Cinema

Zona de interesse, candidato ao Oscar: retrato da frieza nazista

Confira a crítica do filme Zona de interesse, que colocou o inglês Jonathan Glazer como finalista de cinco prêmios Oscar

Crítica // Zona de interesse ★ ★ ★ ★

Um provocativo díptico se forma quando analisados o longa Oppenheimer (dado como o favorito ao Oscar) e Zona de interesse, filme do inglês Jonathan Glazer, vencedor do Grande Prêmio no Festival de Cannes e candidato ao Oscar de melhor filme, direção, filme internacional, roteiro adaptado (de texto de Martin Amis) e destacado pelo melhor som. No filme de Oppenheimer, pesa a consciência do físico creditado como o pai da bomba e ilhado numa gama de responsabilidade na qual está disposto a se enredar.

Protagonista de Zona de interesse, o comandante nazista Rudolf Höss (Christian Friedel) respondeu por atrocidades como a de, em menos de dois meses, propiciar a morte de 430 mil húngaros exterminados na Segunda Guerra. Acolher falas preconceituosas contra "bolcheviques e judeus" é o de menos no transcorrer dos horrores. Pouco importa para o filme o destino de Höss, que viria a ser enforcado em 1947 (após julgamento). Entre girassóis de um jardim paradisíaco, ainda que sob enorme pressão, ele experimenta o opulento cotidiano ao lado da "rainha de Auschwitz" e esposa de Rudolf, Hedwig (a excepcional Sandra Hüller, de Anatomia de uma queda, e que, aqui, vive uma coadjuvante que lhe rendeu indicação ao prêmio Bafta).

Nada menos do que vizinhos de todos os horrores do campo de matança, os Höss vivem em impecável limpeza, com videiras que disfarçam a paisagem grotesca, cortejam (e se apropriam) de pertences dos assassinados e fundam uma estufa para proteger a flora mais delicada. Assistir ao filme se faz necessário; mas "ver ou não ver" é a questão que impulsiona a provocativa peça de arte. Decisões recônditas do esquema de Hitler ocupam o cinema de câmara focalizado por Glazer. Entre o rigor e a austeridade, é deprimente constatar a devoção de Höss ao cavalo de estimação e a obstinada busca dele por crescimento profissional. Leia-se, almeja, tão somente, otimizar a escala industrial e instrumentalizar a burocracia operante nos gabinetes.

A nula interferência da família no ambiente da vizinhança rima com a frieza operacional da direção de Glazer. Fades coloridos, uso de imagens em negativo e a importância do som na fita são elementos-chave no longa em que o desfilar de cachorros é mais enfatizado do que o desaparecimento de parte da humanidade. Além destes recursos marcantes, narrativas de João e Maria e um poema em ídiche num filme detido em personagens nada empáticos e donos de futilidade ímpar. Contraste maior, no filme que discute até a eficácia de crematórios, está no sublinhado final, que trata do efeito e da função da arte a partir de museus.

 

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