Crítica

Drama europeu Disco boy, premiado em Berlim, traz crises e desespero

Com temas muito atuais e muita dose de criatividade visual, Disco boy trata de profunda crise existencial de um desajustado europeu

Crítica // Disco boy — Choque entre mundos ###

Com a crise institucional no Níger, uma antiga colônia francesa, o interesse pela coprodução entre Bélgica, França, Itália e Polônia, Disco boy, ganha atualidade e gera maior interesse. Filme destacado entre 19 títulos que disputaram o Urso de Ouro no último Festival de Berlim, Disco boy, indiretamente, coloca em xeque a demarcação de patriotismo e afinidades entre cidadãos do mundo e o globo, em si.

O que mais salta aos olhos, antes de qualquer aspecto, é a capacidade de criar imagens poderosas nas lentes da diretora de fotografia francesa Hélène Louvart (de Nunca, raramente, às vezes, sempre). A sintonia da profissional (vencedora da categoria contribuição artística, no Festival de Berlim) é gritante, quando se soma à eletricidade da música do Vitalic e ainda à interpretação praticamente coreografada do alemão Franz Rogowski (ator de sucessos como Uma vida oculta e Em trânsito), no papel do protagonista Aleksei.

Sob medidas extremas, no filme do diretor italiano Giacomo Abbruzzese, Aleksei é um bielorrusso descolado da pátria, e ciente do completo apagamento social. Cabe a ele a disposição ao acolhimento na França, em que luta pela possibilidade de um passaporte conquistado ao (duramente) integrar a Legião Estrangeira. Nessa situação, ele encara um antagonismo internacional, ao se envolver numa guerrilha que luta por nova delimitação de territórios, no Delta do Níger. A luta contra a exploração de petróleo move a força do africano Jomo (Morr Ndiaye), que, imerso em um registro de natureza exuberante, goza da companhia de Udoka (Laetitia Ky, uma artista da Costa do Marfim).

Na etapa do Níger, o cinema de Abbruzzese recorre ao poderoso decalque, na expressão de rituais e contraposição ao urbano. Paira um ideal de emancipação, com direito a impactantes cenas como a dos disparos de fuzis e o sequestro de cidadãos franceses. Cores exuberantes e teor místico se encontram no cinema do italiano que relativiza as raízes da identidade e sintetiza, com intervenção explosiva (nas cenas da boate), aspectos de fusão de almas e desesperados passos de dança.