Uma ida ao supermercado está custando cada vez mais caro. Não por acaso, os consumidores vêm reduzindo, semanalmente, o número de produtos nas cestas de compras. Dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) reforçam o que os brasileiros sentem no bolso. A inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), registrou alta de 0,89% em novembro, o pior resultado para o mês desde 2015 e acima das previsões dos analistas, de 0,78%. Alimentos e transportes (gasolina, principalmente) foram os itens que mais pesaram no bolso dos consumidores. Em 12 meses, o IPCA cravou alta de 4,31%, superando a meta de 4% perseguida pelo Banco Central. No mesmo período, os alimentos saltaram quase 16%.
Quem está assustado com a disparada dos preços deve ficar atento. Pelos cálculos da economista Julia Passabom, do Itaú Unibanco, a inflação de dezembro será ainda mais pesada: de 1,27%, encerrando 2020 em 4,44%. Além dos alimentos, que continuarão massacrando as finanças da população, sobretudo a mais pobre, o custo de vida será puxado pelos reajustes das contas de luz e pela recuperação do setor de serviços. A boa notícia é a recente queda dos preços do dólar, que reduzem a pressão sobre as commodities agrícolas (cotadas segundo o mercado) e sobre a indústria, que sofre com a falta de insumos, reflexo da paralisação das fábricas no auge da pandemia do novo coronavírus.
Para Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da RPS Capital, a inflação está chegando ao seu pico. Há, no entender dele, perspectivas de normalização dos preços a partir de 2021, com a recomposição dos estoques da indústria, o dólar mais fraco, o fim das antecipações das compras de alimentos pela China e o fato de a economia ainda estar operando muito abaixo de seu potencial. Outro ponto importante que, matematicamente, ajuda no cálculo da inflação do ano que vem: a antecipação da bandeira vermelha para as contas de luz. Somente esse ponto retirará 0,3 ponto percentual do IPCA de 2021. Com isso, é possível apostar em uma inflação mais próxima de 3%, abaixo da meta de 3,75%.
Queixas gerais
São esses fatores, segundo Leal de Barros, que fazem com que o Banco Central ainda se sinta confortável para manter a taxa básica de juros (Selic) em 2% ao ano, o nível mais baixo da história. Hoje, essa taxa deve ser ratificada em reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). O economista da RPS Capital acredita, porém, que, a partir do próximo ano, o BC passará a adotar um discurso mais duro em seus comunicados ao mercado. E, da metade de 2021 em diante, terá de aumentar a Selic para controlar as expectativas dos agentes econômicos. “Nesse contexto, a política fiscal a ser executada pelo governo terá papel preponderante nos rumos da inflação e dos juros”, diz.
Distantes desse debate macroeconômico, os consumidores dizem que fechar as contas no fim do mês está cada vez mais difícil, pois os preços não param de subir. A servidora pública Ane Márcia de Lima, 60 anos, afirma que está muito complicado comprar carnes e frutas, como maçã, abacate, mamão e banana. “Tudo está muito caro”, frisa. “Entre os produtos de limpeza, o sabão em pó é o vilão”, afirma. A professora Cármen Lúcia Martins, 44, reclama, especialmente, dos valores dos eletroeletrônicos, que subiram muito nesses tempos de home office, por causa da covid-19. “O fato é que o custo de vida não é mais o mesmo do observado no início do ano”, relata.
O jeito de driblar a carestia é aproveitar as poucas ofertas feitas por lojas e supermercados. É o caso da aposentada Maria Luíza Rodrigues, 67. Ela conta que, se o shampoo que costuma usar ficou mais caro, conseguiu bons descontos nas tinturas para cabelo e em um par de sapatos. A servidora pública Ane de Lima, por sua vez, percebeu deflação (queda dos preços) nos artigos de vestuário. “As roupas, talvez em função da Black friday, ficaram mais acessíveis do que no restante dos meses do ano”, afirma.
*Estagiária sob a supervisão de Vicente Nunes
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