Ancorada em uma pesquisa que investiga as relações do homem com os animais, especialmente aqueles que acabam na panela e no prato, a artista Raquel Nava quer provocar, mas também refletir. Em Estomacal, exposição que inaugura neste sábado (28/10), às 19h, na Alfinete Galeria, Raquel fala de estômagos de bovinos. "Tem uma reflexão sobre a natureza, nossa relação com os animais, essa geração meio predatória, como a gente transforma esses animais em produtos que a gente consome", explica. "O estômago, em grande escala, ocupa muito espaço."
Boa parte da exposição, que tem curadoria de Marília Panitz, consiste em fotografias nas quais Raquel traz como referências elementos da história da arte que acabaram por se transformar em gêneros de pintura, como o memento mori e vanitas. Enquanto o primeiro, no qual caveiras apareciam em evidência ou discretamente em pinturas do século 15, é um lembrete de que a morte é a estação final da trajetória humana, vanitas era um termo usado para se referir às naturezas mortas nas quais a finitude ganhava destaque.
Raquel trabalhou com estômagos bovinos utilizados por alunos da Universidade de Brasília (UnB) em aulas de estudos anatômicos. A parceria com o taxidermista César Leão, professor da instituição e com quem trabalha há mais de uma década, foi fundamental. Além das fotografias, Raquel também preparou uma escultura na qual utiliza um estômago. A obra será acompanhada de sonoplastia que lembra o som dos ruminantes. O projeto é fruto de um programa de três meses de pesquisa e residência artística contemplado pelo Fundo de Apoio à Cultura (FAC) e realizado no Instituto de Ciências Biológicas da UnB.
Para a artista, a pesquisa trata de arte, bicho, necropolítica e comida. "É essa ideia de como a gente escolhe, ou como quem está no poder escolhe quem pode viver e quem vai morrer", explica. "A gente tem uma máquina funcionando nessa engrenagem política e econômica, de vidas que estão ali só para morrerem e a máquina continuar girando. Muitos dos bichos são criados com esse propósito de virar um produto. É essa reflexão de como a gente rearranja isso que quero propor. Olhando para nossa relação com esses seres, podemos olhar para como tratar uns aos outros."