As desigualdades aumentaram no Brasil e o fosso entre ricos e pobres se alargou, durante a contaminação pelo novo coronavírus, de acordo com a pesquisa Bem-Estar Trabalhista, Felicidade e Pandemia, da Fundação Getulio Vargas (FGV-Social). Os dados apontam que, no primeiro trimestre de 2020, a renda média da população chegou ao maior ponto da série histórica, iniciada em 2012, de R$ 1.122. No entanto, em menos de um ano, caiu 11,3% e chegou ao ponto mais baixo da série, de R$ 995, primeira vez abaixo de R$ 1 mil na história.
Os mais pobres ficaram em situação preocupante. O estudo destaca que a média das rendas individuais do trabalho na população em idade de trabalhar, incluindo os sem trabalho, caiu 10,89% na pandemia. Mas do lado dos vulneráveis, a queda de renda foi 20.81%, quase duas vezes maior que a da média. Um dos motivos da situação de penúria foi a queda nos índices de emprego. “A renda média geral caiu 10,89%, na verdade, devido ao aumento de 3,16 pontos percentuais na taxa de desemprego”, explica o economista Marcelo Neri, diretor da FGV-Social e responsável pela pesquisa.
No entanto, o dado que chama a atenção, informa o economista, é também a desocupação (não procura por emprego causada pelo distanciamento social). “Na metade mais pobre observamos importância do efeito desocupação explicando mais de 80% da queda de renda de 20,89% deste grupo. Em suma, a perda de ocupação (desemprego e participação trabalhista) foi o principal responsável pela queda de poder de compra médio dos brasileiros”, afirmou. Para que a situação não se propague rapidamente, é preciso de um ágil avanço da vacinação, de forma que pelo menos 70% da população esteja imunizada.
“O Brasil piorou de forma geral, mas os efeitos na parte mais pobre foram mais significativos. Foi um problema de política pública. Os três níveis de governo (estadual, municipal e federal) têm dificuldade de lidar com problemas coletivos e, por isso, tivemos poucos avanços e muita decepção das pessoas. Uma pesquisa que envolve outros 40 países aponta que aumentaram os sentimentos de raiva, preocupação, estresse e tristeza. A nota média de satisfação da vida presente do brasileiro caiu de 6,5 em 2019 para 6,1 em 2020. No resto do mundo, ficou parada durante a pandemia em torno de 6,0”, reforça Neri.
Queda na prosperidade
A queda da felicidade se dá em todo o país, “principalmente nos 40% mais pobres (-0,8%) e no grupo do meio (-0.2) situados entre 40% a 60% da renda”, contabiliza Marcelo Neri. Já os grupos mais abastados mantiveram a satisfação com a vida. “Ou seja, há aumento da desigualdade de felicidade na pandemia. A diferença de satisfação com a vida entre os extremos de renda era de 7,9% em 2019 sobe para 25,5%”, informa ele. Além disso, lembrou, o índice de Gini (que mede o grau de desigualdade de renda, que vai de 0 a 1, e o 0 significa desigualdade total) do Brasil estava em 0,642, no primeiro trimestre de 2020. “A pandemia adiciona mais três centésimos, levando o indicador a 0.674 no primeiro trimestre de 2021, um recorde”, reforça Neri.
Cleonice Lima, de 38 anos, perdeu o emprego fixo em uma cafeteria, que precisou reduzir o número de funcionários no início da pandemia. Mãe solteira de dois filhos, Cleonice conseguiu o benefício do auxílio emergencial e se aventurou no trabalho informal para se sustentar durante esse período. “Para me viver, passei a fazer bicos de diarista e vender bolos na minha rua, mas está sendo um período bem difícil”, lamenta. “Tenho esperança de que tudo isso passará e eu vou conseguir outro emprego que sustente a minha casa com segurança, afirmou.
* Estagiárias sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza