As vendas do varejo registraram queda de 0,1% em novembro de 2020 ante outubro. O dado interrompeu uma sequência de seis resultados positivos consecutivos do indicador do comércio varejista, iniciada em maio de 2020, após dois meses de queda por conta da pandemia de covid-19. Na comparação com o mesmo mês de 2019, a alta foi de 3,4%. No acumulado do ano, contra igual período do ano anterior, houve aumento de 1,2%. Os dados foram divulgados, ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para os especialistas, a queda foi resultado da alta na inflação de alimentos e da redução do auxílio emergencial, que caiu de R$ 600 para R$ 300 em setembro do ano passado.
No comércio varejista ampliado, que inclui veículos, motos, partes e peças e de material de construção, o volume de vendas cresceu 0,6% em relação a outubro de 2020, sétimo mês consecutivo de aumento. A média móvel do trimestre encerrado em novembro (1,2%) sinalizou redução no ritmo das vendas, quando comparada à média móvel no trimestre encerrado em outubro (1,2%).
Cristiano Santos, gerente da pesquisa do IBGE, explicou que três atividades ficaram no campo negativo: hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (-2,2%); combustíveis e lubrificantes (-0,4%) e móveis e eletrodomésticos (-0,1%). “Por outro lado, cinco ficaram no campo positivo: tecidos e vestuário; artigos farmacêuticos; livros, jornais e revistas; equipamentos para escritório; e outros artigos”, explicou. “Se considerarmos o varejo ampliado, com veículos e material de construção, o setor de veículos puxou com variação de 3,5%, enquanto construção caiu 0,8%”, acrescentou.
Por conta do resultado negativo, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNA) decidiu revisar para baixo a projeção de crescimento do setor, de 4,2% para 3,9%. De acordo com o economista da entidade Fabio Bentes, a redução no valor do auxílio emergencial e a alta no preço dos alimentos impactaram na queda.
“Esse resultado interrompeu uma sequência de seis altas, na qual as vendas acumularam crescimento de 39% após tombar 18% entre fevereiro e abril de 2020”, disse. “O ramo especializado na venda de alimentos, o mais relevante do setor em termos de faturamento anual (supermercados), foi o principal responsável pela retração das vendas com queda de 2,2% frente ao mês anterior”, avaliou.
À exceção do mês de outubro (com alta de 0,8%), o ramo de hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo tem registrado retrações nas vendas desde o início do segundo semestre de 2020. “Esse processo coincide com a aceleração dos preços dos alimentos. Em novembro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação de produtos alimentícios para consumo doméstico, de 3,3%, foi a maior para o mês desde 2002 (6,7%)”, comparou.
Recuperação em V
Para Bentes, à desaceleração das vendas observada ao longo do terceiro trimestre de 2020 soma-se à redução de R$ 600 para R$ 300 no valor do auxílio emergencial. “O benefício cumpriu um papel relevante na surpreendente recuperação do varejo ao longo do ano. Não fosse isso, a retomada das vendas ao nível pré-pandemia não teria ocorrido em julho, mas em dezembro de 2020”, pontuou. “Com o fim do benefício no início de 2021, o quadro ainda grave do mercado de trabalho e o aumento da inflação sugerem que a reação do setor tende a se tornar mais lenta no início de deste ano”, acrescentou.
Na opinião de André Perfeito, economista-chefe da Necton, os números do varejo decepcionaram. “Comércio veio no campo negativo, após crescimento na margem maior do que o projetado em serviços. A recuperação após o pior da pandemia foi vigorosa e criou a sensação de uma desejada volta em V. Mas, a recuperação tem mais cara de raiz quadrada, ou seja, vai voltar o que perdeu com o choque do lockdown inicial — que nem foi tão severo assim — e, depois, sem incentivos perenes, irá se estabilizar em patamares próximos de zero”, destacou.
Para Lisandra Barbero, economista da XP Investimentos, o resultado de -0,1% ficou abaixo das estimativas. A XP apostava em crescimento de 0,2% e de 0,5% para o varejo ampliado, enquanto o consenso do mercado era de 0,3% e 0,9%, respectivamente. “Um dos fatores que podem ter contribuído para a perda de ímpeto do setor em novembro foi a antecipação do consumo de bens duráveis durante a pandemia, que reduziu as compras típicas de final de ano”, avaliou.
“De acordo com nosso índice de difusão, mais de 69% do setor vêm crescendo a um ritmo expressivo nos últimos seis meses. O número reforça a mensagem de que o varejo conseguiu apresentar expansão significativa em 2020, especialmente em meio aos estímulos sustentados durante a pandemia. Mas, olhando para frente, principalmente para os próximos meses, existe a possibilidade de que a alta da inflação de alimentos e a redução do auxílio emergencial continuem trazendo um viés negativo para o setor”, explicou Barbero.