Jornal Correio Braziliense

Cinema

Leia a crítica do filme Decisão de partir, pré-selecionado para o Oscar

Um thriller de forte apelo sentimental e com dramaticidade orgânica, Decisão de partir confirma maestria do cinema sul-coreano

Crítica // Decisão de partir ####

Figurando entre os cinco melhores filmes estrangeiros de 2022, em lista da secular associação de críticos National Board of Review, pré-selecionado entre os 15 melhores filmes internacionais do Oscar e ainda vencedor do prêmio de melhor direção no Festival de Cannes, o longa Decisão de partir traz um charme que faz lembrar  do já clássico chinês Amor à flor da pele (2000). Um intenso debate amoroso vem modelado no roteiro do diretor Park Chan-Wook, neste novo filme coescrito por Jeon Seo-hyun (do intrincado A criada). Filme vindo da Coreia do Sul, e de um diretor que, em Cannes, em ocasiões anteriores, venceu o Prêmio do Júri, além do Grande Prêmio, Decisão de partir, inevitavelmente, sofre o comparativo do vencedor do Oscar, Parasita, de Bong Joon-ho. Não fica atrás.

Emoções e sentimentos devem se cristalizar de modo permanente? Essa parece ser a maior das dúvidas do investigador criminal Hae-Joon (Park Hae-il), perdido, a partir do primeiro encontro com a viúva Seo-rae (Tang Wei, irrepreensível em cena). Ela é estrangeira (chinesa), mas numa terra que parece fortalecê-la junto às meias-verdades que conta para a polícia, diante da morte do marido. Uma queda de montanha foi fatal. A fixação do noir, gênero sempre hábil em explorar a sensualidade de criminosos, é abraçada na trama em que segredos são compartilhados (especialmente com o espectador), numa rede exasperada pela busca de verdade, constantemente, ameaçada de escorrer ralo abaixo. Com problemas de vista, vira-e-mexe, Hae-Joon pinga um colírio que, por fim, só intensifica dúvidas.

Uma música com a letra relacionada a um ambiente enevoado pipoca na tela (e ganha tradução, ao longo dos créditos finais) e embala o tempo diferenciado da produção, criado na edição que abusa de sobreposições temporais. A densidade singular das imagens, impecáveis, atenuam a violência a qual o espectador é exposto. Acumulando pistas e, por obrigação, racional e calculista, o protagonista avança num campo minado por doença e ganância. O parceiro de investigação, Soo-wan (Go Kyung-pyo) traz certo alívio na tensão. Sonolento, Hae-Joon parece entusiasmado com a empatia e o amor da mulher (altamente suspeita de matar o marido).

Entre pistas criada por aparatos tecnológicos, inveja, situações complexas (e sujeitas a alterações, a cada novo ângulo) o mesmo diretor de Old boy (2004) faz bonito, sem derrapar, num filme de plasticidade arrebatadora e uma intrigante opacidade, entre o claro e o sombrio, entre o acertado e o duvidado.