Crítica // Ithaka: a luta de Assange ####
Décadas de um contato paterno interrompido e um inesperado processo por espionagem, pela primeira vez, particularizado, em cima de um único indivíduo, na mira dos Estados Unidos: em meio a essa conjuntura, o australiano Julian Assange, fundador do wikiLeaks, protagoniza, à sombra, o documentário Ithaka: a luta de Assange. Impondo uma e outra limitação à mídia, o pai de Assange, John Shipton, controla a exploração desmedida da imprensa internacional pela situação de penúria do filho, que, após recolhimento na Embaixada do Equador (em Londres) fica à disposição do Tribunal Britânico, sujeito à extradição para os Estados Unidos. Isso, à época das filmagens.
Se, como diz um dos entrevistados do longa, 1% de extradição está condicionado à lei, e os outros 99% à política, Ithaka se afirma como eficiente, por, afundado em politicagem, não trazer narrativa maçante. Sob acusação (complementar) de assédio sexual, Assange, no documentário, fica limitado à postura menos ativa. Stella Moris, advogada e esposa do acusado, bem exprime a situação toda, lembrando a familiaridade de Assange com um pesadelo (real), em torno de sua abdução por alienígenas.
No filme, assinado por Ben Lawrence, são narrados episódios de envenenamento, gravações ilegais e demais detalhamentos de operações da CIA, numa legítima caçada. Temas como a exposição das torturas do governo americano no Iraque e no Afeganistão ficam como coadjuvantes no filme, que investe na condição muito vulnerável de Assange. Ainda assim, a figura de mártir não adere no protagonista, envolto em enredo que alcança instituições com alicerce firmes como a Reuters e publicações como The Guardian, New York Times e Der Spiegel.
Fundamental nos meandros do julgamento, com resultado provisório (dadas a possibilidade de as partes recorrerem), argumentos do neuropsiquiatra Michael Kopelman ganham projeção, alinhando histórico de autismo e depressão para o homem que (nos EUA) poderá somar até 175 anos de prisão. Foi durante o governo de Obama, que, em 2013, ficou concluída a ausência de prejuízo (individual) com as publicações do wikiLeaks.
A atualidade do documentário pode até ser contestada, uma vez que o resultado da extradição negada (sentenciado) já não se sustenta. Mas a vida do vencedor de 26 prêmios de jornalismo, mundo afora, parece moldar o futuro para pessoas e imprensa livres. Entre registros de protestos, cabe a indignação do ativista chinês Ai Weiwei contra deformação na democracia, a reputação do Departamento de Justiça dos EUA, além do fardo humano reservado para o desgastado John Shipton.
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br