Entregue ontem pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), a proposta da segunda etapa da reforma tributária reduz a incidência do Imposto de Renda para a classe média e para empresas, mas aumenta a tributação sobre dividendos e altera as alíquotas para investimentos financeiros em geral. No caso das pessoas físicas, a principal mudança sugerida é a atualização na tabela do IR. O projeto aumenta a faixa de isenção dos atuais R$ 1,9 mil para R$ 2,5 mil. Com isso, mais de 5,6 milhões de contribuintes deixarão de pagar o IR em 2022, totalizando 16,3 milhões de isentos, de acordo com estimativas do governo.
As demais faixas da tabela também sofrerão ajustes, o que resultará em diminuição do valor recolhido na fonte por contribuintes de ganhos mais elevados. No entanto, o governo não cumpriu a promessa de campanha.
O modelo de tributação do IRPF leva em conta as faixas de renda para calcular o imposto. Desse modo, caso o projeto seja aprovado pelo Congresso, quem recebe salário de R$ 5 mil, por exemplo, terá de pagar IR apenas sobre 50% dos vencimentos. Nesse cenário, a faixa que contempla os que recebem entre R$ 2,5 mil e R$ 3 mil mensais será a maior beneficiada. Segundo o Ministério da Economia, esses cidadãos pagarão 60,6% a menos no Imposto de Renda. Entretanto, todas as faixas serão beneficiadas com a atualização da tabela. Ao entregar o projeto ao presidente da Câmara, Paulo Guedes disse que a proposta vai reduzir o imposto de 30 milhões de assalariados.
De acordo com Claudemir Malaquias, chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita Federal, com a alteração na faixa de isenção do IR, o governo abrirá mão de R$ 13,5 bilhões na arrecadação em 2022. Esse valor pode chegar a R$ 14,46 bilhões em 2023, e a R$ 15,44 bilhões em 2024.
Declaração
A proposta também restringe o uso da declaração simplificada no ajuste anual de contas com o Fisco. Normalmente indicada para aqueles que não possuem muitas despesas para deduzir, esse modelo permite um abatimento de 20% sobre todos os rendimentos tributáveis. O projeto mantém esse tipo de declaração apenas para os contribuintes com renda até R$ 40 mil por ano (cerca de R$ 3,3 mil mensais). Os demais terão que fazer a declaração completa, mais detalhada.
Outra mudança prevista é a possibilidade de atualizar, na declaração, os valores de imóveis, mediante pagamento de uma alíquota de 5%. Atualmente, os proprietários declaram os imóveis pelo valor original de compra. Em caso de venda, precisam pagar entre 15% e 22,5% sobre o eventual ganho com a valorização do bem (ganho de capital).
O IR das empresas também vai diminuir, caso o projeto seja aprovado. A alíquota passaria dos atuais 15% para 12,5%, em 2022, e para 10% em 2023. Segundo Malaquias, a medida implicará perda de receita de R$ 18,52 bilhões em 2022; de R$ 39,2 bilhões, em 2023; e de R$ 41,53 bilhões em 2024.
Investimentos
De acordo com os cálculos do governo, a perda de arrecadação com as alterações no IRPF e IRPJ será coberta pela tributação de dividendos — parte dos lucros de empresas distribuída aos acionistas —, que deixaram de ser tributados em 1996. O projeto prevê que os dividendos passem a ser tributados com alíquota de 20% na fonte. Segundo Malaquias, a receita com a nova tributação será de R$ 18,5 bilhões, em 2022; de R$ 54,9 bilhões, em 2023; e de R$ 58,16 bilhões em 2024.
Além disso, a proposta unifica em 15% a alíquota cobrada sobre a maioria das aplicações financeiras, como fundos de investimentos e ativos de renda fixa, independentemente do período em que o dinheiro fica investido. Hoje a tributação varia entre 22,5% e 15%, dependendo do tempo de aplicação — quanto maior o prazo, menor o imposto.
Em outra mudança que desagradou o mercado financeiro, o projeto acabou com a isenção dos rendimentos pagos aos cotistas dos Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs), que também passarão a ser taxados em 15%, caso o texto seja ratificado pelo Congresso. A proposta, no entanto, mantém a isenção do IRPF para os rendimentos pagos por Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e Letras de Crédito Agrícola (LCA). Técnicos do Ministério da Economia negaram pressões da bancada ruralista e justificaram a medida como resultado de uma “análise de cenário e da pandemia”.
Para o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a proposta do governo é menos ousada do que se imaginava. “Teve toda a discussão de colocar o imposto sobre lucros e dividendos, mas houve pequena mudança na tabela do IRPF”, avaliou o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale.
Para Vale, o projeto poderia ter uma gradação maior nas faixas de renda mais altas. No caso do tributo sobre a atualização dos imóveis, o governo também poderia cobrar uma alíquota maior para as propriedades mais caras. “O projeto pecou um pouco pela ausência de uma progressividade maior a não ser sobre a questão imposto sobre lucros e dividendos”, resumiu.
André Perfeito, economista-chefe da Necton Investimentos, destacou a incerteza sobre os efeitos que as medidas terão na arrecadação do governo. “A nossa leitura preliminar do documento — há muito o que analisar ainda da proposta — vê com bons olhos a simplificação de alíquotas e a correção da tabela do IR. O efeito total sobre a arrecadação ainda não foi estimado e esse é um dos pontos que temos que nos aprofundar”, afirmou.