Volatilidade foi a principal definição do mercado acionário em 2020 durante a crise global provocada pela pandemia da covid-19. Com a chegada do novo coronavírus no país, a B3, a Bolsa de Valores brasileira, saiu do melhor momento, no início do ano, para a maior queda já registrada, com seis circuit breakers — interrupções das negociações —, entre março e abril, mas acabou encerrando no azul pelo segundo ano consecutivo.
Após acumular alta de 31,6%, em 2019, a 115.654 pontos, o Índice Bovespa, principal indicador da B3, estava caminhando para novos recordes, chegando ao pico de 119 mil pontos, em 23 janeiro, atraindo mês a mês um exército de novos investidores com as estimativas otimistas de alta de quase 30% para a B3, que poderia chegar até 150 mil pontos. Contudo, em março, mês em que a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a pandemia e os lockdowns começaram a tomar conta do mundo, o Ibovespa levou um tombo e foi para os 62 mil pontos, para desespero de muitos, especialmente, os cardíacos, que viram a Bolsa acumular queda de 30% em um único mês.
Ao longo do ano, a recuperação foi gradual, mas consistente, na avaliação de operadores. Após nove meses de pandemia, a B3 voltou ao patamar de 119 mil pontos, em dezembro, e fechou o último pregão do ano, no dia 30, a 119.017 pontos. A alta em 2020, de 2,92%, perde para a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) nos 12 meses até novembro, de 4,3%. Logo, investir na Bolsa não é para amadores e requer muita pesquisa sobre as empresas listadas, para não amargar grandes prejuízos. Agora, para 2021, as previsões de especialistas estão mais modestas, com altas de até 9,2%.
Otimismo
Para Pablo Spyer, economista e diretor da Mirae Asset, o mercado está otimista para este ano com a B3. A tendência, segundo ele, é de que os estímulos econômicos vistos na pandemia permaneçam ou mesmo aumentem em 2021, devido ao processo de vacinação em vários países. “A vasta maioria dos bancos, como o Bank of America, fala no Ibovespa em 130 mil pontos neste ano. Outros, como o JP Morgan, falam 124 mil. O mercado está otimista, principalmente, porque espera mais injeção de capital neste ano. Isso é generalizado”, comenta.
O total de pessoas físicas investindo na B3 é crescente e vem batendo recordes. Em 2015, o número de CPFs registrados na Bolsa brasileira era de 557 mil. Em 2018, passou a 813 mil e, em 2019, dobrou, chegando a 1,68 milhão de pessoas físicas cadastradas — aumento de 106% em 12 meses. Em 2020, essa tendência permaneceu, e, até novembro, 3,17 milhões de pessoas físicas estavam cadastradas. Esse dado, entretanto, corresponde a 1,49% dos 212,5 milhões de brasileiros computados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A forte entrada de investidores brasileiros na Bolsa pode ser explicada pelo baixo patamar da taxa básica de juros, a Selic, de acordo com os especialistas. Em meio à pandemia, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central fez cortes na Selic que a levaram para 2% ao ano, menor nível da história. Com isso, os investimentos em renda fixa, como o Tesouro Direto e a caderneta de poupança, que já vinham perdendo rentabilidade, passaram a ser ainda menos atrativos. Deixar o dinheiro parado nessas aplicações está implicando em perdas ante a inflação.
No entanto, Spyer recomenda cautela e dá algumas dicas para quem está pensando em entrar na Bolsa.“Todo mundo que está começando deve ter paciência e jogar o tempo ao seu favor. Guardar todo mês um pouco de dinheiro, poupando em ações, procurar empresas que pagam bons dividendos, pegar uma parte do salário e colocar lá. Meu conselho é entrar devagar ao longo de meses, anos, aproveitando quando as ações caem e garimpar”, afirma.
João Paulo Costa, gerente de Renda Variável da Easynvest, recomenda para os investidores da Bolsa estudarem, profundamente, se quiserem ver suas aplicações renderem mais, porque o mercado de ações envolve riscos. O risco assumido, segundo ele, pode ser compensado pela rentabilidade, mas ela dependerá da estabilidade da economia. Nos países desenvolvidos, por exemplo, onde a economia é mais estável e os juros são baixos, a percentagem da população que investe em ações pode chegar a 40%. “Depois que o investidor entende como funciona o mercado, não tem volta. Se os juros subirem, os investimentos em Bolsa podem até diminuir, mas não vão acabar”, avalia.
Por onde começar
Existem vários tipos de investimentos na Bolsa. Desde day trade, em que as ações são compradas e vendidas no mesmo dia, até os fundos de ações, imobiliários e multimercados. Mas, antes de escolher a estratégia que melhor se adapta aos objetivos, é preciso dar o primeiro passo: abrir uma conta em uma corretora que permita fazer operações na Bolsa ou liberar essa função no banco do qual o cliente faz parte, caso a instituição ofereça esse tipo de operação ou direcione produtos adequados ao perfil dele.
No mercado financeiro, muitos especialistas defendem que a melhor hora de ingressar na Bolsa é quando ela opera em queda e as ações estão mais baratas. Para Ana Laura Magalhães, especialista em investimentos e sócia da XP Investimentos, no entanto, não existe um momento ideal, e, sim, o momento em que o investidor se sente preparado para colocar sua estratégia em prática, sempre com muita paciência. Sua principal dica é evitar copiar estratégias que funcionam com outros investidores.
