CONJUNTURA

Setor de serviços cai 4,5% e enfrenta novo desafio pela frente

Prejudicado, principalmente, pelo fechamento de restaurantes, academias e hotéis, o setor teve queda de 4,5% no ano passado, o pior resultado da série histórica. E tem outra vez pela frente a aceleração da pandemia e medidas de isolamento social

Vera Batista
postado em 04/03/2021 06:00 / atualizado em 04/03/2021 10:58
 (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Setor mais afetado pelas medidas de distanciamento social necessárias para conter a pandemia da covid-19, os serviços encolheram 4,5% em 2020. Somado à indústria, que retrocedeu 3,5%, o setor representa 95% da economia nacional. E tem uma peculiaridade que o torna mais sensível ao desempenho geral da atividade e do consumo domésticos. “Ao contrário da indústria e do agronegócio, que podem se voltar para as exportações, os serviços dependem do mercado interno. E, nesse ritmo, com uma nova onda de contaminação, e das incertezas sobre a imunização, as perspectivas para 2021 são muito preocupantes”, destacou Fábio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

Na análise do economista, não está descartado um processo recessivo já no primeiro semestre de 2021, diante da perspectiva de alta da inflação e dos juros, provocados pelo aumento do preço dos combustíveis. “O governo precisará adotar todas aquelas medidas do ano passado, como a volta do auxílio emergencial, redução de jornada e de salários e adiamento de impostos, pelo menos até que 50% da população esteja vacinada”, ressaltou Bentes. “Se nada for feito, o mercado de trabalho poderá ser gravemente afetado. O setor terciário é responsável por cerca de 75% do PIB brasileiro”, ressaltou.

O economista lembrou que, mesmo com a queda de 4,5% em 2020, o pior resultado da série histórica, os serviços enfrentam um cenário dramático neste início de 2021, com o começo de um novo processo de isolamento. No setor, somente as vendas on-line poderão ter um avanço, pelas especificidades que o coronavírus causou, e os prestadores de serviço tiveram que se adaptar aos novos tempos. No último Natal, por exemplo, esse segmento teve alta de 3,4%. No ano, cresceu aproximadamente 64% em relação a 2019. “Mas esse avanço não foi suficiente para segurar um crescimento sustentável dos serviços em geral”, destacou Bentes.

Dentro do setor, o pior resultado em 2020 foi observado na categoria outras atividades de serviços (-12,1%), que são os restaurantes, academias e hotéis, de acordo com as informações divulgadas, ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Os serviços prestados às famílias foram os mais afetados negativamente pelas restrições de funcionamento. A segunda maior queda ocorreu no segmento de transportes, armazenagem e correio (-9,2%), principalmente o transporte de passageiros, atividade econômica também muito atingida pela pandemia”, explicou Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE.

Caíram, ainda, as atividades de administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social (-4,7%), comércio (-3,1%), informação e comunicação (-0,2%). Já atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (4%) e as atividades imobiliárias (2,5%) avançaram em 2020.

Como nas demais atividades, o setor de serviços teve desempenho melhor no fim do ano passado. No quarto trimestre de 2020, em relação ao trimestre anterior, os serviços tiveram variação positiva de 2,7%. No confronto com o mesmo trimestre de 2019, porém, houve recuo de 2,2%, de acordo com o IBGE.

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Indústria recua 3,5%

O setor industrial teve queda de 3,5% no ano passado, divulgou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. O resultado combina os recuos de 4,3% da indústria de transformação e de 7% da construção civil, com a alta de 1,3% da indústria extrativa, que se beneficiou do crescimento da extração de petróleo e gás e da alta no preço da commodity.

No segmento de transformação, os destaques negativos foram a indústria automotiva, metalurgia, artigos de vestuário e acessórios e máquinas e equipamentos. Do lado positivo, as indústrias de alimentos, farmacêutica e de material de limpeza refletem o consumo de itens que se mantiveram constantes e até cresceram durante a pandemia do novo coronavírus.

Segundo o economista-chefe da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca, o resultado era esperado. “Quando fizemos a primeira análise, em maio de 2020, a nossa percepção era de uma queda até maior, de 4,2%. A boa notícia é a manutenção do crescimento, por conta do desempenho do quarto trimestre”, afirmou. No último trimestre do ano, o PIB da indústria cresceu 1,9%, puxado pelo setor de transformação, com alta de 4,9%.

No entanto, Fonseca destacou que a expectativa para 2021 é incerta por conta da segunda onda de contaminação de covid-19. “Na verdade, a indústria voltou para onde estava, mas ainda não tinha se recuperado totalmente. Entramos em 2020 com a expectativa de que poderíamos melhorar, mas veio a pandemia. O setor entrou numa crise muito forte e conseguiu sair dela. Isso é positivo”, avaliou.

Daqui para frente, porém, não será suficiente recuperar o ritmo de crescimento anterior à pandemia. “A quantidade de desempregados é muito maior agora. Precisamos fazer as reformas para aumentar a competitividade”, alertou.

A nova onda de contaminação deixou o horizonte de 2021 mais incerto. “O país falhou no controle da doença e na distribuição das vacinas. Os novos lockdowns devem impactar no resultado do primeiro trimestre”, disse Fonseca.

Investimento encolhe 0,8%

 (crédito: Vinicius Cardoso Vieira/CB/D.A Press - 4/4/19)
crédito: Vinicius Cardoso Vieira/CB/D.A Press - 4/4/19

Alavancas para o crescimento sustentado da economia, os investimentos produtivos, tecnicamente chamados de Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), caíram 0,8% em 2020. No entanto, as taxas de investimento e de poupança fecharam o ano melhores do que em 2019. A de investimento ficou em 16,4% do PIB em 2020 ante 15,3% no ano anterior. E a de poupança, em 15%, ante 12,5%. Os programas emergenciais de transferência de renda e de crédito explicam a expansão dos dois indicadores.

Para o presidente da Inter.B Consultoria de Negócios, Claudio Frischtak, o aumento da poupança das famílias foi bastante significativo. “Quem estava vivendo no limite da pobreza extrema conseguiu sair com nove meses de auxílio emergencial. As famílias conseguiram acumular alguns recursos por transferência de renda. Isso é um fator que explica”, afirmou. Outra explicação é que, as pessoas com maior renda não puderam gastar com viagens e lazer, por conta das medidas restritivas, e também pouparam. O que elevou a taxa do país.

Sobre investimentos, Frischtak disse que os aportes em infraestrutura mostraram certa resiliência. “Os dados que temos são consistentes com o que o IBGE publicou. Ou seja, não houve colapso desse investimento. Além disso, o agronegócio, que teve safras recordes, é uma fonte de demanda para o próprio setor industrial, para aquisição de máquinas e equipamentos, fertilizantes e outros químicos”, pontuou. A construção civil, responsável por parcela significativa dos investimentos, também se beneficiou das taxas de juros em pisos históricos. (SK)

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