
E foi assim — de um êxito com real emblema de ouro da empresa Disney, que reluzia feito o mel no fundo do pote carregado pelo Ursinho Pooh, até a malfadada pecha de um pote com revolto enxame de abelhas — que o novo filme de live—acction da empresa de Walt Disney parece ter desandado. Para muito além dos US$ 200 milhões de investimento no filme, o custo real chegará aos cinemas para ser testado. A julgar por Waiting on a wish — uma das músicas de Benj Pasek e Justin Paul (integrantes da equipe do premiado La La Land) incorporadas por Branca de Neve — há chance de muita frieza na receptividade pelo público. O "esperando desejo" a ser realizado, presente numa das letras de composição atrelada ao filme, traz o indício da vibe positiva, num possível resposta do público à fita de Marc Webb. O roteiro do longa vem assinado por Erin Cressida Wilson (de Homens, mulheres e filhos).
Um ouriço, uma lebre, e um esquilo abrem o livro de história de princesa (atualizada) a ser recontado para a telona, tendo por matriz os contos dos irmãos Grimm. Branca de Neve é daquelas personagens que a todos reserva o amor. Inicialmente, ainda criança, é interpretada por Emilia Faucher, extasiada com a possibilidade de ver o reino do pai, o Bom Rei, acessível para "gente livre e honesta". A sua ingenuidade pode vir a ser sabotada pela ação da futura madrasta acostumada a ordenar idas ao calabouço do palácio e supervalorizar as características da própria beleza.
Pensamentos ligados à subsistência do povo tocam Branca de Neve, mas sem encontrar eco na sua linhagem privilegiada dentro do castelo. A suavidade da protagonista é severo acinte para a Rainha Má, cravejada de inveja e crueldade. Torta será ainda a figura do príncipe Jonathan, dono de ações condenáveis como roubo e incapaz de valorizar a confiança em terceiros. Grosso modo, em vez de apenas pensar em soluções, Branca de Neve é estimulada a agir.
Terreno inseguro
A exemplo da lesão na acolhida do musical recente Emilia Pérez, os bastidores de Branca de Neve desfavorecem ânimos. Enquanto na 11ª edição dos prêmios da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, o criador da animação Walt Diney foi celebrado com um Oscar honorário pelo Branca de Neve e os Sete Anões (1937); em 2025, pedras prometem avançar sobre um telhado de vidro. Integrados à natureza, tal qual árvores, outros personagens da ação: Dunga, Feliz, Atchim, Dengoso, Mestre, Zangado e Soneca computam 274 anos de vida nesta adaptação para o cinema. Por momentos, a atual Branca de Neve renega um beijo (do príncipe), foge a cavalo e delega atribuições aos novos amigos que, indiretamente, a distância, vão ajudá-la a reestruturar o reino a ela destinado.
Para os mais escolados, a cartilha do filme parecerá inofensiva: o imaginário processou, na leitura dos Grimm, imagens definitivas (e que estão no filme), como o vestido esvoaçante, dançando no ar da princesa, os assustadores galhos de árvores animados na floresta macabra e o refestelar de bichos selvagens pela mata. Às imagens das minas de diamante e ao estilo peculiar de assobios dos anões (que embalam músicas) — muito está na tela, com o acréscimo da camada de incompreensão relegada a alguns dos sete anões.
Depois das severas críticas a escolha de Halley Bailey como a Ariel, protagonista de A Pequena Sereia, há dois anos; agora muitos desautorizaram, sob visão racista, a americana descendente de latinos Rachel Zegler de estrelar a fita. Vale lembrar que, vencedora do Globo de Ouro de melhor atriz, pelo musical West Side Story, há três anos, a Maria (Zegler) daquele filme disputou aquele papel com 30 mil candidatas na composição do filme assinado por Steven Spielberg.
Nanismo: uma questão?
O rebuliço de debates em torno do emprego (ou desemprego) de atores com nanismo foi outro tema de bastidor de Branca de Neve. Em opção decisiva, o estúdio optou por impor o conceito de "criaturas mágicas", anulando o termo anões, mas tudo parece ter sido mera formalidade para calar o cordão dos descontentes.
A matemática positiva de 126 vezes, em renda, o valor do investimento de US$ 1,5 milhão (na ocasião do filme de 1937), definitivamente, não se afirmará com o produto atual. Embebido nas fábulas do século 19 redigidas pelos Irmãos Grimm, o filme anterior à Segunda Guerra arrebatou a união do talento de oito roteiristas para o clássico que, pelo respeitado American Film Institute, seria dado como o maior filme de animação norte-americana.
Nos novos moldes, o filme atual carrega um embate muito especulado pela mídia: o enfrentamento das posturas das ativistas Rachel Zegler (que, em 2024, saudou "Palestina, livre!" e engalopou a observação da eterna distância da paz para Trump e seus eleitores) e ainda de Gal Gador (a intérprete da vilanesca Rainha), israelense de berço. Nem adiantou o pedido de desculpas de Zegler (que se disse "tomada pela emoção", no momento de seus posicionamentos); a felicidade parece algo distante para a atual princesa das telonas. Ah! Sem querer estragar surpresas: repare na presença do ator George Appleby, na pele de Quigg.