Com os casos de covid-19 em alta e o auxílio emergencial perto do fim, aumenta a pressão para que o governo Bolsonaro e o Congresso Nacional prorroguem o estado de calamidade pública, instituído no início da pandemia em vigência até o dia 31. O pedido vem sendo defendido por alguns parlamentares e foi reforçado pelos governadores do Nordeste nesta quinta-feira (17/12). A prorrogação do decreto, no entanto, ainda não está nos planos do governo.
O consórcio de governadores do Nordeste pediu a prorrogação do estado de calamidade pública por seis meses, por meio de ofício enviado nesta quinta-feira ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido); ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP); e ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O documento é assinado pelo presidente do Consórcio Nordeste, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT-PI), e afirma que o estado de calamidade pública deve ser prorrogado porque os motivos que levaram a sua decretação continuam.
"Neste momento em que vivemos com aumento do número de casos, elevação da taxa de transmissibilidade em várias regiões do país, elevada utilização de leitos clínicos e de terapia intensiva e crescimento diário do número de óbitos, e tendo ainda, que reconhecer que somente ao final do primeiro semestre de 2021 é que teremos a imunização da população brasileira em torno de 70%, precisamos reconhecer que o Estado de Calamidade continua", defende o ofício dos governadores do Nordeste, ao qual o Correio teve acesso.
O Consórcio Nordeste acrescenta que a prorrogação do estado de calamidade é "medida fundamental à manutenção de ações de proteção àqueles que vivem em situação de vulnerabilidade social e que necessitam dos auxílios pertinentes a este momento ao qual vivemos, bem como é instrumento fundamental para manutenção de um conjunto de ações administrativas na gestão dos serviços de saúde pública". Por isso, pede que o estado de calamidade seja estendido por mais seis meses.
Os governadores do Nordeste entendem que, desta forma, será possível licitar de forma mais rápida os materiais que serão necessários para a aplicação da vacina contra a covid-19, como as seringas e as luvas. Além disso, os estados ficariam autorizados a continuar fazendo gastos para o combate à pandemia acima dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Foi por conta disso, por sinal, que o governo Distrito Federal pediu e a Assembleia Legislativa do aprovou a prorrogação do estado de calamidade pública no DF nesta semana. Os decretos estaduais de calamidade também já foram prorrogados em Pernambuco, Rondônia e Santa Catarina.
Auxílio emergencial
Também há parlamentares que defendem a prorrogação do estado de calamidade para estender o auxílio emergencial pelos primeiros meses do próximo ano. É o caso do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que, nesta semana, apresentou um projeto pedindo que o estado de calamidade e o auxílio emergencial sejam prorrogados por três meses, e do senador Rogério Carvalho (PT-SE), que pediu o pagamento dos R$ 300 por mais seis meses.
"Infelizmente, a pandemia não acabou e a vacinação ainda demorará alguns meses. Não podemos aceitar o fim formal do estado de calamidade se a calamidade continua", defendeu Vieira, dizendo ainda que "da mesma forma, não podemos cogitar de subitamente retirar das famílias a renda" do auxílio emergencial. "A crise decorrente da covid-19 fez com que milhões de pessoas batessem à porta da pobreza. É essencial
que o Parlamento se posicione de maneira altiva para garantir proteção social mínima à parcela da população que se encontra mais vulnerável socioeconomicamente", argumentou.
Acordos de redução salarial
Empresários do setor de serviços também estão atentos à possibilidade de prorrogação do estado de calamidade pública, pois desejam prorrogar os acordos de redução salarial e suspensão do contrato de trabalho no início de 2021. O pleito já foi apresentado extraoficialmente ao Ministério da Economia e ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), mas depende da prorrogação do estado de calamidade pública pelo Congresso. Por isso, também vem sendo apresentado aos parlamentares que integram a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Comércio, Serviços e Empreendedorismo.
"O setor de bares e restaurantes ainda está sofrendo 53% de prejuízo, mas vai precisar chamar todos os trabalhadores de volta em janeiro, porque os acordos terminam agora no fim do ano, e corre o risco de não ter como pagar o salário de janeiro", alerta o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci.
Solmucci defende o prolongamento dos acordos e também a revisão da cláusula que prevê a estabilidade dos funcionários que tiveram o salário reduzido pelo mesmo tempo do acordo de redução salarial.
Só em fevereiro
O governo, no entanto, ainda não trabalha com essa possibilidade. Líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO) disse que, como o Brasil já tem experiência com a covid-19, ainda é preciso avaliar o andamento da pandemia de covid-19 para saber se será necessário avançar com a proposta. Ele afirmou que se trata de um assunto que deve ser debatido apenas em fevereiro, pois o Congresso Nacional entra de recesso na próxima semana.
Fontes da equipe econômica reforçaram que essa possibilidade ainda não está mesa, pois acreditam que o aumento de casos da covid-19 é um reflexo da flexibilização do isolamento social e não deve gerar o mesmo grau de paralisação econômica do início da pandemia. O Ministério da Economia trabalha, portanto, com a volta das regras fiscais e o respeito ao teto de gastos em 2021, tanto que o ministro Paulo Guedes tem avisado que o auxílio emergencial acaba em 31 de dezembro.
O Correio apurou que, apesar de já ter feito vários elogios ao programa de manutenção do emprego, Guedes também não pensa em prorrogar os acordos de redução salarial. Ele acredita que, se for possível fazer novos gastos, seria melhor direcionar esses recursos para o substituto do Bolsa Família.
A retomada do ajuste fiscal tem sido defendida de forma enfática pela equipe econômica como uma forma de passar confiança ao mercado e, assim, garantir a vinda de investidores para os país e as condições necessárias para a manutenção dos juros baixos e da inflação controlada. Afinal, ainda há dúvidas sobre a trajetória de gastos e da dívida pública em 2021.
Porém, analistas consideram que o governo pode ter que fazer novas concessões devido ao aumento de casos da covid-19. "A preocupação fiscal existe e há uma dificuldade orçamentária, mas, diante do aumento de casos da covid-19, pode não haver outro remédio a não ser a prorrogação do estado de calamidade pública e do auxílio emergencial", disse a economista da Coface para a América Latina, Patrícia Krause.
Ela destacou, no entanto, que essa medida teria que ter prazo determinado e vir acompanhada do compromisso do governo de avançar com o plano de vacinação, para garantir o controle da pandemia no país, e também o compromisso de endereçar a questão fiscal, com a votação do Orçamento e da PEC Emergencial e medidas para assegurar a sustentabilidade das contas públicas. "A falta de direcionamento é o pior, pois o investidor precisa ver um plano, uma situação mais clara. Então, a prorrogação exigiria uma comunicação clara do governo", alertou.
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