O Produto Interno Bruto (PIB) desabou 9,7% no segundo trimestre de 2020, em comparação aos três meses anteriores, o pior resultado da história devido à pandemia de covid-19, conforme os dados divulgados nesta terça-feira (1º/9) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Esse resultado, após a revisão de 1,5% para 2,5% na queda do primeiro trimestre, confirmou que o país entrou novamente em uma recessão sem ter se recuperado totalmente da anterior, pois não conseguia crescer mais de 1% ao ano desde 2017. Para piorar, os números mostram que o PIB brasileiro regrediu para um patamar parecido com o de 2009.
A queda no segundo trimestre foi pior do que a mediana das estimativas do mercado, de -9,2%. Contudo, acabou sendo melhor que ao dos vizinhos latino-americanos. O tombo foi puxado principalmente, pela forte retração do setor de serviços, especialmente, daqueles prestados às famílias, que desabaram 19,8% no trimestre.
O setor, lembram os analistas, é o que mais pesa no PIB (mais de 70%), o que mais emprega e o que mais demora para se recuperar, sinalizando que a retomada rápida de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, tanto fala dificilmente ocorrerá após o país ter atingido o “fundo do poço”. Ontem, em audiência pública no Congresso, Guedes afirmou que a queda do PIB era um “som de um passado distante”, e que a economia “já está se recuperando em V”.
Especialistas ouvidos pelo Correio, no entanto, foram unânimes em afirmar que não haverá retomada na trajetória prevista pelo ministro. De acordo com o economista Otaviano Canuto, ex-vice-presidente do Banco Mundial (Bird), a curva poderá ser na forma de uma raiz quadrada. “Só o ministro acredita em recuperação em V. O PIB voltou ao patamar de 2009, e o que temos é o cenário de mais uma década perdida”, lamentou.
A economista Monica de Bolle, pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics, prevê uma curva em ziguezague, devido às retomadas intermitentes da economia daqui para frente. “A população vai ter de aprender a conviver com a doença e suas idas e vindas, até a descoberta da vacina”, alertou. Para ela, o retrocesso de 11 anos do PIB em apenas seis meses, é reflexo da falta de ações do governo federal para a contenção da pandemia. “A economia está muito relacionada à saúde. E os erros de o governo não ter adotado medidas rígidas, classificando a doença como uma gripezinha, agora resultam em um cenário de depressão na economia”disse.
Revisões
Após a divulgação dos dados do PIB, uma nova onda de revisões para o resultado de 2020 começou. Os bancos Itaú e Bradesco mantiveram a estimativa de queda de 4,5%. O Goldman Sachs alterou a previsão de -5% para -5,4% Já a MB Associados revisou a projeção de -5,3% para -4,8%.
Sergio Vale, economista-chefe da MB, destacou que “o socorro direto à população, como o auxílio emergencial de R$ 600, contribuiu para evitar uma queda maior do PIB no segundo trimestre”. Supondo que todo esse valor tenha sido gasto, “o PIB deixou de despencar 18,2% no trimestre para cair 11,4%”, na comparação com o mesmo período de 2019.
Silvia Matos, pesquisadora sênior da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), lembrou que a queda do PIB do segundo trimestre de 2020 “já é a maior desde a década de 1980”. Conforme dados do Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace), da FGV, o tombo superou a retração acumulada de 8,1%, entre 2014 e 2016, e de 8,5%, entre 1981 e 1983.
“Os dados do PIB não são animadores e limitam uma recuperação mais acelerada, porque ela dependerá de como o governo vai buscar resolver o problema de curtíssimo prazo, sem comprometer o longo prazo, para que o investimento formal e o emprego voltem”, afirmou Sílvia. Apesar do resultado pior do que o esperado, o Ibre manteve em 5,4% a previsão de queda do PIB neste ano.
Os dados do IBGE mostraram ainda que, na ótica da oferta apenas a agricultura registrou crescimento. Na ótica da demanda, os três componentes do PIB tiveram quedas expressivas: consumo das famílias (12,5%), consumo do governo (8,8%), que surpreendeu pela magnitude, e investimentos (15,4%).