Artes visuais

Obra de Ismael Monticelli faz releitura de atos antidemocráticos

Exposição de Ismael Monticelli no Museu Nacional da República reflete sobre a pulsão destrutiva da extrema direita

A ligação entre os atos antidemocráticos do 8 de janeiro e o movimento futurista italiano levou o artista Ismael Monticelli a criar a instalação O teatro do terror, em cartaz no Mezanino do Museu Nacional da República. Quando começou a pesquisa para entender o que estava por trás das invasões e depredações encabeçadas por uma multidão estimulada pela extrema direita, Monticelli queria também fazer alguma relação com a história da arte. "Um dos procedimentos recorrentes no meu trabalho é ver como imagens do passado desaguam no presente, como se conectam com o momento que a gente vive", explica o artista. "E pensando sobre os movimentos de direita no Brasil, fui parar no integralismo brasileiro, maior movimento fascista fora da Itália, e acabei parando numa vanguarda, talvez a única do século 20 declaradamente de direita, que é o futurismo."

Surgido no início do século 20, o futurismo era um movimento que tinha uma relação muito próxima com a ideia de guerra, além de ser movido por um patriotismo considerável, por uma crença no poder da tecnologia e pela certeza de que as massas eram manipuláveis. Ao notar os paralelos entre o futurismo e o 8 de janeiro, Monticelli também se deparou com uma tapeçaria de Fortunato Depero intitulada Guerra=Festa. Impressionado, Monticelli decidiu levar para o museu as figuras do trabalho reconstruidas em papelão em uma reprodução da cena do artista italiano. "Depero, nos anos 1920, estava sintonizado com o programa dos futuristas. A tapeçaria é muito colorida e vibrante, mas retrata uma guerra sangrenta, o que é uma grande contradição. Se observamos o 8 de janeiro, essa ideia de Guerra=Festa se encaixa: foi uma espécie de destruição e celebração, enquanto as pessoas destruíram elas comemoravam, rezavam", lembra. 

As esculturas do artista reproduzem a cena de guerra montada por Depero, mas com alguns detalhes. Feitas em papelão, planas e bidimensionais, as figuras são pintadas em tinta acrílica em uma face, mas são toscas, com materiais aparentes e restos de pigmentos na outra face. "É muito pensado como se fosse uma cena, um teatro no qual você tem essa imagem em que não vê os bastidores", avisa o artista. "A parte de trás é bastante tosca e frágil. Na frente temos a cena muito clara e viva, mas atrás, o que articula essa cena não é muito bonito, como foi o 8 de janeiro e as ideias que conduziram para as invasões." No total, 45 esculturas em escala real ocupam o Mezanino em uma lembrança de como a ideologia da destruição pode mobilizar massas e desencadear ações devastadoras.

Serviço

O Teatro do Terror

Instalação de Ismael Monticelli. Visitação até 24 de novembro, de terça a domingo, das 9h às 18h30,na Galeria Mezanino do Museu Nacional da República  (Esplanada dos Ministérios

 

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