Reconhecida por seus marcantes papéis na TV, no cinema e no teatro, a atriz Ingra Lyberato vem trilhando novos caminhos que unem arte, autoconhecimento e espiritualidade. Em janeiro, Ingra lançará seu terceiro livro, O despertar do amor sistêmico, que aborda Constelação Familiar, Xamanismo e a expansão da consciência.
Desde 2016, Ingra tem se dedicado ao estudo de terapias alternativas e autoconhecimento, como a Constelação Familiar, prática que utiliza desde 1996 e na qual se formou como facilitadora. Em 2020, concluiu uma formação em ecopsicologia aplicada, o que também a capacitou como facilitadora de banho de floresta, prática em expansão no Brasil e na Europa.
"O primeiro livro foi tão difícil, como um parto de mim mesma, e esse foi um deleite, um compartilhamento de experiências que me fizeram crescer muito e podem beneficiar outras pessoas", revela Ingra sobre seu novo lançamento. A obra traz reflexões sobre como as dinâmicas familiares e ancestrais influenciam as escolhas e desafios da vida.
Embora hoje se dedique à escrita e às terapias, Ingra guarda com carinho os momentos vividos na televisão. "Tenho todas as boas recordações possíveis numa intensa carreira de atriz. O processo de realização do audiovisual exige muita entrega. Ficamos dias, meses convivendo de forma profunda e isso é uma grande escola de convivência. Cada trabalho que fiz e faço mexe profundamente no meu ser, me revela meus limites, meus medos e também minha força. Essa profissão é uma bênção."
Ingra relembra com emoção a época de Pantanal e a relevância dessa novela na história da TV brasileira. Recentemente, participou do último capítulo do remake da trama. "Me senti homenageada juntamente com vários colegas que participaram da novela original. Foi um gesto sensível do Bruno Luperi, reconhecendo a importância de um elenco que deu corpo e alma para um marco da TV brasileira."
Entrevista | Ingra Lyberato
Com tantos personagens importantes na TV brasileira, quais as boas recordações que você guarda da televisão?
Tenho todas as boas recordações possíveis numa intensa carreira de atriz. Eu estava concluindo a faculdade de dança moderna na UFBA quando fui pro Rio e tive algumas experiências no teatro. Me apaixonei, tranquei a faculdade e resolvi dedicar minha vida à arte de atuar. Achei que ficaria uns 10 anos no teatro antes de ir para a tv. Estava feliz com essa perspectiva, mas a vida tinha outros planos para mim e com uns dois anos de teatro, fui chamada para a televisão que rapidamente me deu grandes oportunidades numa época em que raros diretores se arriscavam a colocar novos talentos em papéis relevantes. Eu havia acabado de fazer uma importante participação na novela Tieta na Globo e estava sendo notada, elogiada no teatro, quando fui contratada para a novela Pantanal na Manchete. Então tudo mudou: minha vida e a história da TV brasileira que foi impactada por padrões de qualidade cinematográficos que faziam falta na televisão e tem a ver com a minha origem. Sou filha de Chico e Alba, cineasta e roteirista que ficaram na Bahia enquanto eu estava desbravando meus caminhos no Rio. O cinema brasileiro estava completamente paralisado pela falta de incentivo, início dos anos 90. Eu que lamentava não poder atuar para a telona que tanto me inspirava, tive o privilégio e a felicidade de estar nas obras mais cinematográficas da TV naquela época. Vejo qualidade em tudo o que fiz na televisão e me sinto lapidada na alma por cada personagem, pelos colegas, equipe e diretores. O processo de realização do audiovisual exige muita entrega. Ficamos dias, meses convivendo de forma profunda e isso é uma grande escola de convivência. Cada trabalho que fiz e faço mexe profundamente no meu ser, me revela meus limites, meus medos e também minha força. Essa profissão é uma benção.
Como foi participar do último capítulo do remake de Pantanal? Você gostaria de ver um remake de Ana Raio e Zé Trovão?
