Crítica

Confira a crítica do filme "Till", que aborda preconceito nos Estados Unidos

Movida por um relato de calamidade em estado bruto, o longa Till conta de um crime com motivação racional, em meados de 1950

Ricardo Daehn
postado em 10/02/2023 08:01 / atualizado em 12/02/2023 18:46
Till: luta por justiça, em trama dos meados dos anos de 1950  -  (crédito:  Universal/Divulgação)
Till: luta por justiça, em trama dos meados dos anos de 1950 - (crédito: Universal/Divulgação)

Crítica // Till — A busca por justiça ###

O legado de ter contribuído como ativista emblemática para causa extremamente positiva contra o racismo não fez de Mamie Till-Mobley uma mulher mais feliz. Tudo veio à custa de uma dor extrema, e incontida, na primorosa interpretação da atriz Danielle Deadwyler, fundamental para tornar marcante o filme da nigeriana Chinonye Chukwo. Na pele da protagonista de Till, ciente da carga de intimidações preconceituosas, ela chega a orientar o filho: "Seja pequeno". A tentativa de abafamento, não surte efeito.

Candidata a prêmios de melhor atriz, pelo Bafta inglês e pelo Sindicato dos Atores Norte-Americanos, Deadwyler apenas não alcançou a indicação ao Oscar de melhor atriz. Nada que desqualifique a intensidade do impacto do longa que tem um correto roteiro correto assinado por Michael Reilly e Keith Beauchamp. A direção não propõe grandes voos, mas a situação descrita traz o peso de um rochedo.

"Muito cuidado com os brancos" está entre as dicas de Mamie Till-Mobley para o jovem filho Emmett, chamado de Bo (Jalyn Hall), afoito por deixar Chicago (Illinois) rumo às férias no preconceituoso Mississippi em que moravam os primos sob os cuidados de Pregador, o tio de nome Moses Wright (John Douglas Thompson).

Era agosto de 1955, quando até "homens de cor" se envolveram num crime hediondo. A brincadeira de um assobio, dirigido a Carolyn Bryant, e antecedido por elogios inocentes de um adolescente de 14 anos, selou a sorte de Bo Till. O destino dele carregava gritos e açoitadas, numa localidade em que insultos e agressões corriam soltos para negros sistematicamente humilhados. Os direitos civis estavam longe de se consolidar, quando, com requintes de crueldade e mutilação, o corpo do jovem alcançou o fundo do rio Tallahatchie.

Testemunhas acuadas, um tribunal tendencioso e uma dúzia de homens brancos alinhados pela perpetuação de privilégios deformam o ambiente favorável à justiça, num mundo em que, aos negros, cabiam espaços limitados de trânsito social e jornadas extenuantes nas colheitas de algodão. Entre manobras assustadoras, que envolvem até autoridades policiais do minúsculo município de Money, palco para fatos que antecederam o linchamento de Emmett Till, brotam segredos chocantes, em Till — A busca por justiça.

Num dos grandes acertos da direção, que concatena as atividades, in loco, da Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor (NAACP), está em não expor a violência gráfica. Junto com alianças governamentais, num momento em que crimes se amontoaram durante campanha eleitoral nos EUA, e encampando a mobilização da imprensa, Mamie, que conta com eventual apoio da mãe Alma (Whoopie Goldberg), tem um rompante capaz de nocautear a opinião pública: com os olhos em transe, e depois de percorrer desfigurados rosto e corpo de Bo, ela decide escancarar o crime, liberando a abertura do caixão, pré-enterro.

 

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