Crítica // O clube dos anjos ##
Integrante da seleção do 50º Festival de Cinema de Gramado, o longa de estreia do fluminense Angelo Defanti, O clube dos anjos, mergulha em universo que ele (atualmente dedicado a um documentário Luis Fernando Verissimo) bem conhece: a literatura de Verissimo. Muito antes de saudar o exercício e a força da construção de uma identidade para o país, por meio do audiovisual (como explicitado no fim do longa), o diretor encerra uma teoria em que deixa claro que "comida é poder". Não é pouco, para um Brasil que retornou a padrões de insegurança alimentar. Grosso modo, o filme de clima sombrio aposta na nada arrebatadora trama em que fracassados homens — "nunca saciados" — tateiam uma felicidade proveniente da morte.
Na base da ironia, o longa trata de uma realidade para burgueses que veem os prazeres definharem, dado o avanço da idade. O teor visual não alcança nada do radicalismo do clima de destruição e o abandono de civilidade visto em filmes que se esbaldaram em violência e gastronomia como O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante (1989) e A comilança (1973). Mas, O clube dos anjos trata disso — da dissolução de ideais burgueses (mola mestra de fitas como Cronicamente inviável e Animal cordial). A organização de crimes nutridos em suntuosos banquetes e transbordantes em humor irônico é explorado por um grupo de amigos, há 32 anos, imerso em ritualísticos jantares.
A opulência do chamado Clube do Picadinho tem origem na adolescência de tipos como Daniel (Otavio Muller, sempre excepcional), Tiago (André Abujamra) e Samuel (Paulo Miklos), entre muitos outros. Com muitas mazelas postas à mesa — embalada por filosofia e citações a Shakespeare — os convivas proporcional ótimos momentos de brilho para atores como Augusto Madeira e António Capello e Matheus Nachtergaele, este, na pele do concentrado cozinheiro Lucídio.
Denso em atmosfera teatral, a exemplos de assemelhadas produções de Marcos Jorge e Daniela Thomas, O clube dos anjos, que incorpora Eles (de Caetano Veloso) à trilha sonora, investe na pompa e circunstância visual da fotografia de Rui Poças (que trabalhou com Lucrécia Martel e Miguel Gomes), enquanto o discurso maquina uma débil lógica para justificar a decadência de aristocratas falidos que se deixam tragar por um sistema criminoso.