CONJUNTURA

Crédito aumenta, mas fica mais para o consumidor em 2021

Volume de empréstimos e financiamentos cresceu 15,4% em 2020 e deve subir mais 7% neste ano. Mas alta da taxa básica de juros, a Selic, e inadimplência mais elevada devem encarecer as operações. Especialistas recomendam cautela aos consumidores

Com milhares de brasileiros precisando de um recurso extra para enfrentar a pandemia de covid-19, os empréstimos bancários dispararam 15,4% no país em 2020, segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Porém, quem ainda pretende recorrer ao crédito terá de manter cautela neste ano, pois os financiamentos devem ficar mais caros diante da perspectiva de alta dos juros e da inadimplência.

De acordo com a Febraban, o aumento de 15,4% foi o maior dos últimos oito anos — e puxado, sobretudo, pelos empréstimos direcionados às empresas. O crédito às pessoas jurídicas expandiu 21,7%, enquanto o crédito às famílias cresceu 10,8% em 2020. Afinal, milhares de empresários recorreram ao crédito para manter as contas em dia durante a quarentena, e o governo contribuiu nesse sentido por meio de medidas como o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe).

Para este ano, contudo, a expectativa é que haja uma “normalização” do mercado de crédito, já que os programas emergenciais da pandemia chegaram ao fim. Por isso, a Febraban projeta um aumento de 7% dos empréstimos e financiamentos em 2021. A projeção é similar à do Banco Central (BC), que vê uma alta de 7,8% neste ano, puxada pelo crédito às famílias (10,6%) e não pelo recurso direcionado às empresas (4,2%).

Aperto

Especialistas, no entanto, afirmam que as condições desse crédito não devem ser tão vantajosas quanto em 2020, quando as empresas foram beneficiadas por programas emergenciais e os consumidores puderam se valer de períodos de carência e juros baixos. O mercado espera que a taxa básica de juros (Selic) saia da mínima histórica de 2% ao ano e suba até 3,25% no fim de 2021, devido à alta da inflação. Parte desse aumento deve ser repassado ao consumidor final.

“O provável aperto dos juros pelo BC acaba elevando o custo de captação, o que, por sua vez, aumenta o custo do crédito. Outro elemento importante é que a curva de juros está inclinada, com as taxas de prazos mais longos rodando em um patamar mais alto, por conta das dúvidas fiscais. Então, há um movimento de alta nos juros longos e também deve haver nos juros de curto prazo”, avaliou o superintendente de Pesquisas Macroeconômicas do Santander, Maurício Oreng. Ele disse, no entanto, que esse movimento de alta dos juros deve ser “contido” no caso dos consumidores finais.

Diretor executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), Miguel Oliveira, por sua vez, disse que outro fator pode encarecer o custo do crédito em 2021: o aumento do calote. A taxa de inadimplência caiu em 2020 porque os bancos permitiram que os clientes suspendessem o pagamento dos financiamentos bancários, e porque benefícios como o auxílio emergencial ajudaram os brasileiros a colocar as contas em dia. Porém, há a expectativa de que a inadimplência volte a subir neste ano, já que esses programas chegaram ao fim e muitos brasileiros seguem sem emprego e renda.

Segundo a Febraban, os principais bancos do país esperam que a inadimplência salte dos 3,5%, registrados no fim de 2020, para 4,5% já em maio deste ano, e alcance 4,7% em agosto, quando deve voltar a arrefecer para fechar o ano perto de 4%. Esse aumento tende a deixar os bancos mais seletivos na concessão do crédito, de acordo com a Anefac. “O ambiente é de maior risco. Por isso, a inadimplência deve levar os bancos a subirem mais fortemente os juros, e isso pode ter um impacto ainda maior do que o da Selic na taxa ao consumidor final”, afirmou Oliveira.

Dívidas

Balanço da Anefac revelou que, por conta da expectativa de alta da Selic e da inadimplência, o aumento dos juros já começou. Segundo a associação, após oito meses de queda, as taxas subiram em todas as linhas de crédito em dezembro. Na média, a taxa cobrada às pessoas físicas passou de 5,51% ao mês (90,34% ao ano) para 5,56% ao mês (91,42% ao ano) no fim de 2020. Já a taxa média cobrada das empresas saiu de 2,83% ao mês (39,78% ao ano) para 2,87% ao mês (40,43% ao ano), segundo a Anefac.

“Inevitalmente, os juros vão subir neste ano, por conta da Selic ou da inadimplência. Por isso, é preciso ser cauteloso nos gastos, não se endividar muito em linhas caras, como o cartão de crédito, e buscar renegociar a dívida quando perceber que não vai conseguir pagar”, orientou Oliveira.

Os bancos, contudo, dizem que esse aumento será limitado. “A projeção não é de nenhuma disparada dos juros”, afirmou Oreng. Presidente da Febraban, Isaac Sidney acrescentou que o setor continuará atento à questão do crédito. “Os bancos estão provendo crédito para as empresas e as famílias, e continuarão focados em mitigar os impactos negativos da pandemia e ajudar no processo de recuperação econômica do país em 2021”, disse.