Jornal Correio Braziliense

CORREIO TALKS

Correio Talks: simplificação do sistema de impostos vai ajudar Brasil a sair da crise

Especialista diz que simplificação e racionalização do sistema de impostos são essenciais para que a economia do país consiga sair da crise e ganhar competitividade. Tema será debatido, amanhã, em evento promovido pelo Correio e pela CNI

É praticamente consenso entre analistas que o elevado grau de complexidade do sistema tributário brasileiro é um dos principais obstáculos ao crescimento mais rápido do país. Para debater os desafios e a necessidade de uma reforma tributária ampla, o Correio Braziliense promoverá, em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), um evento on-line, com a participação de empresários e especialistas no assunto. O Correio Talks ocorrerá amanhã, a partir das 9h30 e contará com a presença de nomes como Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e um dos autores da PEC nº 45/2019, da reforma tributária; o senador Roberto Rocha (PSDB-MA), que presidiu a Comissão Mista da Reforma Tributária no Congresso; o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara; e Armando Monteiro, conselheiro emérito da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Quem também participará do seminário é Melina Rocha, especialista em reforma tributária. Para ela, a reforma deve começar com a revisão da tributação sobre o consumo, área considerada a mais problemática do sistema atual. O caminho deveria ser a construção de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), englobando tributos das três esferas de governo (União, estados e municípios): PIS/Cofins, ICMS, ISS e IPI. Tarefa que exige negociação entre as unidades federativas. “Não tenho dúvidas de que, se a gente não fizer reforma tributária, teremos muito mais dificuldades para sair da crise e promover um aumento de competitividade”, diz a economista.

Melina Rocha é diretora de cursos na York University (Canadá) e doutora pela Université Sorbonne Nouvelle (Paris). Foi consultora no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no Banco Mundial e no CCiF. Foi professora da FGV Direito-Rio entre 2011 e 2018 e é autora do livro Reforma Tributária no Brasil: Ideias, Interesses e Instituições, publicado pela Editora Juruá, em 2015. A seguir, ela aborda algumas das principais questões envolvendo a reforma e criação de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que substituiria tributos de consumo atuais.

Ambiente de negócios

Não há dúvida de que o sistema tributário atual, no Brasil, é um dos motivos principais do nosso baixo crescimento econômico, e da baixa competitividade internacional do país. Então, é imprescindível que se faça uma reforma tributária para melhorar o ambiente de negócios e ajudar a destravar o crescimento econômico. Não tenho dúvidas de que, se a gente não fizer reforma tributária, principalmente nesse contexto de tantos problemas econômicos, teremos muito mais dificuldades para sair da crise e promover um aumento de competitividade.

Peso sobre o consumo

A reforma tributária deve começar com a revisão da tributação de consumo, porque, hoje, no Brasil, ela é a mais problemática de todas. Mas uma reforma da tributação sobre o consumo envolve uma renegociação das competências federativas por meio de emenda constitucional, algo que é custoso e difícil — diferentemente da tributação sobre a renda, por exemplo, que é de competência exclusiva da União. Para você reformar e implementar um sistema minimamente racional, é preciso uma reorganização dessas competências federativas com relação a esses tributos.

Arrecadação fácil

O IVA é um imposto simples de ser arrecadado. Ele é fácil, porque você tem a certeza, a segurança jurídica de que os setores terão a mesma carga tributária. Quando você traz isso, acaba com as discussões em torno de sistemas de tributações diferenciadas para certos setores, enquadramento de certos contribuintes e benefícios fiscais — tornando o sistema extremamente simples. A implementação de um IVA vai trazer maior segurança jurídica, mais simplicidade e menos contenciosos tributários ao país.

Modelos externos

Nos modelos internacionais de IVA, existem três características principais. A primeira é a base ampla, que tributa toda e qualquer atividade econômica ou empresarial. A segunda e principal, ao meu ver, é a não cumulatividade, permitir um creditamento amplo de tudo o que é utilizado no processo produtivo e empresarial, no meio da cadeia. Ela permite justamente a desoneração total da atividade produtiva, de modo que a carga tributária só recaia ao consumidor final, por isso, é um imposto sobre o consumo. E, por fim, uma arrecadação baseada no destino das mercadorias, isto é, no local em que são consumidas.

Base a seguir

Considerando as três características (base ampla, não cumulatividade e arrecadação no destino), me parece que a CBS apresentada pelo governo (no PL nº 3887/2020) é muito próxima de um modelo IVA. Porque ela quer ter ao menos essas três características, tributando toda e qualquer atividade empresarial. Ela tem um artigo prevendo a não cumulatividade, e me parece que desonera as exportações e onera as importações.

Resistência do governo

O relatório da PEC nº 45, do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), propõe a instituição de um IBS nacional com a união de todos os tributos sobre o consumo: federais, estaduais e municipais. Então, é possível criar um IBS nacional em que você possa unir PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. É viável tecnicamente, mas a grande questão é que você tem uma grande resistência do governo federal, em entrar num sistema de imposto compartilhado com estados e municípios.

Plano para ICMS e ISS

Quando você anuncia um IVA, você tem que ter, ao menos, um plano. Você pode até começar pela CBS (que une PIS e Cofins), mas tem que ter um plano do que fazer com ICMS e ISS (tributos estadual e municipal). Caso contrário, não é um IVA dual, é só a junção de PIS e Cofins em uma CBS. O IVA dual pressupõe a criação de dois IVAs, um federal e um estadual e municipal.

Adesão dos estados

O ministro Paulo Guedes tem falado sobre a possibilidade de se criar um IVA federal pela CBS e, depois, os estados poderem optar ou não por se juntar a ele. A adesão dos estados, imediatamente, é impossível tecnicamente porque hoje o ICMS é arrecadado em parte na origem. É preciso, primeiro, que se crie um IVA na esfera subnacional que inclua estados e municípios.