O conselheiro emérito da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro, não vê vantagens no fatiamento da reforma tributária, como vem defendendo o governo com a justificativa de que isso vai agilizar o processo. Para o ex-senador, é mais importante andar gradualmente e ter bons resultados para a sociedade e para a economia, pois a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), proposta do Executivo que unifica apenas tributos federais PIS-Cofins, aumenta a carga tributária e faz o país perder competitividade.
“Se for feito o movimento de PIS-Cofins, vamos ter, sim, aumento de carga tributária”, afirmou Monteiro, nesta terça-feira (8/6), durante o seminário virtual Correio Talks, “Indústria em Debate: por uma reforma tributária ampla”, realizado pelo Correio Braziliense, em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI). "Corremos o risco, neste momento, de ter aumento de carga tributária. É preciso ter clareza de que algum passo pode inviabilizar os passos seguintes”, alertou o ex-senador e ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic).
Para Monteiro, é melhor fazer algo “verdadeiramente orgânico e integrado mais lentamente do que fazer um movimento que gere conforto no curto prazo ao ponto de inviabilizar a reforma ampla”, incluindo estados e municípios.
De acordo com o ex-senador, o governo precisa mostrar mais comprometimento na defesa de uma reforma tributária ampla, como se empenhou para aprovar outros temas de interesse do Executivo no Congresso e que são de difícil entendimento da sociedade, como a autonomia do Banco Central, o novo marco regulatório do saneamento e outras medidas. “A reforma tributária não avançará se o governo não se colocar dentro da reforma”, afirmou.
Na avaliação do ex-senador, o fatiamento com está sendo proposto pelo governo pode comprometer uma reforma mais ampla e que ajude o país a sair do cenário de estagnação que é resultado, em grande parte, da desindustrialização. Ele reforçou que, sem o desenvolvimento da indústria, que vem perdendo capacidade devido, por exemplo, aos entraves da burocracia e da elevada carga tributária, o país não conseguirá crescer e melhorar a renda das pessoas, uma vez que os melhores empregos e salários são pagos pela indústria — hoje, o setor que mais arrecada impostos. “O país não pode ficar nesse pântano da estagnação, com passivo social imenso que só poderemos dar conta desses graves desequilíbrios estruturais se voltarmos a crescer”, declarou.
Durante o debate, a jurista Melina Rocha alertou, inclusive, para os riscos de judicialização da CBS, porque já há advogados com petições prontas na gaveta para questionar a proposta caso ela seja aprovada do jeito que o Executivo está propondo, por meio de um projeto de lei.
"Reforma possível"
O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirmou que o governo está comprometido para aprovar a reforma tributária ainda neste ano e defendeu o fatiamento proposta, para que ela seja consensual e possível, "com menos economês e mais português” no diálogo.
Monteiro, por sua vez, afirmou que é possível avançar em uma proposta além da possível e essa é função dos políticos. “O que temos que fazer aqui é perseverar nessa profissão de fé de que é possível avançar em uma reforma ampla. Embora digam que a política é a arte do possível, ela pode produzir o impossível e tem que ter um horizonte mais amplo”, afirmou o conselheiro da CNI.
O ex-senador ainda elogiou a proposta de reforma tributária elaborada pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que foi recentemente apresentada, mas que não agradou o governo, que defende um novo texto e o fatiamento da matéria. Aliás, essa medida foi bastante critica por vários debatedores que alertaram para a os testes que o ministro da Economia, Paulo Guedes, sempre faz para tentar emplacar a volta da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), mas com uma nova roupagem.
Se a reforma não criar condições para o crescimento da indústria, retirando, por exemplo, a tributação sobre investimentos de bens de capital, a desindustrialização continuará ocorrendo e, com isso, os estados e municípios vão perder contribuintes, de acordo com Monteiro.
Para o ex-senador, o relatório de Ribeiro "é um marco", porque foi fruto de “um longo debate que aconteceu na comissão mista”. Ele lembrou que o relator retirou o fundo de desenvolvimento regional da proposta e questionou Barros sobre o motivo de o governo não apoiar a proposta atual, mas não teve resposta do líder do governo.
“O relator Aguinaldo Ribeiro foi cobrado pela demora, mas fez uma ampla audiência com todos os segmentos da atividade econômica e manteve um canal de interlocução com o Ministério da Economia e o deputado Ricardo Rocha confirmou isso. Eu não entendo. As matérias são técnicas, mas a discussão da lei do gás e de autonomia do Banco Central também escapam da compreensão do cidadão comum e foram aprovadas porque houve empenho do governo federal, que tem toda a legitimidade", lamentou.
Também participaram do debate o senador Roberto Rocha (PSDB-MA), presidente da Comissão Mista da Reforma Tributária; o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP); e o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF).
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