“É preciso tomar cuidado com o tipo de informação consumida, o tipo de produto em que se decide investir. A pessoa precisa entender qual é o risco embutido naquela estratégia de investimentos, se ele consegue aguentar uma volatilidade negativa, se entende quais são as variáveis envolvidas naquela ação. Faria sentido entrar com o mercado em baixa, mas, se alguns investidores não aproveitaram o momento durante a pandemia, muitas companhias ainda não conseguiram recuperar patamares parecidos ao do pré-crash da covid”, diz a especialista.
Lucas Collazo, analista da Rico Investimentos, lembra que, ao comprar ações de uma empresa, o investidor torna-se sócio dela. Por isso, é necessário ficar atento às informações relevantes sobre a companhia escolhida antes da tomada de decisões na hora de vender ou de manter os ativos.
O especialista defende que, para investir, é preciso analisar o potencial de crescimento da empresa a longo prazo. “Se eu fosse dar um conselho, seria esse: pare de olhar para a tela e foque nas empresas. Quem faz a gestão, entender o que elas fazem e pensar o que é se tornar sócio . Então, tem que saber, entender o negócio em números para saber se vale se tornar sócio”, afirma Collazo.
Pacotes e incertezas
Com a expectativa de novos pacotes de estímulos monetários em diversos países desenvolvidos e a possibilidade de vacinação em massa contra a covid-19 ao longo de 2021, investidores estrangeiros voltaram a se interessar por mercados emergentes, inclusive, no Brasil, apesar de a desconfiança no governo federal ainda ser elevada. Há muitas incertezas sobre a questão fiscal neste ano, que ainda não tem o Orçamento deste ano aprovado e pode ser uma trava para a recuperação da economia.
A debandada de estrangeiros da Bolsa brasileira em 2020 foi grande durante os primeiros meses da pandemia, mas a forte entrada de brasileiros acabou evitando quedas maiores no Ibovespa ao longo do ano. Apesar das incertezas na área fiscal, o fluxo de capital externo na Bolsa voltou a ficar positivo em novembro, quando foram registrados R$ 33,3 bilhões. Isso até ajudou a dar um certo impulso no fim do ano, pois, em dólares, a B3 ainda roda no vermelho e acumula desvalorização em torno de 20%, ou seja, está barata para os estrangeiros no momento.
Todavia, no acumulado do ano, o saldo do fluxo de estrangeiros na B3, incluindo os IPOs (ofertas iniciais de ações), que acabaram surpreendendo no ano passado, estava negativo em R$ 14,2 bilhões até 28 de dezembro. Considerando apenas o mercado secundário, as vendas de ações por estrangeiros superaram as compras em R$ 33,8 bilhões na mesma base de comparação dos dados da Bolsa.
Passo a passo para investir em ações
1 - Abra uma conta numa corretora
Hoje existem diversas instituições financeiras que prestam serviços de corretagem. Nelas, o cliente encontra opções de investimentos, como Renda Fixa (Tesouro Direto, CDB e LCI, entre outros), fundos de investimentos e renda variável, como é o caso das ações na Bolsa de Valores. Para conseguir aplicar recursos na B3, é preciso acessar o home broker, que é uma espécie de plataforma onde o cliente pode fazer movimentações no pregão.
2 - Descubra qual o seu perfil de investidor
Ao criar uma conta, é possível preencher questionários indicando que tipo de objetivos se quer alcançar. A partir daí, a corretora é capaz de oferecer as melhores opções de carteira – que contam com vários tipos de aplicações, dependendo das metas traçadas pelo cliente. Os perfis vão desde os conservadores até os mais agressivos, que são os que têm maior apetite por risco. A partir do perfil moderado já é possível investir em ações.
3 - Escolha uma estratégia de investimentos
Se seu perfil for compatível com investimentos em ações, avalie as estratégias que lhe permitirão alcançar os objetivos traçados, como aposentadoria ou a compra de um imóvel, por exemplo. Para isso, é possível consultar conteúdos de educação financeira disponibilizados gratuitamente pelas próprias instituições ou contratar planos com assessorias que lhe indicarão os caminhos que melhor se encaixam.
4 - Faça a lição de casa
Antes de comprar ações, estude sobre as empresas cujas papéis lhe interessam. Ao investir em ações de determinada companhia, você torna-se sócio dela. Sendo assim, é necessário entender a atuação da empresa, seu potencial de crescimento, limitações e concorrência, entre outros fatores, para saber se seu dinheiro está sendo bem aplicado e renderá o quanto deseja.
5 - Acompanhe as notícias das empresas da qual é acionista
Não basta pesquisar apenas antes de comprar ações. Quando você vira acionista de determinada empresa, é importante estar atento a comunicados, notícias, e mudanças internas, como trocas em cargos de diretoria. A partir do momento em que uma empresa passa a ser listada no pregão da B3, ela é obrigada a fornecer informações ao mercado sobre suas estratégias, atuação, e, principalmente, atualizar seus acionistas em eventuais momentos de crise.
*Estagiário sob a supervisão de Rosana Hessel
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