Crítica

Arauto da destruição: a sombra de Bolsonaro está no longa 'Transe'

Johnny Massaro e Luisa Arraes estrelam o filme de duas diretoras que exploram bastidores das eleições de 2018

Luisa Arraes estrela o intuitivo enredo de Transe -  (crédito:  ArtHouse e Filmes do Estação)
Luisa Arraes estrela o intuitivo enredo de Transe - (crédito: ArtHouse e Filmes do Estação)

Crítica // Transe ★ ★ ★

Ir a campo, para entender ataques e agressividade de uma ala que opera com fé alientante, à época das eleições de 2018, move personagens que encabeçam esta ficção com a espontaneidade documental orquestrada pelas diretoras Anne Pinheiro Guimarães e Carolina Jabor. Em cena, estão os atores Ravel Andrade, Johnny Massaro e Luisa Arraes — cada um assume personagem que carrega o próprio nome. De imediato, dada a estrutura do longa fica difícil não surgir a natural comparação com o filme-tese de Jean-Luc Godard, A chinesa, datado de 1967. A diferença é que, mais direto e sem tantas cifras, Transe explora atmosfera captada nas ruas.

Datado e abjeto é o discurso daquele sagrado campeão das urnas em 2018 — se resta alguma dúvida, há a exposição em cena (com versão integral) dos discursos insanos para, como ressalta personagem, o "povo que quer ver sangue" e que caminha, pleno, para um processo de "lobotomização" coletiva. Periferia, direitos humanos, fome e reclame de moradia não sensibilizam, no cenário em que "o acúmulo de riquezas" parece imperar, num cenário em que o desvirtuamento da leitura da Bíblia parece comprazer pastores urdidos por projeto de poder.

Uma capacidade de abstrair a polarização nas eleições injeta (na medida da ingenuidade) dignidade na personagem Luisa. O filme consegue trazer leve graça, ao abraçar doses de psicodelia, ampliar noções de liberdade e remexer nas bases dos inacreditáveis (e tristes) discursos que deram renderam indecente eleição associada ao inominável. Atraso, tortura psicológica e a cegueira do fanatismo são entrevistos em meio aos "seres inumanos" tragados pelo sabor da irresponsabilidade daqueles descrentes de "tudo" e da farsa que aboliu (e temeu) discursos. Aos jovens do filme resta fazer "mais arte" para espantar a operante percepção da caretice generalizada que esteve em cena, há seis anos.

 

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postado em 03/05/2024 10:38 / atualizado em 03/05/2024 10:39
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