica.
Quais os ramos empresariais que estão mais atrasados e têm uma maior resistência para aderir a essa digitalização?
Em uma escala de zero a 100, a pesquisa revela que o setor de serviços é o mais bem situado em relação ao comércio e às indústrias — com uma escala de 46, ainda abaixo da média dos 50%. Então, o segmento de serviços, muito possivelmente por ter um contato mais próximo com o cliente no dia a dia, já acordou para isso e está um passo adiante. Em uma situação intermediária, nós temos a nossa indústria e, por fim, o comércio.
Qual a relação entre empregos e digitalização? Há uma mudança no perfil? Que tipos de empregos são criados com a digitalização?
Há alguns dados com os quais trabalhamos que dizem que empresas que se digitalizam crescem três vezes mais rápido do que as que não entram (nesse setor). Há mais ou menos dois anos, nós realizamos uma pesquisa com mais de 1,4 mil jovens de todo o Brasil e essa pesquisa falava um pouco sobre o futuro do trabalho. Naquele momento, 80% dos jovens pensavam em profissões tradicionais, como direito, enfermagem ou administração de empresas. E o que mais surpreendeu foi que essa era a ideia dos jovens, mas a das empresas, ao contrário, era outros tipos de empregos. Então, naquele momento, havia uma dissociação entre o que as empresas queriam e o que os jovens projetavam para seu futuro. Começamos a trabalhar com os ministérios da Economia e da Educação na formação de novas bases para os currículos das instituições federais de ensino. Precisamos trabalhar com educação técnica, que ensina rapidamente ofícios aos estudantes, que conseguem fazer essa mudança rápida para o (mercado de) trabalho. Os profissionais novos e mais experientes precisam adquirir novas habilidades.
O 5G ajudará na digitalização?
É fundamental para todo tipo de empresa, não importa o porte ou a localidade, porque nós estamos entrando na era em que as máquinas vão conversar com as máquinas, e a gente, às vezes, vai ficar de espectador. As empresas vão conseguir aumentar a produtividade enormemente.
*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi