O ministro da Economia, Paulo Guedes, já admite, nos bastidores, a possibilidade de retomada do auxílio emergencial, que chegou ao fim em 31 de dezembro de 2020. Para criar o socorro aos mais vulneráveis à crise provocada pela covid-19, aponta como fundamentais a redução de incentivos fiscais e a aprovação de reformas. Como prometido na campanha, os novos presidentes da Câmara e do Senado anunciaram “alternativas” com o compromisso de manter o teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento de despesas pela inflação — e avançar com as reformas estruturais, mostrando alinhamento com a avaliação da equipe econômica, de que, se o recrudescimento da pandemia tornar a renovação do auxílio inevitável, é preciso que o benefício venha com contrapartidas fiscais.
A mensagem conjunta de Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), novos presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente, diz que o Congresso Nacional vai trabalhar de forma “conjunta, harmônica e colaborativa” para ajudar os brasileiros durante a pandemia. Pacheco também já disse que vai conversar com a equipe econômica para tentar encontrar fonte de financiamento. A reunião, contudo, ainda não tem data marcada. Por isso, parlamentares interessados na renovação do auxílio apontaram alternativas para a medida.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), por exemplo, apresentou projeto de lei que propõe o pagamento do auxílio, no valor de R$ 600, por mais quatro meses. Ele calcula que o benefício pode ser bancado pela redução em 30% das renúncias fiscais da União e pela tributação de aplicações em Fundos de Investimento Fechados. “A partir deste mês, temos 68 milhões de brasileiros desamparados. Estamos com uma média de mais de mil mortes diárias há vários dias e teremos um agravamento das crises sanitária e econômica se não tiver nenhum tipo de socorro para eles”, justificou.
Especialistas concordam com a importância de amparar a população carente com algum projeto de distribuição de renda. No entanto, segundo a consultora econômica Zeina Latif, o projeto de Randolphe Rodrigues, sobre os fundos de investimento, “tem uma certa confusão”. “Não é um recurso que se pode gastar imediatamente. Nesses fundos, o que pode ser feito é apenas suprir a necessidade de emitir dívida pública, porque se abate da dívida. Não é fonte de financiamento para políticas públicas. Então, tem uma confusão aqui”, alertou. O auxílio emergencial, da forma como é concebido e como seria renovado, segundo ela, a princípio, poderia ser feito e seria com crédito extraordinário, ou seja, fora do teto dos gastos.
Caso a caso
“O que o senador fala em reduzir em 30% os benefícios tributários, infelizmente, depende de cálculo, é mais complexo. Não basta aprovar lá no Congresso, e reduzir horizontalmente 30%. Não é assim. É preciso ver caso a caso. E muitas vezes são medidas difíceis de avançar”, explicou. “A PEC Emergencial é que já deveria ter sido aprovada, para se conseguir reduzir o peso da folha de pagamento e aí fazer compensações”, destacou Zeina Latif.
Ana Carla Abrão, especialista em risco e políticas públicas da Oliver Wyman do Brasil, concorda que a necessidade do auxílio é real, tendo em vista o recrudescimento da pandemia e a situação trágica de boa parte da população do país, sem condições de gerar renda para o sustento em meio ao desemprego elevado no país. “O que vai ser necessário discutir é, primeiro, o tamanho do auxílio. Necessariamente, terá que ser menor e mais focalizado. Um dos grandes problemas na execução, originalmente, foi o fato dos que embolsaram e não precisavam, inclusive servidores públicos com estabilidade”, afirmou. Segundo ela, é preciso buscar “espaço fiscal para a medida”. “Escolhas que precisam ser feitas. Reduzir onde tem espaço, por exemplo, em incentivos fiscais, despesas com pessoal e na área da Defesa. São essas as prioridades hoje, ou atender a população que está morrendo de fome? É essa a pergunta que precisamos fazer. E, se respondermos de forma correta, encontraremos uma série de espaços no Orçamento para financiar o que de fato é prioritário no momento, que é socorrer essas pessoas”, acrescentou.
Ao contrário, o economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas aberta, apontou que “o Orçamento – ainda mais quando já está prestes a atingir o teto de gastos — é um cobertor curto”. Ele destacou que o total de subsídios previstos para 2021, considerando os gastos tributários e os benefícios financeiros e creditícios, é de R$ 363,8 bilhões. Nos gastos tributários, R$ 307,9 bilhões incluem as maiores despesas: Simples (R$ 74,3 bilhões), Imposto de Renda (IRPF, R$ 33,5 bilhões), agricultura e agroindústria (R$ 32,7 bilhões) e entidades sem fins lucrativos, imunes e isentas (R$ 29,3 bilhões). Além desses, há subsídios para Zona Franca de Manaus, medicamentos, produtos farmacêuticos e equipamentos médicos, benefícios ao trabalhador, Desenvolvimento Regional, entre outros. Dessa forma, matematicamente, uma redução nos gastos tributários de 30% geraria R$ 120 bilhões.
“A questão é onde politicamente será viável o corte. Quais setores concordarão com a redução dos subsídios?”, questionou Castello Branco. Ele ressaltou, também, que o custo mensal do auxílio emergencial no valor de R$ 300 era de, aproximadamente, R$ 25 bilhões nos últimos meses de 2020. Logo, um auxílio de R$ 600 custará R$ 50 bilhões por mês. “Tal como no ano passado, empresários, estados e municípios também desejam manter as concessões que foram feitas durante a calamidade. É um cobertor curto”, reforçou.