Desigualdade

Entenda por que a recuperação do PIB não beneficia igualmente toda a população

Pessoas com menor grau de escolaridade foram as mais atingidas pela pandemia e são as que mais devem demorar para sair da crise

O economista Pedro Fernando Nery, consultor de economia do Congresso Nacional, alerta que, "de uma forma inédita, o Produto Interno Bruto (PIB) deve crescer bastante este ano, em parte, pela mera recuperação ao nível da pré-pandemia”. No entanto, com o PIB, "também haverá o crescimento da extrema pobreza e do desemprego, porque, sem o auxílio emergencial de R$ 600, mais pessoas vão sair à procura de emprego”.

Nery destaca, ainda, que, da forma como é medido, o crescimento do PIB esconde parte das desigualdades existentes no país. “O PIB não é uma média simples da evolução da renda de todo mundo, é uma média ponderada pelo peso da renda de cada um. Se os mais pobres vão mal, o PIB pode não sentir, porque a variação de nada é nada. Se os ricos vão bem, o PIB é mais afetado”, explica.

Um dos aspectos do agravamento da desigualdade apontados pelos analistas é que os mais ricos e com mais instrução são os menos afetados nessa crise, pois conseguem trabalhar em casa. Já os mais pobres e com pouca escolaridade se enquadram nas categorias que precisam se expor mais ao vírus, diariamente, seja no transporte coletivo, seja no comparecimento presencial dos locais de trabalho.

CB - Taxa de desemprego

Estudo divulgado no fim de maio pelo Instituto Pólis mostra que grande parte das vítimas fatais de covid-19 em São Paulo, entre março de 2020 e março de 2021, foi composta por profissionais que não concluíram a educação básica e continuaram trabalhando durante a crise sanitária, como pedreiros, empregadas domésticas e motoristas de carros de aplicativo.

Segundo o levantamento, das 30.796 mortes por covid-19 em São Paulo durante o período pesquisado, 23.628 (76,7%) foram de pessoas que não completaram o ciclo de educação básica, ou seja, tinham 11 anos ou menos de estudo.

José Ronaldo de Castro Souza Jr., diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), reconhece a desigualdade entre as diferentes classes sociais no processo de retomada econômica, e destaca que a renda dos mais pobres é a mais afetada pela inflação.

Home office

“Quem está no home office é quem tem mais escolaridade e é trabalhador formal. E, como os estudos do Ipea vem mostrando, o impacto dessa inflação crescente é maior sobre a renda dos mais pobres. A expectativa é de que essa pressão diminua na segunda metade do ano em relação ao patamar atual, mas sem dúvida, a inflação continuará elevada”, destaca.

Segundo ele, a previsão do Ipea é que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 12 meses, chegue a 5,30% em dezembro. “A tendência da inflação é de desaceleração, mas, no ano, ainda ficará acima do desejável”, lamenta Souza Jr.

O diretor do Ipea destaca, ainda, que o aumento do desemprego em 2020 foi muito grande, mas não apareceu nas estatísticas justamente por conta do auxílio emergencial. “Como o benefício foi superior à renda média de muitos beneficiados, muitos brasileiros acabaram não procurando emprego naquele período e optaram por ficar em casa. Todavia, com a redução do auxílio, o desemprego no primeiro trimestre do ano bateu recorde. Agora, enquanto começa a retomada da economia, a taxa de desemprego tende a aumentar”, alerta.

Algumas estimativas do mercado preveem que o desemprego pode chegar ao pico de 18% nos próximos meses, devendo cair conforme a vacinação permitir a reabertura do setor de serviços, o mais afetado pela pandemia.


76,7%

das pessoas que morreram devido à covid-19 em São Paulo, entre março de 2020 e março de 2021 não completaram o ciclo de educação básica