CRISE

Brasil tem 125 milhões de pessoas que não sabem se vão se alimentar bem

Insegurança alimentar atinge seis em cada 10 domicílios brasileiros, segundo estudo elaborado por universidades do Brasil e da Alemanha. No fim do ano passado, mais da metade da população não tinha acesso garantido à comida

Marina Barbosa
postado em 14/04/2021 06:00
Legumes, frutas e verduras estão entre os alimentos cujo consumo mais diminuiu em 2020, de acordo com a pesquisa -  (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press - 19/3/21)
Legumes, frutas e verduras estão entre os alimentos cujo consumo mais diminuiu em 2020, de acordo com a pesquisa - (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press - 19/3/21)

Os pagamentos do auxílio emergencial e do Bolsa Família não evitaram o avanço da fome no Brasil durante a pandemia de covid-19. Estudo divulgado pelo movimento Food for Justice aponta que seis em cada 10 domicílios brasileiros passaram por uma situação de insegurança alimentar entre agosto e dezembro do ano passado. São 125 milhões de brasileiros que acordavam sem saber se teriam como se alimentar adequadamente.

O estudo foi feito pela Universidade Livre de Berlim em parceria com a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e ouviu duas mil pessoas entre novembro e dezembro do ano passado. A conclusão foi de que a insegurança alimentar, que atingia 36,7% dos brasileiros em 2018, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), alastrou no país no ano passado.

De acordo com a pesquisa, 59,4% dos brasileiros estavam em insegurança alimentar no fim de 2020, e 15% enfrentavam insegurança alimentar grave. Essa situação era mais comum em domicílios chefiados por pessoas pretas (66,8%) e por mulheres (73,8%); que têm crianças de até quatro anos (70,6%); e uma renda per capita mensal de até R$ 500 (71,4%). A insegurança alimentar também é mais frequente nos domicílios situados em áreas rurais (75,2%) e nas regiões Nordeste (73,1%) e Norte (67,7%).

“Um indivíduo do gênero masculino, cor branca, residente em área urbana da região Centro-Oeste, Sul ou Sudeste, com renda per capita acima de R$ 1 mil, é muito menos vulnerável do que um indivíduo do gênero feminino, cor negra ou parda, mãe de família vivendo em área rural ou nas regiões Norte e Nordeste”, concluiu a professora de sociologia na Universidade Livre de Berlim Renata Motta.

Para a pesquisadora, esse cenário é resultado tanto das desigualdades sociais quanto das escolhas políticas e da crise que atinge o país. O estudo explica que 45,5% dos entrevistados viram a renda encolher na pandemia de covid-19, e é nesses domicílios que estão os mais altos níveis de insegurança alimentar moderada (18,6%) e grave (21,6%). Mesmo nos domicílios que receberam o auxílio emergencial a taxa de insegurança alimentar é alta: 74,1%. A incerteza sobre a alimentação ainda é frequente nas casas que contam com a ajuda do Bolsa Família (88,2%) ou aposentadoria (56,4%).

A pesquisa constatou uma redução de 85% do consumo de alimentos saudáveis nos domicílios em situação de insegurança alimentar , sobretudo de carnes (44%), frutas (40,8%), hortaliças e legumes (36,8%). A menor foi do consumo de ovos (17,8%), que se tornaram um substituto da carne em muitas casas brasileiras.

Para Renata Motta, a situação teria sido pior sem o auxílio emergencial. Por isso, pede a manutenção do benefício e a revisão dos valores que estão sendo pagos pelo governo neste ano — R$ 150, R$ 250 ou R$ 375, de acordo com a formação familiar.

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