Conjuntura

Com queda em 2020, setor da construção civil está otimista para 2021

Relatório Trimestral de Inflação reduz previsão de queda do PIB em 2020, mas mostra preocupação com pressões sobre teto de gastos. Documento diminui projeção de investimentos estrangeiros diretos no país neste ano e no próximo

O Banco Central (BC) revisou a previsão de queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020, que passou de 5% para 4,4% e reduziu de 3,9% para 3,8% a expectativa de expansão da economia em 2021. Os novos indicadores fazem parte do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), divulgado ontem pela autoridade monetária, e são mais otimistas do que as projeções do Ministério da Economia, que prevê recuo no PIB de 4,5%, neste ano, e avanço de 3,2%, em 2021.

O documento de 85 páginas, avalia que os dados apontam “uma recuperação desigual da atividade econômica”.

Além disso, o BC mostrou preocupação com a piora no quadro fiscal e com as pressões sobre o teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas públicas à inflação do ano anterior. O teto é visto pelo mercado como uma âncora para evitar o descontrole das contas públicas, que poderia tirar a inflação do controle frustrar a retomada da economia.

Campos Neto afirmou que a desconfiança na capacidade de o governo conseguir reequilibrar as contas é um dos motivos para a forte revisão na projeção para a entrada de investimento estrangeiro no país. No RTI, o BC reduziu em 28% a projeção para o Investimento Direto (IDP), de US$ 50 bilhões, em setembro, para US$ 36 bilhões, neste mês. A nova projeção é quase a metade dos US$ 69 bilhões registrados em 2019. Para 2021, a expectativa caiu de US$ 65 bilhões para US$ 60 bilhões.

O IDP é um indicador importante para mostrar a confiança dos investidores no país, pois reflete a entrada de capital de longo prazo, que é fundamental para a economia apresentar um crescimento mais duradouro e sustentável. “Para voltar a registrar aumento no IDP e a volta do investidor de longo prazo, o Brasil tem que recuperar a credibilidade na questão fiscal”, disse Campos Neto. “O governo precisa mostrar um caminho para a política fiscal para ter mais credibilidade”, acrescentou.

Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), lembrou que a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) pelo Congresso, na quarta-feira, ajudou a acalmar o mercado, mas não resolve os problemas que estão por vir no ano que vem, apesar de já incluir na previsão os R$ 20 bilhões para a vacinação contra a covid-19 que constam de medida provisória divulgada ontem pelo Planalto.

“A LDO traz muitas incertezas. Uma delas é que o nível previsto de despesas discricionárias, de R$ 83,9 bilhões, é mais baixo do que o previsto, e o governo não dá sinais claros de como pretende reduzir o deficit primário dos próximos anos”, destacou. Salto reforçou que o adiamento da PEC Emergencial para o ano que vem deixa dúvidas sobre a manutenção do teto de gastos. “Não há sinalizações de curto prazo sobre a gestão das contas públicas, e isso dificulta a análise de cenários de riscos”, lamentou.

Inflação

Pelas projeções do BC, apesar de reconhecer uma pressão maior nos preços administrados, como a conta de luz, a inflação deste ano terá alta de 4,3%, passando para 3,4% em 2021 e em 2022. Durante a apresentação do relatório, o presidente do BC não precisou quando o Comitê de Política Monetária (Copom) poderá iniciar uma nova alta da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 2% ao ano. A alta é considerada inevitável pelo mercado “em meados do ano que vem”.

Apesar de prever inflação dentro da meta neste ano e nos próximos, o BC admitiu que, em um cenário de desequilíbrio fiscal crescente, a inflação poderá chegar a 6,4% em 2021, como reflexo de uma elevação da desconfiança do mercado e das cotações do dólar. O diretor de Política Econômica do BC, Fabio Kanczuk, explicou, porém, que este não é o cenário básico com que o BC trabalha.

CEO da Siegen e professor do Insper, o economista Fabio Astrauskas diz que ainda não é possível descartar o cenário alternativo do BC. "O atual quadro de risco fiscal e de prolongamento da pandemia requer cautela. E 2021 será um ano pré-eleitoral, que pode levar o governo a querer gastar mais", explicou.

Na avaliação do diretor da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Oliveira, “o fiscal vai determinar o quanto os juros vão subir em 2021”. Para ele, o BC indicou que os juros podem subir em meados do ano, uma vez que a previsão de inflação de 2022, de 3,4%, está perto do centro da meta, de 3,5%.

Indústria avança em novembro
A atividade industrial voltou a crescer em novembro, embora num ritmo menor que em outubro. Os dados são da Sondagem Industrial, divulgada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em novembro, o índice de evolução da produção ficou em 53,1 pontos ante os 58,3 pontos registrados no mês anterior. Apesar do ritmo mais lento, o indicador ainda reflete aumento da produção, segundo a CNI, porque está acima da linha divisória dos 50 pontos. A CNI destacou que novembro costuma ser um mês de redução da atividade industrial e a comparação com outubro geralmente é negativa.

Otimismo na construção

Devido à pandemia da covid-19, o setor de construção civil, em 2020, vai registrar um tombo de 2,8%. Mas, para 2021, a previsão é de crescimento de 4%, segundo estimativas da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Se confirmado, será o maior avanço em oito anos. Mas a maior preocupação da construção civil para 2021 é o desabastecimento.

