Contas públicas

Mudança na LDO abre espaço para gastos fora do teto e permite criação do BEm

Presidente sanciona projeto de lei que altera Lei de Diretrizes Orçamentárias e abre espaço para gastos fora da regra do teto. Programa de auxílio a empresas, aguardado desde janeiro, depende de publicação de MP para entrar em vigor

Rosana Hessel
postado em 22/04/2021 00:21 / atualizado em 22/04/2021 08:33
 (crédito: Evaristo Sá/AFP)
(crédito: Evaristo Sá/AFP)

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou, ontem, o projeto de lei que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021, o PLN 2/2021, corrigindo um erro da equipe econômica e abrindo espaço para novos gastos fora da regra do teto — emenda constitucional que limita o aumento de despesas pela inflação do ano anterior.

O PLN foi a saída encontrada pelo governo para chegar a um acordo com o Congresso Nacional e assim resolver o impasse do Orçamento de 2021, cuja data limite para a sanção é hoje. Os detalhes desse acordo ainda não foram revelados. Há muita desconfiança de analistas e técnicos do próprio governo, pois o texto sancionado não estipula valores para os gastos extra-teto.

A nova nova lei sancionada por Bolsonaro, nº 14.143/2021, teve apenas um veto presidencial —sugerido pelo Ministério da Economia — para um artigo que permitia transferências sem restrição para municípios com menos de 50 mil habitantes inadimplentes. Aprovado no último dia 19 pelo Congresso Nacional, em votação simbólica, o PLN corrigiu um erro da equipe econômica na redação da LDO deste ano, porque ela subestimou a força da segunda onda da pandemia da covid-19 e exigiu compensação de receita para despesas temporárias.

Com a retirada dessa restrição, o ministro da Economia, Paulo Guedes, não tem mais desculpa para adiar a publicação das medidas provisórias para socorrer as empresas que já não conseguem pagar os salários de seus funcionários, reeditando o Benefício Emergencial para a Manutenção do Emprego e da Renda (BEm) e o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) até sexta-feira.

O ministro tem falado que o limite para esses dois programas é de até R$ 15 bilhões, sendo R$ 10 bilhões para o BEm e R$ 5 bilhões para o Pronampe. Contudo, não é descartado um aumento nos recursos para o Pronampe, podendo chegar a R$ 7 bilhões ou até R$ 10 bilhões, porque não existe uma limitação no PLN para esses recursos extras.

Guedes vem adiando a reedição do BEm desde o fim de janeiro e nenhuma das datas prometidas para a MP foram cumpridas. Na semana passada, por exemplo, o ministro garantiu que publicaria a MP do BEm “em um ou dois dias” após a aprovação do PLN no Congresso, mas, logo depois, condicionou a MP à sanção do PLN.

De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci, a expectativa dos técnicos da pasta é de que a MP do BEm será publicada amanhã. Contudo, ele lamentou o fato da demora, porque mais de 91% das empresas associadas não conseguiram pagar o salário deste mês sem o benefício integralmente. “Infelizmente, só valerá a partir do dia da edição, ou seja, cobrirá apenas uma parte pequena da folha de abril, porque não vai retroagir”, lamentou.

Na avaliação do economista e ex-diretor do Banco Central, Alexandre Schwartsman, BEm e Pronampe, apesar de serem menores que no ano passado, devem ajudar, de alguma forma, na recuperação da economia. “Mesmo porque, aparentemente, a queda de atividade será menos pronunciada do que a de 2020”, acrescentou.

No ano passado, o governo gastou R$ 33,5 bilhões dos R$ 51,5 bilhões previstos para o BEm. Apesar de o valor deste ano ser bem menor, de R$ 10 bilhões, Solmucci acredita que poderá ser suficiente para o socorro durante os quatro meses previstos, mas ele lamentou a demora para a liberação do auxílio. “Já estamos com a retomada da atividade iniciada em todos os estados, e isso diminuirá a demanda”, afirmou.

Gastos adicionais

O PLN 2/2021 ainda permitiu a criação de gastos extras fora das regras fiscais para medidas no combate à pandemia, mas ainda não está claro se algumas emendas excedentes do Orçamento — oriundas de um acordo firmado por Bolsonaro e os parlamentares do Centrão para as eleições das presidências da Câmara e do Senado — poderão ser incluídas também nessa nova exceção.

Vale lembrar que a proposta da peça orçamentária do Executivo previa R$ 16,5 bilhões para emendas parlamentares e esse montante saltou para quase R$ 49 bilhões. A maior parte, R$ 26,5 bilhões, foi criada pelo relator, o senador Marcio Bittar (MDB-AC), e era destinada para obras eleitoreiras, em grande parte, tocadas pelo Ministério do Desenvolvimento Regional (MDB), no Nordeste, berço político do petista Luiz Inácio Lula da Silva, que voltou a ser elegível por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ao anular as condenações do tribunal de Curitiba.

O Tribunal de Contas da União (TCU) investiga as denúncias de irregularidades do Orçamento de 2021 apontadas por um grupo de parlamentares, incluindo até pedaladas fiscais. Técnicos que acompanham a investigação não precisaram a data para a conclusão do levantamento, especialmente agora, com esse novo acordo que não está bem detalhado.

Além das MPs de recriação do BEm e do Pronampe, outras medidas prometidas por Guedes são aguardadas, como a antecipação de férias de funcionários, com pagamentos postergados do um terço adicional de férias e o adiamento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
No ano passado, com o BEm, foram registrados mais de 10 milhões de acordos entre empresas e trabalhadores. O resultado foi considerado bem-sucedido. O Brasil registrou a criação de 95,6 mil postos de trabalho com carteira assinada em 2020 (incluindo declarações feitas fora do prazo).

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Austeridade mais distante

Com a Lei nº nº 14.143/2021, sancionada ontem pelo presidente Jair Bolsonaro, o governo conseguiu driblar os princípios de austeridade nas contas públicas, porque encontrou uma forma de gastar mais com o aval do Congresso Nacional. O governo também precisa sancionar hoje o Orçamento de 2021, com vetos parciais para poder fechar as contas e tornar a peça orçamentária exequível e mostrar que continua respeitando o teto de gastos e as demais regras fiscais.


A expectativa de analistas é de que o governo deverá vetar pelo menos R$ 20 bilhões do Orçamento, mas esse volume não será suficiente para sanar todos os problemas gerados com o impasse com o Congresso, e o contingenciamento de despesas nos próximos dias será inevitável.


Por conta da confusão que ainda persiste, o governo continua sendo alvo de críticas, porque não foi transparente em relação ao acordo com o Legislativo. Com a alteração da LDO, haverá um um aumento de mais de R$ 100 bilhões em despesas acima do teto de gastos. Conforme dados do Tesouro Nacional, até ontem, existiam R$ 88 bilhões de despesas extraordinárias no combate à pandemia, incluindo os R$ 44 bilhões previstos para a nova edição do auxílio emergencial, que começou a ser pago neste mês.


Logo, apenas considerando R$ 15 bilhões para o Benefício Emergencial para a Manutenção do Emprego e da Renda (BEm) para e o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), os gastos extraordinários fora do teto já somariam R$ 103 bilhões.


Técnicos do governo confirmam que, assim como o BEm, o Pronampe será recriado por meio de Medida Provisória para terem efeito imediato. Eles também não descartam que o valor para esses dois programas chegam a R$ 20 bilhões, porque não existe um limite para esse recurso texto da nova lei originada pelo PLN 2/2021. (RH)

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