Há um momento, na trama do premiado Mussum, o filmis que, numa esquete de humor, o personagem central é posto de frente aos pais da noiva branca que lhe perguntam então, com o que ele entrará, no contrato social do casamento, frente ao avantajado dote da pretendente; ao que ele, prontamente, responde: "o recibis". O Brasil representado à época do enredo do filme também passava um recibo: trazia uma feição preconceituosa, por vezes, racista, no qual a mãe do humorista (ainda criança) alerta para o risco de ser associado a "batuqueiro, cachaceiro ou vagabundo". É para esta mesma mãe de tantos ensinamentos, que Mussum terá o que ensinar: para além de uma aula improvisada de caligrafia, ele mostrará que "a gente (os pobres ou discriminados) pode tudis".
Cheio de sonhos, o protagonista, ainda que desafiando algumas pessoas, envereda para estrada que equilibra samba e humor. O filme de Silvio Guindane, pela vez, abraça uma vertente cara ao público — a do melodrama. Com "figurino do povo", Mussum, acatando consagrado ditado, sabe que: "mãe é mãe". Daí, mesmo homem feito — já no corpo do militar da Aeronáutica —, não larga da barra da saia materna: em dois momentos, a mãe é interpretada com enorme competência, por Cacau Protásio e Neusa Borges. Sem ele "ter" pai, elas puxam uma bela carga emotiva da trama. Também são vibrantes os comprometimentos dele com o grupo Originais do Samba e com a escola de samba da Mangueira, numa parceria supervisionada, no filme, por Alcione (Clarice Paixão).
Junto com futuros e sagazes conselhos que receberá de Chico Anysio, Mussum aprende com a mãe a não "abaixar a cabeça". Na carreira, pouco a pouco, o humorista descobrirá que ser ator, como pensava, não se resumia a "passar maguiagem e falar fininho". Como escora para um quadro televisivo comandado por Grande Otelo (Nando Cunha), entre uma estreia escaldante (na qual sua feito bica d´água), o ator é rebatizado pelo mestre do humor, como Mussum. Num recorte da atuação entre Os Trapalhões, o filme traz inspiradas releituras do ator interpretando hilárias sequências como Maria Bethânia e Clara Nunes. Noutra cena, Aílton Graça brilha, intensamente, num repeteco de quadro com o sargento Pincel.
Sempre submerso num olhar que exala ingenuidade, Ailton Graça está insuperável em cena. Zeloso do reco-reco e da possibilidade de escolha (ainda que não necessariamente isso resulte em "conforto"), e trabalhador esmerado, o Mussum das telas brilha, em números musicais como os de A dona do primeiro andar e Tragédia no fundo do mar, além de apresentações comandadas por Jorge Ben e Elza Soares (de quebra, Cartola ainda aparece em cena). Nos bastidores de Os Trapalhões, representados no longa, entre arremedos de Didi, Dedé Santana e Zacarias, Mussum é quem detém o cetro, algo afastado de atritos e jogos de vaidade entre o resto do quarteto.