De acordo com a Cbic, o Produto Interno Bruto (PIB) da construção civil no terceiro trimestre de 2020 estava no mesmo patamar do início de 2007. As atividades do setor estão 36% abaixo do pico de 2014, quando atingiram seu melhor nível.

“O principal motivo para o desempenho fraco em 2020 era o preço do dólar. O real já se valorizou, mas o problema é que os preços dos subprodutos continuam crescendo. Não há previsão contatual que dê conta desse aumento. O desabastecimento é preocupante, porque inibe as empresas de lançarem (unidades)”, reclamou José Carlos Martins, presidente da Cbic, ao apresentar o balanço do setor em 2020 e as projeções para 2021. Segundo Martins, a maioria dos empresários citou a falta de matéria-prima como o grande desafio

No terceiro trimestre do ano, o custo da construção subiu 39,2%, segundo a Sondagem da Indústria da Construção, levantamento feito pela entidade com a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Apesar disso, destaca Martins, o setor foi o que mais gerou empregos no país nos primeiros 10 meses de 2020, com a criação de 138.409 vagas formais, o melhor resultado para o período desde 2013.

O Índice Nacional do Custo da Construção Civil (INCC-Materiais e Equipamentos), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), apontou alta de preços nos insumos, de janeiro a novembro, de 17,72%, a maior do período pós-real. Alguns deles registraram aumentos superiores a 50% no período.

Outro problema, segundo a Cbic, é a baixa taxa de investimento do Brasil, em relação ao PIB. No terceiro trimestre de 2020, estava em 16,2%, muito abaixo de outros países, como China, Espanha, Austrália, Canadá, Chile, França e Uruguai. Na última década (2010-2019), a construção no Brasil foi responsável por cerca de 50% dos investimentos. Em 2019, foi de cerca de 44%.

Expectativas

De acordo com a Sondagem da Indústria da Construção, os empresários do setor têm expectativas positivas para os próximos seis meses. Os resultados do trabalho sinalizam aumento na compra de insumos e geração de novas vagas. Os índices de expectativa também demonstram que os empresários estimam o aumento do nível de atividade e um maior volume de lançamentos de novos empreendimentos e serviços.

Investimentos de R$ 7,3 bilhões em energia

Com disputas acirradas, 51 grupos inscritos e deságio médio de 55,24%, o leilão de projetos de transmissão de energia elétrica, realizado ontem na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), foi considerado um sucesso pelo diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), André Pepitone da Nóbrega. “O leilão foi muito competitivo, com média de 13,5 empresas para cada um dos lances e de 10 empresas ofertantes. O lote com mais inscritos teve 19”, disse. A Aneel estima em R$ 7,3 bilhões os investimentos que serão feios pelas empresas.

Grupos de seis países — China, Colômbia, Espanha, Portugal, França e Itália — participaram do certame, além de empresas nacionais. “O resultado confirma o interesse da iniciativa privada e mostra o apetite e confiança dos estrangeiros”, ressaltou Pepitone.

O grande vencedor foi um grupo brasileiro: a MEZ Energia, que venceu arrematou cinco lotes, com dois consórcios: Nicholas I e São Nicholas II, formados pelas subsidiárias MEZ Energia e Participações e MEZ Energia Fundo de Investimentos em Participações em Infraestrutura. “São Nicholas fará 33% do investimento previsto com os 11 lotes. Vai desembolsar R$ 2,39 bilhões”, comentou Pepitone.

Kelly Santos, gerente jurídica do Grupo MEZ, explicou que a meta era levar sete dos 11 lotes. “Levamos cinco. O grupo é inteiramente nacional. Iniciou suas atividades no fim do ano passado. Participou do primeiro leilão e arrematou o lote 10 em 2019, além de ter empreendimentos na Bahia e, em fase de implantação, em Goiás e no Rio Grande do Sul”, afirmou. Segundo ela, a companhia também tem um braço na construção civil e experiência na implantação de projetos, e com aquisição de outras transmissoras. “A estratégia do grupo é expandir a área de transmissão de energia”, revelou.

Para financiar os projetos arrematados no leilão desta quarta, Kelly Santos destacou que a empresa pretende usar um leque amplo. “Desde o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), aporte de recursos próprios até debêntures incentivadas”, enumerou. A gerente garantiu que o grupo tem saúde financeira e capacidade técnica. “Temos outros quatro projetos no setor, muito alinhados com as normas regulatórias. O grupo tem gestão eficiente, de projetos e financeira. No longo prazo, vamos ampliar as vertentes para a geração de energia renovável”, disse.

O diretor da Empresa de Planejamento Energético, Erik Rego, lembrou que parte dos lotes que seriam leiloados hoje foi postergada para 2021 e 2022. “No ano que vem, serão dois leilões em junho e em dezembro. No primeiro, a expectativa é de investimento de R$ 1,5 bilhão”, assinalou. Para dezembro, ainda não está fechado o valor, mas são, no total, R$ 7 bilhões. “Não sabemos quanto ficará para dezembro de 2021 e quanto irá para 2022. Mas, nos próximos três a quatro anos, teremos concessões com investimentos de R$ 30 bilhões”, acrescentou.