Crítica // Afire ####
É na região da Pomerânia, numa área entre a Polônia e a Alemanha, que o premiado diretor Christian Petzold ambienta o mais recente filme, Afire, numa imediata tradução — em combustão. Às margens da abundância do Mar Báltico, se dá o enredo que, em certa medida, cita Pompeia e o desastre romano com a erupção do Vesúvio. Uma floresta que abriga os personagens vem sendo ameaçada por intensos focos de incêndio.
Prêmio do júri no último Festival de Cinema de Berlim, Afire, estrelado por Paula Beer (vencedora do troféu de atriz, em Berlim, pelo filme anterior de Petzold, Undine), que dá vida à despojada Nadja, e Thomas Schubert, na pele do introvertido Leon, o longa costura um drama pesado com a frutífera relação de todos com as artes.
Leon, com o amigo Felix (Enno Trebs, visto, em criança, no emblemático longa A fita branca), no enredo, se recolhe no interior; ele, a fim de escrever o segundo romance e, o outro, querendo montar portfólio de imagens. No fundo, Leon tem gritante relutância em se relacionar, o que limita seu crescimento e maiores vivências, um entrave para sua produção literária. A chegada inesperada do salva-vidas Devid (Langston Uibel) complica todo o cenário, já confuso pela obrigatoriedade de Felix e Leon dividirem a casa de temporada com Nadja.
Em muitos aspectos, o drama alemão faz lembrar um filme americano feito em 1993: Três formas de amar, estrelado por joviais Stephen Baldwin e Lara Flynn Boyle. Em meio a descobertas em alojamentos de universidade, aqueles antigos personagens se viam inspirados pelo contato com uma estátua; em Afire, é a literatura que alimenta camadas de emoções, numa trama que ainda bebe da fonte das estátuas de Jardim dos Fugitivos (numa referência aos romanos mortos em incêndio). Explorador de mitos e de temáticas modernas, como conferido em filmes como Barbara, Em trânsito e Fênix, Petzold traz muita reflexão, a partir do personagem Leon que, a todo momento, refuga a vida, repetindo: "O trabalho não (me) permite".