Inoperante há mais de sete meses e com estimativa de pior ano nas duas últimas décadas, o segmento de eventos amarga o abandono. O Ministério da Economia não considera essa atividade como uma das afetadas pela pandemia de covid-19. A lista foi publicada na última terça-feira (15/09), em portaria do Diário Oficial da União.
Responsável por 4,32% do PIB nacional e com movimentação anual de R$ 1 trilhão, a produção de eventos realiza mais de 590 mil empreendimentos por ano em todo o país. Segundo a Abrape (Associação Brasileira dos Promotores de Evento), com cerca de 300 mil eventos cancelados, a estimativa é de que até o mês de outubro cerca de 840 mil trabalhadores do setor estejam desempregados. Ainda sim, essa realidade não foi suficiente para o Ministério da Economia considerar o setor como um afetados pela pandemia da Covid-19.
O músico Allan Massay que fazia cerca de 20 apresentações por mês e tem 100% da sua renda proveniente de eventos culturais, cancelou a agenda de shows por completo. Ele ficou sem renda. "Cancelei mais de 50 shows no início da pandemia. Depois disso tive faturamento nulo, não recebi mais nada. Além de mim, ainda tenho toda uma equipe que trabalha comigo e que também foi afetada pelos meses sem apresentações", descreveu.
Segundo pesquisa realizada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) em abril deste ano, a pandemia afetou em 98% o setor de eventos. Ainda de acordo com o levantamento, o faturamento apresentou uma queda entre 76% e 100% na comparação com o mesmo período do ano passado.
Para Renata La Porta, presidente da Associação dos Buffets do DF, o setor está abandonado pelo governo. “O setor de eventos foi dos mais impactados pela pandemia porque teve seu faturamento zerado, ao contrário da maioria das empresas que viu seu faturamento cair. Merecia uma especial atenção por parte do governo e ao invés de ser adicionado a um pacote genérico de resgate a empresas de outros setores”, afirma a dirigente da entidade que representa as 20 maiores empresas do ramo no DF.
“A situação é trágica e demanda atenção imediata, não dá mais para esperar. O prejuízo é incalculável e o impacto sobre o sustento de milhares de pessoas não pode continuar sendo ignorado”, acrescenta La Porta.
Retomada
Apesar da volta gradual da atividade econômica no Distrito Federal, ainda não há previsão da liberação de shows e apresentações desses artistas. Segundo decreto publicado no Diário Oficial da União no início desta semana, ficam permitidas apresentações artísticas em bares e restaurantes, desde que todos os protocolos de contenção do coronavírus sejam respeitados.
Para o músico Allan Massay, mesmo com a liberação, será preciso ter paciência e cuidado até haver uma retomada consistente. "Não é momento de se "afobar". Ainda é preciso tomar cuidado com a propagação dessa doença. Exigindo cuidado e se cuidando, é possível enxergar um retorno positivo ainda este ano", acredita
Presidente do Sindieventos-DF, Tavinho Neves também está otimista. Em junho, o Sindieventos/Câmara de economia Criativa (ambos da Fecomércio), ABEOC e IBRAFE, apresentaram à Secretária de Turismo, ao Secretário de Cultura, Secretaria de Esportes e à Casa Civil uma proposta de Protocolo de Retomada do Setor de Eventos com total segurança. “Todos receberam muito bem, dizendo que trabalharam para o mais breve possível fosse publicado o Protocolo para eventos pelo GDF”, afirma.
Tavinho alega que, no Distrito Federal, a economia ligada a eventos reúne centenas de empresas, organizadoras e fornecedores. A volta ao trabalho é urgente. ”Diferentemente de outros estados, o DF depende financeiramente do Governo Federal e do Governo do Distrito Federal. Eles já liberaram as Feiras da cidade, mas não liberam as Feiras Eventuais. Liberaram os cinemas e não liberaram os eventos corporativos em Centros de Convenções. Precisamos muito voltar a trabalhar com total responsabilidade. Não só os eventos que sofrem, mas boa parte da economia do turismo em Brasília está dependendo dos eventos financeiramente, como hotéis, restaurante por exemplo”, alega o presidente do Sindieventos.
As lives
Com os eventos cancelados e as pessoas reclusas em casa, artistas e produtores viram nas apresentações online uma forma de manterem, de certa forma, alguma renda. O cantor Allan Massay conta que, desde o início da pandemia, no mês de março, só teve sua primeira apresentação remunerada três meses depois. "Para continuar levando cultura e alegria para quem estava em casa, comecei a produzir lives, mas com todo investimento bancado por mim", relata o artista.
O DJ Einstein Vargas, do grupo Doop Jam, afirma que profissionais como ele foram profundamente afetados pela pandemia. Muitos estão há 6 meses sem qualquer receita das apresentações, virtuais ou presenciais. "Como nosso segmento depende de festas, casamentos, eventos corporativos e da locação de equipamentos, ficamos completamente parados e tivemos que demitir todos os funcionários. As lives produzimos foram independentes e sem fins lucrativos. Estamos completamente sem faturamento", explica o DJ.
Voluntários
De acordo com Camila Marconi, responsável em Brasília pelo projeto Ajude 1 freela, o setor de eventos sempre foi invisível. “Falo isso com base na inexistência de regulamentação da área e no reconhecimento de sua importância na movimentação da economia do país. Veja, o mercado vem evoluindo, ganhando mais espaço e gerando muitos empregos formais e informais. Quando a pandemia chegou, já sabíamos que esse mercado não seria assistido por nenhum projeto de renda, porque muitos nem não se encaixam nos parâmetros exigidos”, observa.
A fim de preencher essa lacuna, um grupo de produtoras criou, no início de março, o projeto Ajude 1 Freela. A iniciativa tem como objetivo arrecadar cestas básicas, medicamentos e produtos de higiene. “Conseguimos ir além. Hoje os produtores cadastrados beneficiados também recebem ajuda através de orientação contábil e psicológica para situações criticas que mereçam atenção”, declara Camila.
Sem fins lucrativos, o projeto Ajude 1 freela conseguiu atender cerca de 3.000 famílias com cestas básicas e mais de 100 pessoas com remédios e apoio psicológico. “A união de fornecedores, clientes e frilas fez com que tivéssemos uma estrutura mínima para ajudar quem, há seis meses atrás, não tinha nenhuma comida na mesa. Sem muitas esperanças de regularização da área para um futuro próximo, o Ajude 1 freela vem elaborando projetos para continuar ajudando esse mercado cada vez mais”, afirma Marconi.
*Estagiárias sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza
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