CONJUNTURA

BC deve seguir com a alta de juros na próxima reunião do Copom em agosto

Copom deixa claro que, para impedir a disseminação das pressões inflacionárias, não deve interromper o processo de ajuste. Para a maioria dos analistas, taxa Selic deve chegar a 6,5% no fim do ano, mas há quem veja espaço para subida maior

O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, decidiu, nesta quarta-feira (16/6), elevar a taxa básica da economia (Selic) em 0,75 ponto percentual, para 4,25% ao ano, conforme era esperado pelo mercado e havia sido sinalizado pelo colegiado, na reunião anterior. A decisão foi unânime e o comitê informou, no comunicado, que deve manter o ritmo de alta na próxima reunião, de 3 e 4 de agosto, elevando a Selic para 5% ao ano.

O Copom ainda sinalizou que não vai interromper o ciclo de alta dos juros, iniciado em março, ao retirar a palavra “parcial” quando se referiu à normalização das taxas. Diante disso, alguns analistas não descartam uma alta maior, de 1 ponto percentual, na próxima reunião.

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“Neste momento, o cenário básico do Copom indica ser apropriada a normalização da taxa de juros para patamar considerado neutro. Esse ajuste é necessário para mitigar a disseminação dos atuais choques temporários sobre a inflação”, destacou o comunicado. “O Comitê enfatiza,novamente, que não há compromisso com essa posição e que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar o cumprimento da meta de inflação”, ressalvou.

Após nota, aumentaram as apostas de que a Selic deve encerrar o ano em 6,5%, patamar atualmente considerado neutro, ou seja, quando o juro real (descontada a inflação) é zero. Devido ao aumento das estimativas do custo de vida deste ano, após a surpresa da alta de 0,83% no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de maio, algumas projeções para o indicador da inflação oficial estão entre 6,5% e 7%, bem acima do teto da meta deste ano, de 5,25%, e da mediana das estimativas do mercado coletadas pelo BC no boletim Focus, de 5,82%.

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Previsões

Dependendo do comportamento dos preços nos próximos meses, especialistas não descartam que o BC poderá elevar a Selic para 7% em dezembro, porque as previsões para a inflação de 2022 já estão acima do centro da meta, de 3,5%. “Algumas estimativas já mostram o IPCA em 4,5%”, destacou o economista-chefe da RPSCapital, Gabriel Leal de Barros. Ele esperava que o BC desse uma sinalização mais agressiva, elevando a Selic para 4,5%, uma vez que as expectativas de inflação do mercado estão desancoradas das projeções do BC.

Barros lembrou que a alta dos preços administrados, como a energia, na esteira da crise hídrica, pode pressionar indiretamente os preços dos alimentos neste ano e no próximo. “Todos os argumentos usados pelo comunicado justificavam uma alta de 100 pontos base, mas parece que eles ficaram constrangidos pela comunicação atrasada que vinham conduzindo. Reconheceram o erro hoje e houve um ajuste daqui para frente”, avaliou. “A inflação está surpreendendo mês a mês. O mercado está questionando e não acredita no cenário do Banco Central. E se ele continuar fazendo a mesma coisa, que não está funcionando, não vai mudar”, afirmou.

O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, reconhece que as chances de as pressões inflacionárias continuarem fortes não podem ser ignoradas, e por conta disso, o BC acabou sinalizando um pouco essa preocupação ao descartar o processo de normalização parcial. “A discussão agora é se uma Selic de 6,5% será suficiente para manter a inflação de 2022 dentro da meta, como ele vem prometendo, ou se será preciso subir a Selic acima da taxa neutra”, afirmou. Segundo Vale, o cenário de inflação para 2021 do BC, de 5,8%, não deverá ser concretizado, e, por conta disso, as chances de a Selic encerrar o ano em 6,5% são grandes, “podendo ir para 7%”.

Para Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, que prevê Selic a 6,5% em dezembro, o comunicado do BC não surpreendeu, mas deu sinalizações importantes. “O Copom vai manter o ritmo de alta de 0,75 ponto percentual, o que não é pouca coisa, repetindo uma postura mais agressiva, além de retirar a normalização parcial, o que significa que vai manter o ritmo até o nível neutro mais rapidamente. Podem chegar a 6,5% em outubro, mas optamos em manter nossas projeções”, afirmou.
De acordo com o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Carlos Thadeu de Freitas Gomes, as altas na Selic não vão ter efeito na inflação, e o risco é atrapalhar a recuperação da economia. “A inflação não vem ocorrendo por conta da demanda, que continua fraca. O problema é a oferta”, afirmou.

Nos EUA, alta só em 2023

O Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) anunciou ontem que vai manter a taxa básica de juros do país entre zero e 0,25% ao ano, como já era esperado pelo mercado, e só deve aumentá-la em 2023. A decisão foi unânime e indica que a instituição continuará a usar as ferramentas que têm para estimular a economia norte-americana.


Mesmo assim, a sinalização de que os juros na maior economia do planeta vão subir, ainda que não de imediato, e o reconhecimento do presidente do Fed, Jerome Powell, de que a inflação por lá teve um avanço “notável”, mexeu com os mercados. Nos EUA, os principais indicadores das ações fecharam em baixa: o índice Dow Jones recuou 0,77%, o S&P 500 caiu 0,54% e o Nasdaq teve perda de 0,24%.


No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo recuou 0,64%, para 129.259 pontos. O dólar, que chegou a ser negociado abaixo de R$ 5 pela primeira vez em um ano, batendo R$ 4,99 no final da manhã, voltou a subir depois da decisão do Fed e terminou o dia em alta de 0,34%, cotado a R$ 5,06 para venda, no câmbio comercial.


As taxas de juros também subiram, refletindo o aumento dos rendimentos pagos pelos títulos do Tesouro norte-americano com prazo de 10 anos, que foi de 1,48% ao ano, antes do comunicado do Fed, para até 1,57% depois, renovando máximas durante a entrevista de Jerome Powell.


O presidente do Fed afirmou que a inflação dos Estados Unidos acelerou de forma “notável” e “acima das previsões” nos últimos meses, provocada pelo conjunto de fraca base comparativa de 2020, alta nos preços do setor de energia e retomada dos gastos com consumo.

Impacto

Gargalos na cadeia de suprimentos que afetam o nível de preços no país “têm sido maiores” que o esperado, disse Powell. Segundo ele, os preços mais afetados são aqueles impactados pela retomada da economia americana, como o de carros usados, onde há uma “tempestade perfeita” de alta demanda e baixa oferta.


Apesar disso, o BC norte-americano não vê um cenário preocupante para os próximos meses. O Fed prevê que a inflação americana deve chegar a 3,4% neste ano — a previsão anterior, feita em março, era de 2,4%. Depois disso, os preços devem se estabilizar, com a inflação ficando perto da meta da instituição: de 2,0% a 2,1%, em 2022, e 2,2%, em 2023.
Caso os índices de preços nos EUA fiquem acima das previsões, possibilidade considerada por Powell, o Fed pode ajustar a sua política monetária, disse ele. Isto só ocorrerá, porém, após uma “sinalização antecipada” da autoridade monetária americana, frisou.