CONJUNTURA

Presidente do BB põe cargo à disposição

André Brandão se antecipa à possibilidade de ser tirado, numa intervenção semelhante a que a Petrobras sofreu, quando Bolsonaro anunciou em rede social a remoção de Roberto Castello Branco. Ações do banco têm queda em torno de 5%

O presidente do Banco do Brasil (BB), André Brandão, colocou, ontem, o cargo à disposição de Jair Bolsonaro. A interlocutores, demonstrou estar incomodado com o clima político de Brasília e, sobretudo, com os rumores de que poderia ser o próximo alvo do chefe do Executivo. Ele tomou a decisão depois que o presidente anunciou a troca no comando da Petrobras –– tirou Roberto Castello Branco e colocou o general Joaquim Silva e Luna no lugar. A manutenção do principal executivo no BB era uma incógnita desde o anúncio do plano de reestruturação da instituição, que irritou o Palácio do Planalto e fez Bolsonaro pedir sua demissão no início do ano.

A interferência na Petrobras renovou os rumores de que o banco seria o próximo foco de interferência. A avaliação de Brandão é a de que, se o presidente aceitou enfrentar o risco político e econômico de demitir Castelo Branco, não hesitaria em retirá-lo do comando do BB. Com uma carreira consolidada no mercado financeiro, Brandão julgou que seria melhor se antecipar em vez de ser removido para evitar nova onda de turbulência no Banco do Brasil.

Ele também não quer ficar sendo fritado pelo Planalto, pois já demonstrou insatisfação com as amarras políticas que rondam o BB e impedem o andamento de medidas de mercado que julga corretas. Por isso, comunicou a decisão de sair ao ministro da Economia, Paulo Guedes.

Apesar de tentar fazer da saída uma situação natural, Brandão mexeu com os mercados, ontem. As ações do banco caíram mais de 4% nos últimos minutos do pregão por causa da decisão de deixar o cargo. No BB, o clima também é de estresse, pois os funcionários vinham aprovando a gestão técnica do presidente. Mas nem o BB, nem o governo comentaram o assunto.

Insatisfação

O incômodo de Brandão foi percebido também quando deixou de ir a um jantar da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) — que tinha, entre os convidados, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Mas fontes na equipe econômica afirmam que pediram que ele fique no cargo até que um substituto seja encontrado, para evitar novas turbulências no mercado, como ocorreu com a demissão de Roberto Castello Branco da Petrobras.

Um dos integrantes do governo afirmou ao Correio que Brandão avalia não precisar ficar no cargo sob o risco de intervenções do governo. Como tem prestígio no mercado financeiro, na visão de interlocutores a saída do executivo destaca o caráter técnico do trabalho desenvolvido à frente da instituição financeira.

Entre os nomes cotados para substituí-lo estão o do presidente do Banco de Brasília (BRB), Paulo Henrique Costa; o do presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano; e o do secretário-executivo do Ministério da Cidadania, Antônio Barreto.

Em comunicado ao mercado, o BB afirmou que o presidente não pediu demissão e que “fatos relevantes” serão comunicados posteriormente, se necessário.

Desde janeiro, o banco fechou 361 agências, além de colocar em prática um programa de demissão voluntária. As medidas desagradaram Bolsonaro, que tinha decidido pela demissão de Brandão, mas foi persuadido pela equipe econômica a desistir. No entanto, com a proximidade do ano eleitoral, Bolsonaro avalia que deve fazer mudanças de cunho considerado populista para tentar agradar aliados políticos.

Impacto

Mesmo antes de ser anunciada oficialmente, a decisão de Brandão mexeu com o mercado financeiro. As ações fecharam o dia com uma queda de 4,92%, negociadas a R$ 28,05. Quando o presidente anunciou a demissão de Castello Branco da Petrobras, os papéis da companhia despencaram e a empresa chegou a perder R$ 73 bilhões em valor de mercado em apenas 24 horas. Posteriormente, houve recuperação, embora o prejuízo ainda não tenha sido recuperado.

A troca na Petrobras causou mal-estar, também, por ter sido anunciada em rede social por Bolsonaro, o que contraria as regras da boa gestão e da não ingerência na gestão de empresas públicas. Isso porque o mercado teria de ser avisado antes, por meio de fato relevante, como preveem as normas definidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Desemprego em 2020 alcança 13,4 milhões

A pandemia do novo coronavírus levou o país a taxas recordes de desemprego e ainda pode deixar muitos brasileiros fora do mercado de trabalho neste ano. Dados divulgados, ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), explicam que, em média, 13,4 milhões de pessoas ficaram sem emprego em 2020.

A taxa média de desocupação bateu 13,5% no ano passado. O resultado é o pior da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad). Porém, a situação se agravou no quarto trimestre de 2020, quando 13,9 milhões de cidadãos estavam sem trabalho e o desemprego chegou a 13,9%. E, de acordo com especialistas, ainda deve crescer em 2021, pois nem todos os trabalhadores que perderam ficaram à margem do mercado com a pandemia da covid-19 voltaram a buscar um reposicionamento.

Segundo o IBGE, o Brasil terminou o ano passado com 2,3 milhões de desempregados a mais do que em 2019. A população ocupada, contudo, sofreu um impacto inédito de 8,4 milhões de vagas fechadas, puxada, sobretudo, pelo encerramento de postos de trabalho no setor de comércio de serviços. A diferença é de 6,1 milhões de pessoas.

“Cerca de 6 milhões estão fora do mercado de trabalho porque estavam impossibilitadas de procurar emprego, devido à pandemia, ou porque estavam recebendo auxílio emergencial. Mas, à medida que o benefício diminui e a vacinação avança, esse pessoal vai voltar a buscar recolocação”, comentou o professor de economia do Insper e CEO da Siegen, Fabio Astrauskas. Ele calcula que a taxa de desemprego ainda pode subir para, pelo menos, 15% neste ano. “Vai aumentar porque nem todas essas pessoas vão achar uma vaga. A força de trabalho vai avançar em uma velocidade maior que a ocupação”, acrescentou o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, que projeta uma taxa de desemprego de 16% em 2021.

A perspectiva não é de uma geração forte de postos de trabalho neste início de ano, por conta do agravamento da pandemia e do desaquecimento da atividade econômica. Aliás, os dados do IBGE mostram que, com o aumento do desemprego, a massa de rendimentos perdeu R$ 14,8 bilhões em 2020 –– montante que, segundo os especialistas, fará falta na recuperação econômica.

“A massa de rendimentos é um indicador importante, pois determina a demanda das famílias, que é um componente importante do PIB. E levou um tombo de 6,5%. Isso aponta que o consumo das famílias seguirá frágil”, explicou o economista-chefe da Necton Investimentos, André Perfeito. (MB)