Crítica

Filme de Moretti, O melhor está por vir traz apenas belas intenções

Com críticas ácidas ao capitalismo e deboche em torno do cinema feito apenas com propostas populares, Nanni Moretti traz longa com algo de ultrapassado

O melhor está por vir: crise criativa e pessoal 
 -  (crédito:  Pandora Filmes/Divulgação)
O melhor está por vir: crise criativa e pessoal - (crédito: Pandora Filmes/Divulgação)

A mais nova reflexão cinematográfica de Nanni Moretti chega três anos depois do belo Tre piani, em que fazia apostas na mudança da forma narrativa. Agora, descaradamente, ele interpreta o cineasta Giovanni, afundado em crises criativa e pessoal. Numa das frentes, Giovanni se esforça para retratar a invasão russa à Hungria, em meados dos anos de 1950. Nisso, despontam figuras familiares como Silvio Orlando e Mathieu Amalric, personagens da feitura dos filmes. Já em casa, o diretor enfrenta os primeiros desacordos com a esposa (papel de Margherita Buy), que ainda acumula a função de produtora dos filmes dele. Por fim, denunciando a falta de unidade do roteiro, está criada a impossibilidade da realização do filme dentro do filme.

Ambicioso, o realizador considerado o melhor diretor no Festival de Cannes com Caro diário (1994) e ainda vencedor da Palma de Ouro com O quarto do filho (2001) perde o norte, ainda que cause com a aquisição de participações especiais de atores sociais como o arquiteto Renzo Piano e a ensaísta, matemática e comunicóloga Chiara Valerio. São hilárias as presenças deles que servem como reforços nas teorias de Giovanni (no fundo, o próprio Moretti), incapaz de aceitar a popularidade da invasão gráfica da violência no cinema. Inconformado, ele pretende até acionar Martin Scorsese para demarcar, frente a um falso pupilo, os limites da representação de sangue e afins.

Ainda que se embanane com a clareza e dinâmica do filme, Moretti encanta, ao recorrer a referências pertinentes e que alcançam uma música de Fabrizio de André, além da citação a Et si tu n´existais pas e Sono sole parole, com piscadelas de cinema com os instituídos A doce vida e Lola. Com a incredulidade de ver a filha apaixonada por um idoso, Giovanni terá dois momentos de brilho absoluto. Num, muito divertido, repreende uma asiática que traduz, em tempo real, a discussão que ele protagoniza com a esposa, e, noutro, supremo, a Netflix, a partir de dois tapados executivos, é representada como grande inimiga da difusão de produtos culturais não pasteurizados. É desconcertante ouvi-los, a todo momento, se gabarem de que a empresa chega a casas de nada menos que 190 países. 

 

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postado em 05/01/2024 08:00
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