Crítica

Leia crítica do musical Wicked: um voo rasante que tangencia fiasco

Com duração excessiva e muito descolado da magia empregada pelo clássico O Mágico de Oz, o novo longa Wicked, apoiado por Cynthia Erivo e Ariana Grande, chega embalado em musical à la Broadway

Revogação de permissões (do ensino) dentro da sociedade e disseminação de preconceitos (que, pelo menos, serão aplainados na trama): estas são duas premissas no livro de Gregory Maguire que afunila a origem das bruxas que dão norte ao enredo de O mágico de Oz, clássico musical extraído da literatura de L. Frank Baum. O norte porém vem com direções antagônicas: considerada modelo, a Bruxa Boa do Sul, na telona, será vivida por Ariana Grande; enquanto a Bruxa Má do Oeste ganha as feições de Cynthia Erivo. Wicked — com roteiro de Stephen Schwartz (criador do musical), Winnie Holzman e Dana Fox — chega aos cinemas com a assinatura de Jon M. Chu.

Muito da ação se dará na Universidade Shiz (com quê de Harry Potter). A escalação das colegas de dormitório não se prova das mais felizes, uma vez que — ainda distantes de juízos de valores definitivos de boa e má — Galinda (Ariana) se mostra radiante e frívola, enquanto Elphaba sente na pele (verde), no relato "dos caminhos que se cruzam", o amargo castigo de bullyings e desprezo. Conhecer o Mágico de Oz (Jeff Goldblum) é uma possibilidade, a partir da detecção do potencial de Elphaba, que é temida e invejada. É bem verdade que, num processo de aceitação haverá, numa festa juvenil à la Carrie (1976), o estranhamento que bebe da cena da pista de dança frequentada por Wandinha (da série Netflix).

Seria injusto integrar Wicked à luz do rastro irretocável do clássico (de 1939) O mágico de Oz (entre os 10 maiores filmes de todos os tempos segundo votação de especialistas do American Film Institute). Ambas as atrizes do filme atual — com alguns números gritados e vozes que saem das gargantas — estão descoladas da ingenuidade juvenil da intérprete de Dorothy, Judy Garland, aos 16 anos. Mesmo com uma edição falha, que se apega a quase duas horas e 40 minutos, Wicked consegue canalizar focos de interesse e popularidade, recorrendo a ingredientes de fitas como Meninas malvadas, Barbie (na estética) e As patricinhas de Beverly Hills. Fatores de risco sempre foram bem precisos no cinema de Jon M. Chu (vide a originalidade de Em um bairro de Nova York). John Powell, o cocriador de cantorias de Shrek e Happy Feet, também figura nas criações musicais.

Trazido dos palcos em espetáculo de 2003, recebido com muitas ressalvas, Wicked é calibrado por uma orquestração pomposa e irritante. Mesmo que distanciado do acabamento brilhante da trama do filme comandado por Victor Fleming, a existência de animais cultos (encarregados de ensinamentos para humanos), a qualidade dos figurinos, em particular os da vencedora do Oscar Michelle Yeoh (ótima, na pele da misteriosa Madame Morrible) e a interpretação da música em que se desafia a gravidade (com Cynthia Erivo voando alto, na interpretação de Defying gravity) são acréscimos positivos. Bem no princípio, os efeitos especiais ficam titubeantes, quando da aparição dos macacos alados. Mas Vossa Ozidade (como é chamado Oz) há de encontrar um feitiço para perdoar.

 

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