Me senti homenageada juntamente com vários colegas que participaram da novela original. Foi um gesto sensível do Bruno Luperi por reconhecer a importância de um elenco que deu corpo e alma para um marco da TV brasileira. Claro que o trabalho dos atores (muitos começando como eu), foi enriquecido pela música incrível de Marcus Viana e pela direção extraordinária de Jayme Monjardim. Acho que o remake de Ana Raio e Zé Trovão seria algo bem especial. Estamos em um momento de repensar os esportes com animais. Ao mesmo tempo conheço a realidade de centenas de famílias que vivem da cultura dos rodeios. Acabei de rodar um documentário sobre mulheres que vivem o universo dos cavalos, As amazonas. E conheci amazonas jovens cujos pais são donos de companhia de rodeio e tem suas filhas que montam, como as maiores questionadoras e fiscais do bem estar animal. As domas estão passando por uma revolução de consciência e uma novela traria mais luz sobre esse tema. A outra característica rica da novela era mostrar o Brasil que o Brasil não conhece, nossos talentos espalhados por todo o país e as questões inerentes à cada região. Há uns anos conversei com Jayme Monjardim, Almir Sater e uma produtora paulista sobre a ideia de fazer duas fases desse remake ou contar a história dos filhos de Ana Raio e Zé Trovão, onde apareceríamos como a voz da experiência enquanto eles viveriam os momentos mais desafiadores…rsrs. Ao modo dos filmes e séries americanas que tem feito remakes com os atores originais em lugares estratégicos. Mas os direitos são de Jayme e eu respeito completamente sua decisão.
Você sente falta de atuar na televisão?
Sinto vontade, mas não é aquela falta angustiante que eu sentia antes de desenvolver os dons da escrita e de facilitadora terapêutica. A atuação é um caminho de expressão da minha alma e eu ficava mal quando não estava no palco ou no set. Quando escrevo ou facilito uma Constelação Familiar TSFI que utiliza músicas, essa sensação de estar no meu lugar, acontece. É o lugar onde a arte e a espiritualidade se encontram. Amo me expressar pela escrita, mas como é uma tarefa solitária, mesmo que a motivação seja compartilhar com os outros, desfruto do processo coletivo quando estou nos encontros terapêuticos. Faço sessões presenciais quase toda semana e sempre saio transformada, com sensação de leveza e propósito. Sinto como quem está fazendo algo de bom com a própria vida. Apontando caminhos de bem estar e compartilhando aprendizados. É como se fosse minha pegada no mundo, minha contribuição.
Você está lançando o seu terceiro livro. De onde vem as inspirações?
Em primeiro lugar, sinto fortemente que devo retribuir tudo o que a vida tem me dado. Preciso compartilhar o que tenho vivido nesses caminhos de autoconhecimento pela Arte, pela Constelação Familiar e pelo Xamanismo. Tenho expandido tanto minha consciência sobre as leis que regem as relações que preciso compartilhar. São conhecimentos que transformam radicalmente a vida trazendo lucidez, força e paz no coração. Eu já tive fama, admiração pelo talento e pela beleza, juventude, amor romântico, tudo o que as pessoas juram ser a receita da felicidade. Mas eu nunca estava em paz. Carregava carências e não conhecia meus medos e desejos mais profundos. Pois hoje eu sinto meu mundo interno em harmonia e curei cada relação familiar e profissional dentro de mim. Minha vida está longe de ser um mar de rosas, mas eu entendi que todo desafio é uma oportunidade gigantesca de evolução. Tenho várias ferramentas internas para lidar com as adversidades e me conheço o suficiente para gerenciar minhas emoções e me harmonizar comigo mesma. Quando caio, levanto sem perder tanto tempo. Deixei de querer mudar as pessoas ou o mundo e entendi que o grande trabalho a fazer é me transformar. É como se eu tivesse encontrado um centro de comando que assiste o filme da vida e agora conhece um pouco as regras do jogo. Somos nós que criamos nossos infernos e não nos trabalhamos para enxergar a beleza e a benção que é estar vivo. Então esse livro oferece o básico para ativar esse centro de observação e comando, trazendo compreensão de como funciona nossa consciência e inconsciência. Como somos influenciados pela nossa ancestralidade arcaica e como nos libertar um pouquinho da ilusão da separação, saindo da reatividade instintiva e imatura para nos tornar realmente adultos.
Como você define a Constelação Familiar?
Bem, o livro tem 288 páginas tendo como um de seus propósitos, responder essa pergunta…rsrs. Mas vamos lá. Muita gente pensa que Constelação Familiar é apenas um método terapêutico, mas é muito mais do que isso. Constelação Sistêmica ou Familiar é uma das ferramenta de uma nova cosmovisão, uma nova maneira de ver o mundo e as relações. Uma reconfiguração do nosso lugar na vida. Eu uso a Constelação na minha vida desde 1996 e sou facilitadora há quatro anos, sendo que nos últimos três anos me dediquei a buscar um raciocínio claro para transmitir o que é esse conhecimento. Eu tenho usado de maneira terapêutica, mas a visão sistêmica pode ser aplicada em qualquer área e hoje está na pedagogia, na medicina, na arte, no judiciário, no sistema prisional como filosofia aplicada ensinada ao detentos com enorme poder de transformação pela consciência. Então estamos falando de mudança de paradigma, onde existe todo um pensamento que sai da visão materialista baseada na ilusão de separação para nos revelar a unicidade do universo. Através da experiência profunda da Constelação sentimos a verdade que é: somos uma continuidade dos nossos ancestrais. Herdamos conteúdos positivos e negativos e só conseguimos dar novos passos quando reconhecemos que todos fizeram seu melhor e agora é a nossa vez. Pode parecer um pensamento simplório, mas quando olhamos para nossa história dessa forma, soltamos todo o peso do julgamento que nos impedia de expandir na vida por trazer culpa, e passamos a nos sentir abençoados para fazer diferente, para dar um novo passo e ser feliz em nome de todo o sistema. Saímos das opiniões pessoais e postura imatura da criança ferida para acessar uma visão ampla, alinhada com a própria evolução da natureza humana. Acessamos um amor adulto, incondicional. Portanto, Constelação Familiar é uma abordagem de ajuda que pode ser utilizada em várias áreas da vida, através do método fenomenológico e com base nas 3 ordens do amor: direito incondicional de pertencimento, ordem de chegada e equilíbrio de troca.
