Aos trancos e barrancos, o Congresso Nacional e o governo federal procuram encontrar uma saída para a reforma tributária. Após dissolver a comissão especial e colocar em suspenso o relatório preparado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), segue com a intenção de fatiar a proposta que teria como finalidade simplificar o sistema tributário nacional com o projeto do governo. No Senado, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), se encontrou com o ministro da Economia, Paulo Guedes, na tarde de ontem, para falar sobre o tema. Fora da agenda, a reunião foi breve.
O clima está longe de ser consensual, e um dos nós da reforma tributária é o texto elaborado pelo governo. A proposta do Ministério da Economia unifica o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), criando um imposto sobre valor agregado (IVA), batizado de Contribuição Social Sobre Operações com Bens e Serviços (CBS). A CBS, porém, taxará outros setores que hoje não contribuem com o PIS/Cofins, a exemplo do setor de serviços. Além disso, a proposta não ataca o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o mais complexo, que gera o maior número de judicializações e guerras fiscais no sistema tributário brasileiro.
Para completar, há também o receio de que Guedes inclua no texto a nova Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Em 2020, Lira se disse favorável ao tributo, desde que com uma alíquota menor que a inicialmente prevista pelo governo, de 0,2%. O ministro da Economia sempre bateu na tecla de que não se trataria de uma CPMF. Porém a conversa nunca colou, pois o imposto, voltado para compra e venda pela internet, se aprovado, vai incidir sobre operações financeiras, incluindo saques e depósitos.
Ontem, em uma rede social, Lira fez duas postagens comentando o tema. “Vamos avançar com a reforma tributária sem nos preocupar com a paternidade do projeto. Esta semana devemos definir a tramitação, o formato. Temos aí duas reformas, a que envolve renda e a de consumo. Daremos um passo esta semana para fazermos a reforma de maneira ordenada”, publicou às 8h45. “Com relação a Reforma Tributária, havendo fracionamento na parte de renda, e muito provavelmente haverá, nós deveremos decidir por três ou quatro relatores diferentes e na minha conversa hoje com o Presidente do Senado, nós definiremos juntos qual vai ser o trâmite da matéria”, comentou novamente às 9h16.
O líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL) criticou a divisão ao Correio. “Meu posicionamento é claro. Tem que iniciar a discussão do relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Acredito que o caminho provável é ir direto a plenário ou criar outra comissão especial. Não acredito que pode sair uma reforma tributária fatiada. Só resolve problemas pontuais. Se começar uma discussão pelo CBS, PIS e Cofins, resolve só o federal. Acho que essa questão de escalar tem que ser na regulamentação, e não no texto, ou vai criar uma insegurança maior do que já estamos”, argumentou.
O deputado Hildo Rocha (MDB-MA), presidente da comissão especial que debateu a PEC 45/2019, é ainda mais crítico. Para ele, a CBS não resolve o problema do sistema tributário. Ele lembra que o Brasil só entrará na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) com uma reforma mais profunda. “O tributo mais complexo é o ICMS, que gera litígios, não está sendo abarcado. O relatório do Aguinaldo, que ficou muito bom, que é uma reforma de fato, uma mudança no sistema tributário que acaba com a injustiça, a regressividade, diminui muito a complexidade, vindo a atender a exigência da OCDE, se não fizermos reforma mais ampla, nunca vamos entrar”, lamentou.
Líder do PT, deputado Bohn Gass (RS), por sua vez, destacou que o projeto de Guedes não atende a nenhuma das exigências do partido, que é a maior bancada na Câmara. “Primeiro, não pode ficar só na simplificação. Não pode ficar só no consumo. E tem que mexer na questão do ICMS no destino. Que é o que dá guerra fiscal. E tem que mexer na progressividade sobre renda e patrimônio também”, elencou.
“O fatiamento é para nunca chegar na taxação progressiva. Precisamos de um debate concreto. E não só simplificação. Se a gente não atacar a cobrança do ICMS no destino e progressividade, só vamos cobrar imposto sobre o povo. E não sobre os mais ricos, que podem fazer lobbies no governo”, alertou.
Impasse no Congresso
Fatiar ou não fatiar? Confira alguns pontos do debate da reforma tributária no Congresso:
Imposto agregado
Ao propor fatiar a reforma tributária, o presidente da Câmara, Arthur Lira dá prevalência ao Projeto de Lei nº 3.887/2020. O PL cria um imposto sobre valor agregado (IVA) batizado de Contribuição Social Sobre Operações com Bens e Serviços (CBS).
Unificação do PIS/Cofins
A CBS unifica o PIS/Cofins, e inclui o setor de serviços no grupo que paga o tributo. Por isso, quem é contrário alerta sobre o risco de aumento da carga.
Nova CPMF
Há o receio que o ministro da Economia coloque nos próximos PLs da reforma tributária do governo uma nova CPMF.
Comissão extinta
Havia uma comissão mista informal para debater as PECs 45 e 110 de 2019, da Câmara e do Senado, que propõe mudanças mais profundas no sistema. Na última semana, porém, o presidente da Câmara, Arthur Lira extinguiu o colegiado que buscava unir os dois textos, após a leitura do relatório pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
Reforma profunda
Parlamentares argumentam que as PECs propunham mudanças mais consistentes no sistema tributário brasileiro. Entre as mudanças estão a simplificação do ICMS, a cobrança do ICMS na origem, para acabar com as guerras fiscais e uma maior regressividade do sistema.