Qual a mensagem que você espera que chegue as pessoas, com a leitura do livro?
Em primeiro lugar que elas entendam com tranquilidade que nossa realidade é o mundo interno. Não adianta fugir, pois aonde você for, você estará lá com seus medos e feridas que podem ser tocadas pelo outro a qualquer momento se você não cuida delas. Não adianta buscar o amor fora porque essa experiência sempre esteve dentro de nós. É você que precisa escutar o próprio coração e desbloquear a fonte infinita de amor que carrega dentro de si. A experiência do amor é interna. Depois de despertar esse dom, você pode transbordar, mas é impossível receber de fora se não estiver desperto dentro. Por isso tem tanta gente buscando amor e realização pelo mundo sem encontrar. Então eu vou trazendo estudos e raciocínios lógicos para as pessoas entenderem que estão dentro de uma teia de interrelações que se afetam mutuamente, que somos herdeiros e continuadores da nossa ancestralidade. Começo dialogando com a mente racional, mas meu objetivo é tocar o coração que estiver pronto para voltar a pulsar.
Você faz terapia? Como você exerce o poder do autoconhecimento na sua vida?
Com a vivência constante desses caminhos, me sinto consciente dentro da vida. Quer dizer, recebi ferramentas para me colocar e me transformar diante de tudo o que acontece. Também tenho estudado os fundamentos da psicologia, principalmente Jung que foi um fenomenólogo e empirista. Mas quando sinto que preciso de ajuda na minha vida, uso a Constelação Familiar facilitada por minhas professoras, Cida Rabelo, Claudina Ramirez e Alexandra Caymmi. No entanto hoje também sou facilitadora, ou seja, faço sessões presenciais e virtuais. Como esse trabalho acontece pelo método fenomenológico, cada pessoa e seu sistema familiar é um universo a parte. Não tem receita de bolo, mas tem princípios ou ordens que foram observadas pelo sistematizador da Constelação, o psicoterapeuta, teólogo e escritor alemão Bert Hellinger. Conto um pouco de sua história no livro.
Em um mundo onde as pessoas vivem por trás de uma tela de celular, para você isso é uma preocupação?
Com certeza! Eu uso muito a tela porque escrevo meus livros e leio vários pelo iPad. Também faço reuniões e facilito Constelações pelo computador, além dos encontros presenciais. Não tem mais como fugir disso. Viabiliza muitos movimentos que seriam difíceis de acontecer sem a internet. Mas acho que o importante é ter consciência de que são encontros com pessoas e não um mergulho em universos artificiais criados pela máquina. Mesmo assim é importante ter um equilíbrio entre encontros virtuais e encontros presenciais. Criei meu filho Guilherme levando ele para conhecer as belezas naturais de diversas regiões do Brasil, e nessas viagens de semanas a regra sempre é desligar o celular e viver a vida real, viver a experiência do corpo e dos encontros verdadeiros, sair da mente pessoal e entrar na convivência coletiva. Hoje ele usa para estudar e se comunicar como todo mundo, mas também é músico e fica horas tocando instrumentos sem olhar o celular. Eu vou para retiros passar uma ou duas semanas com certa frequência, onde também reduzo o celular para uma hora por dia. Tipo um detox. A vida é muito maravilhosa! Enquanto as pessoas souberem do valor de sentir o sol no rostro, caminhar entre as árvores, ou assistir o pôr do sol, estamos a salvo da loucura do mundo virtual. Aliás, uma das formações que fiz foi em Ecopsicologia aplicada, em que fiquei dois anos e meio aprendendo sobre o fato de que nossa saúde física, emocional espiritual está na nossa conexão com a Natureza. Afinal Ela é nossa mãe, fonte de vida e saúde.